terça-feira, 24 de abril de 2018

MOÇAMBIQUE | Violência nas minas de rubis é mais um caso à espera de justiça?


Há um silêncio à volta do caso de violência contra garimpeiros das minas de rubis que aconteceu em 2017. Mas em Londres um ação judicial contra a Gemfields, acionista maioritária da empresa envolvida, já está em curso.

A empresa britânica Gemfields está a ser processada em Londres por mais de 100 garimpeiros moçambicanos, acusada de violação dos direitos humanos.

Em causa estão duas situações: uma de maus tratos, perpetrados pela polícia, que tiveram lugar em julho de 2017, e que resultaram em quatro mortos e vários feridos e ainda casos de violações sexuais. E a segunda tem a ver com a apropriação ilegal de terras.

Em Ntoro, uma das regiões onde se exploram os rubis, a população não vê com bons olhos a Montepuez Ruby Mining, detida em 75% pela empresa britânica.

Mussa Manuel é um dos descontentes e conta: "Em 2012 e 2013 a empresa e o Governo vieram falar connosco, a alegar que o terreno faz parte da zona de concessão mineira da empresa Ruby Mining. E depois a empresa veio inscrever-nos a todos para poderem reassentar-nos, construirmos as nossas casas. E depois disso, em 2014, no dia 16 de junho, vimos o branco com polícias, seguranças da empresa com máquinas que vinham destruir as nossas casas, sem que primeiro tivessem cumprido com os direitos que a empresa nos prometeu."

A quantas anda o caso em Moçambique?

A Leigh Day, escritório de advocacia especializado em direitos humanos, representa as vítimas. Denúncias feitas por jornalistas e ativistas no terreno permitiu a ação dos advogados. Mas em Moçambique, onde aconteceram as violações, não são conhecidas ações judiciais.

A Polícia garante que o caso já passou para as mãos da Procuradoria-Geral da República. A DW África procurou a PGR, mas de momento o organismo está sem porta-voz e tentativas de contactar o gabinete de informação foram sem sucesso.

Em meio a dificuldades CNDH faz o seu trabalho

Mas ouvimos a Comissão Nacional dos Direitos Humanos, o presidente Luis Bitone revela: "Quando tomamos conhecimento, primeiro tivemos dificuldades financeiras de viajarmos de imediato para o local. Mas depois conseguimos, deslocamos para lá uma equipa de cinco comissários e eles trabalharam nas minas com as autoridades locais para produzirem um relatório e identificarem os possíveis autores."

"E o que estamos a fazer agora é discutir esses resultados para depois produzirmos as nossas recomendações concretas sobre o caso", garante Bitone.

E sobre a forma como o caso está a ser tratado pelas autoridades moçambicanas, o presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos reconhece que "é um problema estrutural, a morosidade processual é um problema constatado quase sempre em relatórios oficiais como não oficiais. A justiça deve começar a ser célere para responder a essas situações de violações graves dos direitos humanos. Portanto, não é um caso isolado."

Gemfields reage

Depois dos maus tratos, a Gemfields disse em comunicado que a Montepuez Ruby Mining tomou medidas, trabalhando em estreita colaboração com as autoridades e dando assistência humanitária a garimpeiros e membros da comunidade.

A mineradora garantiu ainda que oferece formação em direitos humanos aos colaboradores, à polícia moçambicana e às forças governamentais. A Gemfields já fez saber que é contra a violência e que se vai defender contra as acusações.

Intimidação

E a violência não é o único problema das comunidades onde se exploram as pedras preciosas, agora elas sentem-se intimidadas com a presença permanente da polícia.

Mussa Manuel, que vive em Ntoro, desabafa: "Há um acampamento de polícias, não andamos à vontade, parece que estamos fechados. Estamos limitados, quem nos vai ajudar a circular livremente?"

"Por isso nós na comunidade estamos mal, conseguimos circular, mas há revistas aos bolsos e até a hora limitada para andar. Se andares de qualquer maneira à noite terás problemas com a polícia. Assim não estamos a conseguir fazer as nossas atividades como antigamente", lamenta Manuel.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

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