(ALERTA A TODOS OS PROGRESSISTAS
DO MUNDO)
“Não temos de nos ajoelhar diante
dos imperialistas”, palavras do Presidente António Agostinho Neto, a 29 de
Março de 1979 – http://agostinhoneto.org/index.php?option=com_content&view=article&id=691:nao-temos-de-nos-ajoelhar-diante-dos-imperialistas&catid=48:discursos&Itemid=232
Martinho Júnior | Luanda
1- O império da hegemonia
unipolar não necessita duma doutrina ao nível da doutrina Monroe, enquanto
recurso histórico, sócio-político e económico, a fim de moldar o seu relacionamento
para com África no seu todo.
África viu-se livre muito
tardiamente do colonialismo e do “apartheid”, um pouco mais de 150 anos
depois das identidades americanas, pelo que a ênfase dos relacionamentos,
particularmente depois da IIª Guerra Mundial, foi feita de forma progressiva,
com os Estados Unidos a, pouco a pouco, substituir o papel das potências
coloniais (todas elas membros da NATO), integrando-as cada vez mais nas suas
próprias geoestratégias findo o colonialismo.
Podem-se distinguir três fases
cronológicas das articulações postas em marcha de então para cá e com esse
objectivo:
- De 1945 a 1990 (período do
equilíbrio de forças com o campo socialista, vulgarmente tido como período
da “Guerra Fria”);
- De 1990 a 2011 (período de prevalência
do choque capitalista neoliberal em função do domínio absoluto do império em
relação aos processos de globalização);
- De 2011 até ao presente
(período de utilização tácita do caos e do terrorismo como justificação de
presença militar a norte do Equador, enquanto se disseminou a terapia
neoliberal a sul, na medida do surgimento dos emergentes e do início da
globalização multipolar).
2- De 1945 a 1990 os Estados
Unidos começaram por ter um relacionamento relativamente afastado e limitado em
relação ao continente africano, mas aproximando-se gradualmente dele, desde que
se aceleraram os processos de descolonização na década de 60 do século XX.
Até 1960 os interesses das
multinacionais dos Estados Unidos foram-se instalando paulatinamente, emparceiradas
quase sempre com os interesses das potências coloniais, ou recorrendo a
sucursais já instaladas na Europa e mesmo em África (África do Sul),
particularmente no que diz respeito às indústrias minerais extractivas, pelo
que o “lobby” dos minerais foi determinante nessa época, em relação
aos mecanismos de poder (democrata) nos Estados Unidos.
Sendo as casas bancárias da
aristocracia financeira mundial originárias da Europa e de cunho
anglo-saxónico, não foi difícil sobretudo em relação à África do Sul “alavancar” os
relacionamentos, integrando as perspectivas do “cartel” do ouro, da
platina e dos diamantes, na sequência do estro imperial de Cecil John Rhodes
(financiado pela “casa Rothschield”) e aproveitando, intimamente associado
a isso, a lenta decadência do império britânico.
Na África do Sul o surgimento
do “apartheid” tem que ver, enquanto processo aparentemente
contraditório a essa dinâmica, com o crescendo dos interesses da aristocracia
financeira mundial eminentemente anglo-saxónicos perseguindo a trilha da
British South Africa Company.
A exploração do cobre na Zâmbia e
no Catanga resultaram também dessa aproximação, até por que a aristocracia
financeira mundial, controlando o miolo das indústrias típicas da revolução
industrial em ambos os lados do Atlântico Norte no após IIª Guerra Mundial,
tornou-se vértice da pirâmide financeira global já nessa altura, quando
sintomaticamente fez proliferar os “think tanks” de suporte e com a
sensibilidade virada para seus próprios interesses no futuro, com vista a
melhor os poder consolidar.
Assim em 1960 o Congo tornou-se
num “dilecto alvo”, com a Bélgica a ser integrada de forma submissa na
transitoriedade da colonização para a neocolonização, projectando-se a
instrumentalização da “autenticidade” de Mobutu, ou seja, influindo
directamente na superestrutura ideológica do estado vassalo e neocolonial do
Zaíre.
Dominante de forma geoestratégica
no Zaíre, os Estados Unidos realizaram as primeiras abordagens mais críticas em
relação ao domínio sobre a água interior do continente, levando desde logo em
atenção o facto de África possuir os maiores desertos quentes do globo
precisamente para norte da bacia do Congo, que com os Grandes Lagos e os cursos
do Zambeze e do Nilo constituem o manancial de vida fundamental para África.
Ganhou também a experiência
inicial da aglutinação dum poder colonial tornado vassalo à sua geoestratégia,
pois a Bélgica, uma das potências coloniais mais “versáteis” (até por
que a coroa belga é um artifício singular na Europa), foi ficando à disposição
dos dispositivos dos interesses imperiais.
A Bélgica preencheu assim
rapidamente os quesitos úteis à aristocracia financeira mundial e seus
interesses, desde as minas, às indústrias do aço, do cobre, do estanho, do
alumínio e derivados, até à manufactura mais avançada das máquinas e
máquinas-ferramentas contemporâneas.
Todo o circuito desde as minas
aos produtos acabados, até às máquinas que se tornaram motoras da revolução
industrial, foi duma forma ou de outra passando para o controlo das poderosas
multinacionais tuteladas pela aristocracia financeira mundial instalada no
vértice da pirâmide económica e financeira global em construção e só o bloco
socialista tinha alguma capacidade de contraposição, influindo nos apoios à
Luta de Libertação Nacional que se projectou pela via armada contra o renitente
mas frágil colonialismo português, ele próprio subsidiário dos interesses do
império.
Todo o exercício colonial
português de 1961 a 1975, espelhou essa incontornável vassalagem e só a aliança
secreta do fascismo português com o “apartheid” e o efémero regime de
Ian Smith na Rodésia, impediu o seu mais rápido colapso.
De facto os interesses da
aristocracia financeira mundial, que tinham uma poderosa mão no “cartel” do
ouro, da platina e dos diamantes na África do Sul, determinavam a longevidade
dos componentes da internacional fascista na África Austral.
3- Com Mobutu, membro do “club
1001” (os oligarcas da natureza), instalado e consolidado no Zaíre, os
Estados Unidos passaram a ter capacidade geoestratégica de intervenção
multiforme em África, anda que se servisse de instrumentos mercenários por via
da interposta bandeira da Bélgica, com todos os sentidos postos na água
interior do continente, pois o Congo, com fronteira com outros 11 estados, era
também uma preciosa plataforma em função da qual se poderiam irradiar todo o
tipo de iniciativas sobre o cerne do espaço vital africano.
Desse modo os Estados Unidos
adoptaram uma via distinta na abordagem geoestratégica em relação a África:
Enquanto na América os Estados
Unidos haviam feito tudo para acabar com a colonização das potências europeias,
adaptando para o efeito a doutrina Monroe como fundamento da expansão
imperialista, em África, sem doutrina Monroe e levando em conta a Conferência
de Berlim, (que havia imposto colocar todo o continente economicamente em
dependência ultraperiférica, limitando-se ao papel de simples fornecedor de
matérias-primas e mão-de-obra barata), determinou-se a poder substituir
paulatinamente os vínculos económicos efinanceiros das potências coloniais,
integrando-as todavia como instrumentos “domesticados” e aglutinados
aos seus próprios interesses e funcionalidades.
Descolonizar nesse sentido abria
todas as avenidas ao neocolonialismo que incluía a inteligência económica das
potências europeias e mesmo os renitentes como o fascismo-colonialismo
português (Estado Novo), foram ficando sem alternativas, ainda que procurassem
produzir doutrinas híbridas como “Portugal e o futuro” do General
Spínola.
De facto um spinolismo sem
Spínola serviria às-mil-maravilhas depois do golpe de 25 de Novembro de 1975,
para que os governos do “arco de governação” fossem subtilmente
instrumentalizados, inclusive via NATO, nos relacionamentos com as ex-colónias
portuguesas, ao mesmo tempo que, com processos abertos ou clandestinos,
aproveitavam a inércia do Exercício Alcora recorrendo aos mais diversos nexos
com o “apartheid” da África do Sul e alimentando até onde desse as
sequelas históricas desse desempenho.
A aristocracia financeira mundial
era já de tal modo poderosa, que as alternativas híbridas foram aglutinadas aos
seus propósitos em África, enquanto outro sector de interesse era dinamizado
pelas multinacionais afins: o petróleo.
Assim enquanto os Democratas nos
Estados Unidos se tornavam dominantes em relação às indústrias minerais
extractivas, instrumentalizando expedientes pelo interior profundo do
continente, (estendendo o domínio da bacia do Congo aos Grandes Lagos), já os
Republicanos passaram a dominar nas explorações das suas multinacionais de petróleo
a sul do Sahara, na Nigéria, em Angola e um pouco por todo o Golfo da Guiné (“offshore”).
Os apoios mais conservadores como
os democratas-cristãos, ou os social-democratas, desde os que integraram o Le
Cercle, até aos“socialistas do centro-esquerda”, foram sendo assim
paulatinamente atraídos à órbitra de conveniência, calcorreando o tapete da
inteligência económica, fortalecendo os processos globais nos termos dum
império de hegemonia unipolar que manteve para o efeito, sem obstáculos ou
impedimentos maiores os desígnios da própria NATO.
As acções de algumas das
redes “stay behind” da NATO em África, foram passando de
clandestinidade em clandestinidade das plataformas europeias para as
plataformas africanas, actuando sobre alvos pré-determinados, um manancial que
viria a ser tido em conta quando o capitalismo neoliberal passou a ser motor na
globalização segundo os parâmetros do império da hegemonia unipolar.
Com o neocolonialismo o império
deixou de ter encargos com a administração dos territórios, permitindo-se
assim “capitalizar os lucros” da aristocracia financeira mundial e a
procurar velada ou abertamente, que fossem os que levaram sobretudo a cabo com
armas na mão a luta de libertação em África e seus aliados socialistas, a “socializarem
as perdas”, agravando ainda mais o fosso das desigualdades e aumentando os
desequilíbrios sobre os africanos.
Em 1990 entrou finalmente em
colapso a internacional fascista na África Austral, com o fim do “apartheid”,
reduzindo-se em África o colonialismo ao Sahara ancorado a Marrocos, mas o
poder do império da hegemonia unipolar chegava ao apogeu: provocou o colapso do
socialismo, à excepção da resistente e heroica Cuba, enfraquecida ao ponto de
ser obrigada a levar a cabo o “período especial”.
África ultraperiférica, apesar
das vitórias do Movimento de Libertação sobre o colonialismo, o “apartheid” e
algumas das suas sequelas, veria aumentar a pressão sobre suas próprias elites,
com o objectivo de as formatar, agenciar, instrumentalizar e manipular ao mesmo
tempo que se escancaravam as portas do “mercado global”, ou seja: as
elites ficavam sem alternativas ao asfixiante domínio do império da hegemonia
unipolar e a inteligência económica dos interessados abrigados pelo quadro da
hegemonia unipolar fez o resto.
- Continua -
Martinho Júnior | Luanda, 14 de
Abril de 2018
Ilustrações:
Cartoon relativo ao imperialismo
em África;
Mapa do império britânico no
mundo e em África;
Cecil John Rhodes, cartoon “do
Cabo ao Cairo”;
O “copperbelt” zambiano-catanguês;
Capa de “A ascensão de
Mobutu”, livro da autoria de Ludo de Witte.
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