segunda-feira, 2 de abril de 2018

MOÇAMBIQUE | Empresa chinesa coloca aldeia costeira em perigo


Amnistia Internacional recomendou a suspensão imediata das atividades de exploração mineira de areias pesadas pela empresa chinesa Haiyu, em Nagonha, a cerca de 180 quilómetros da cidade de Nampula.

A Amnistia Internacional (AI) denuncia que a exploração de areias pesadas em Nagonha pela empresa chinesa Haiyu colocou toda uma aldeia costeira com mais de mil pessoas em sério risco de ser arrastada para o oceano Índico.

Segundo um relatório divulgado esta quarta-feira (28.03) em Maputo, as práticas da Haiyu na região de Nagonha transformaram a topografia da área e afetaram o sistema de drenagem das zonas húmidas com impactos negativos sobre o ambiente e a população local.

No relatório "As nossas vidas não valem nada - O Custo humano da exploração mineira chinesa em Nagonha, Moçambique", a Amnistia Internacional denuncia que a empresa chinesa Haiyu não realizou uma avaliação adequada do impacto ambiental nem consultou a comunidade antes de estabelecer as suas atividades, apesar dos requisitos da legislação local nesse sentido.

Inundações deixaram 290 sem teto

O documento mostra por exemplo, com base na análise de imagens de satélite, testemunhos dos residentes de Nagonha e provas de peritos ambientes, como as operações da Haiyu contribuíram provavelmente de forma significativa para inundações súbitas registadas em 2015 na aldeia. Estas inundações destruíram 48 casas e deixaram 290 pessoas sem teto.

A comunidade, que depende muito da pesca, perdeu também recursos naturais vitais proporcionados pelas zonas húmidas locais, nomeadamente água potável, plantas medicinais, lagoas para pescar, frutos silvestres, medicamentos tradicionais e lenha.

Intervindo durante a cerimónia de lançamento do relatório, Lopes Cocotela Vasco, líder tradicional de Morrua, local onde está instalada o projeto, não escondeu o seu desalento. "Para ser franco essa empresa não observou as regras da nossa lei, sobretudo não se fez consulta comunitária naquela comunidade. Nós de Morrua só carregamos o peso porque não fomos ouvidos."

Inação do Governo

A Amnistia Internacional lamenta que apesar das inundações, as autoridades moçambicanas continuam a não regulamentar o setor, o que contribui para os riscos continuados das operações mineiras da empresa para a aldeia.

"A inação do Governo deixou os residentes de Nagonha à mercê de uma empresa que dá a prioridade à busca do lucro e negligência a vida das pessoas", afirmou Deprose Muchena, Diretor Regional da Amnistia Internacional para a África Austral.

"A Amnistia Internacional apela ao Governo moçambicano para investigar as ações desta mineradora em particular aquelas que põem em causa a legislação do país e a vida da população. Apelamos, igualmente, ao Governo para assegurar que a comunidade de Nagonha está a ser compensada pelos danos causados pela mineradora".

A Aministia Internacional recomenda ainda que o Governo de Moçambique ratifique imediatamente o pacto internacional sobre os direitos económicos, sociais e culturais, e assegure a provisão dos serviços básicos aos residentes de Nagonha. Recomenda também ao Governo para realizar urgentemente inspeções ambientais, sociais e de direitos humanos legalmente exigidas a todas as operações mineiras realizadas pela empresa Haiyu e disponibilizar as suas conclusões para consulta pública.

Recomendações ao Parlamento

Por outro lado, a Aministia Internacional recomenda ao Parlamento para assegurar a incorporação na legislação nacional de boas práticas e diretrizes internacionais para mineração de areias nas áreas do litoral, em particular nas zonas húmidas costeiras.

O Parlamento deverá igualmente tomar medidas de modo a assegurar que as empresas que atuam no país pratiquem diligência devida e adequada em matéria de direitos humanos em todas as suas operações e publiquem os seus relatórios.

Comentando o relatório da Amnistia Internacional, Fatima Mimbire, do Centro de Integridade Pública (CIP) afirmou que "os resultados do estudo demonstram claramente que o setor extrativo está a ser muito mal gerido no país, que as instituições não estão a cumprir com aquilo que são as suas obrigações, os seus deveres, nomeadamente garantir que as empresas cumpram a lei, fiscalizar a ação das empresas de modo a verificar se todos os instrumentos, todas as boas práticas estão a ser implementadas ou não".

Leonel Matias (Maputo) Deutsche Welle

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