Martinho Júnior | Luanda
1- De tanto disseminar
manipulações contraditórias com vista a instalar seus processos de ingerência e
domínio, tirando partido da revolução de novas tecnologias em plena
globalização, a aristocracia financeira mundial geradora do império da
hegemonia unipolar, criou nos Estados Unidos a sua própria ratoeira
autoinfligida, ao permitir-se a uma tensão interna cada vez mais publicitada
entre suas duas linhas vinculativas de interesses dominantes: a do capitalismo financeiro
transnacional e a que se prende ao capitalismo produtivo nacional.
Por essa razão, durante a última
campanha para as eleições presidenciais, foi precisamente essa tensão que
emergiu das sombras, algo que só pode ser sustentado quando os processos de
domínio perdem intensidade, se desgastam e começam a tornar-se incapazes de
geoestratégica global, na via da tentativa de persistência da hegemonia
unipolar.
Se houvesse hoje um “impeachment” a
Trump, nem por isso essa tensão intestina se iria apagar, ou fazer esquecer.
A tensão, com as disputas que lhe
são inerentes, não parou como é óbvio com as campanhas eleitorais, tornou-se um
processo em continuidade, arrastando consigo, de forma subjacente, uma complexa
luta de classes nos Estados Unidos, mais visível nos contraditórios por dentro
do espectro do Partido Democrata.
A luta de classes na sociedade
estado-unidense, tem múltiplas implicações culturais, inclusive por dentro dos
meandros e tensões da aristocracia financeira mundial: enquanto os processos
elitistas mais genéricos têm predominância das linhas e sinais anglo-saxónicos,
só os processos inerentes à continuidade à Doutrina Monroe têm predominantes
linhas e sinais hispânicos.
É evidente que a Rússia e os
emergentes multipolares têm feito a leitura aferida a essa tensão ( e ao seu
espectro sócio-político) por que nela, por tabela, avaliaram quem semeia o
caos, o terrorismo e a guerra psicológica que estão inerentes aos expedientes
do domínio de 1% sobre o resto da humanidade e quem (como e por que vias)
procura afastar-se desse pântano, com uma ementa distinta para os processos
dominantes do império da hegemonia unipolar!
Essa leitura está legítima e
plenamente justificada, pois de outro modo seria muito mais difícil a sua
própria sobrevivência, a sobrevivência de suas alternativas e agora começa a
ser mais exequível em nome da civilização, isolar-se até à neutralização a
barbárie que afecta a humanidade em pleno século XXI!
A Alemanha, acaba de juntar-se à
China, à Rússia, ao Irão e à Turquia, no afastamento para com o (petro)dólar,
no momento em que a tensão intestina da aristocracia financeira mundial tende a
exacerbar-se!...
2- A tensão intestina na
aristocracia financeira mundial reverte para uma “geometria varável” de
projectos, programas e acções, que comportam uma avassaladora onda de
incógnitas de ingerência e manipulação, o que torna imprevisível os riscos
globais, continentais, regionais, nacionais e até locais.
Esses projectos, programas e
acções tornaram-se devassos nas suas próprias “trnsversalidades”.
Essa “geometria variável” tira
partido da nova revolução tecnológica duma forma criativa, sempre com o sinal
pernicioso indexado ao estreitamento do domínio na pirâmide global, mas podendo
sempre ocorrer “transversalidades”de cima abaixo no sistema de domínio!
A contínua guerra psicológica
levada a cabo pelos interesses da aristocracia financeira mundial sobretudo
desde a IIª Guerra Mundial tem, entre diversas outras, também essa função e
intrínseca vulnerabilidade.
A mentalidade formatada sobre as
enormes massas humanas vegetativas (por que são necessariamente oprimidas), só
pode ser “conversa para boi dormir” (é muito perigoso para essa
aristocracia, que o “boi” acorde e ganhe desde logo alguma
consciência crítica que conduza a alguma estratégia revolucionária, com tudo o
que é subjacente a esse acordar), mas até na “conversa para boi dormir” à
vínculos condicionados a cada uma das tensões intestinas e seus respectivos
mentores.
A panóplia de alienações está
intimamente associada a essa tipologia subversiva e tensa de domínio
capitalista neoliberal, dos critérios seguidos pela sua contínua guerra
psicológica e daí o enorme espaço ocupado pelas alienações, desde as
religiosas, até às televisivas, passando pelos desportos, como pelo impacto dos
tráficos, tendo como eixo o tráfico de droga.
Por isso uma NATO que surgiu no
espaço físico-geográfico do Atlântico Norte antes da introdução do capitalismo
neoliberal ao nível do poder anglo-saxónico, se distingue hoje por estar
presente entre os meridianos do Afeganistão e a Colômbia, os dois principais
produtores mundiais de droga: heroína a leste, cocaína a oeste!
O “soft power” dos
processos de domínio estão pois afectados pelo leque desses cancerosos “ingredientes” e
por isso as ingerências e manipulações ganharam enormes capacidades “transversais” a
todas as sociedades, inclusive, irremediavelmente, na complexa sociedade dos
Estados Unidos, por que é aí que se encontra a cabeça do polvo global do poder
económico e financeiro como da droga.
A sociedade estado-unidense os
dois contraditórios intestinos da aristocracia financeira mundial querem-na
completamente vegetativa e embrutecida…
Os espelhos dessas tensões são os
inúmeros acontecimentos trágicos com sangrentos dramas de acção armada e policial
(repressora) que afectam os Estados Unidos, sem que se vislumbre o seu atenuar,
muito menos o seu fim!
3- De certo modo os Estados
Unidos não têm como impedir que, na sua complexa sociedade, por osmose rebentem
agora sob pressão, as ingerências e manipulações que disseminaram com o
capitalismo neoliberal, no estrito interesse do capitalismo financeiro
transnacional: a balança ainda não reverte, neste momento, em benefício do
capitalismo produtivo que se prende ao surgimento da administração de Donald
Trump, mas as tensões manifestam-se nas“transveralidades” da sociedade
estado-unidense e reflectem-se sobrenodo nas instituições de inteligência,
financeiras e de justiça.
A degradação da indexação
das “transversalidades” induzidas nos processos externos de
ingerência e manipulação está, por exemplo, patente na Venezuela, onde a
oligarquia agenciada se fragmentou politicamente e não possui alternativas
credíveis capazes de neutralizar a tendência de poder sustentado pelo voto
popular.
Com a expressão sociopolítica
dessa oligarquia estilhaçada, então resta ao império da Doutrina Monroe, ao
império da hegemonia unipolar, encontrar suportes em oligarquias sedimentares
avassaladas como a da Colômbia, reconvertendo em simultâneo o elo terrorista de
Miami para, com a oligarquia colombiana e a partir dela, lançar acções para
dentro da Venezuela Bolivariana, como a do recente atentado contra o presidente
Nicolas Maduro, um atentado sincronizado com a ementa a condizer de guerra
psicológica.
Face à coesão cívico-militar
bolivariana e apesar de ser necessário uma leitura mais clarividente do
processo interno de luta de classes e apurar as capacidades de inteligência
externa da Venezuela Bolivariana, assim como apurar as capacidades de prevenção
contra golpes que recorram a novas tecnologias, mesmo a agressividade de ponta
tende a eclipsar-se como mais uma desesperada manobra de quem vê reduzido o
espectro instrumental de medidas de manipulação e ingerência dentro do
território venezuelano também por causa das contradições internas da
aristocracia financeira mundial elitista e anglo-saxónica.
Essa é também uma das razões da
sustentabilidade da estratégia de medidas económicas e financeiras lançadas
pelo presidente Nicolas Maduro, que sem contraditórios ao seu nível, nem por
isso devem deixar de ser atenta e constantemente acompanhadas.
4- Em relação ao resto do mundo,
as tensões internas da aristocracia financeira mundial são também uma
oportunidade a aproveitar, não só pelos estados cuja vassalagem foi instrumentalizada
por via duma União Europeia ou da NATO, mas também por outros que se perfilam
nas potencialidades da emergência.
Os fenómenos de ruptura são
visíveis e são tema comum corrente, merecendo no moento a atenção dos mais
esclarecidos analistas (Grã-Bretanha, Alemanha, Turquia…).
A manobra do petrodólar está a
reduzir-se em termos de influência, não só no Médio Oriente por efeito da
vitória substantiva do estado sírio e de seus aliados, mas também em outras
partes do mundo.
Em África, por exemplo, uma parte
do poder da hegemonia unipolar recorre ao pré-carré da “FrançAfrique”,
integrando-o na sua expressão de domínio no continente, socorrendo-o e
socorrendo-se com os parâmetros da guerra psicológica, sincronizando por outro
lado os movimentos militares e de inteligência de outras potências europeias
integradas na NATO, entre elas Portugal, onde proliferam os “experts” nas
guerras relacionadas com os “diamantes de sangue”.
A presença de forças militares
portuguesas, ao abrigo da missão de paz da ONU na República Centro Africana,
relaciona-se com essa vocação que vem de longe, com espectros de inteligência
na República Democrática do Congo e em Angola, onde muitas vezes basta a
capacidade do seu “soft power” e os expedientes de assimilação.
A manobra política e diplomática
de alguns dirigentes africanos tende a traduzir o aproveitamento da situação de
tensão intestina e contraditória no seio da aristocracia financeira mundial,
até por que alguns são agentes do “lobby” dos minerais, compatível
com o Partido Democrata dos Estados Unidos enquanto esteio que se vincula ao
capitalismo financeiro transnacional.
Nesse sentido é sintomático o
poder de manobra do presidente Paul Kagame do Ruanda, que neste momento possui
enorme influência sobre os Grandes Lagos e a região leste da bacia do Congo
(particularmente nos dois Kivus).
Um balanço global implica uma
revisão às sínteses-analíticas relativas à aristocracia financeira mundial, no
momento em que tende a degradar-se o carácter do seu poder dominante, sujeito
agora à ratoeira autoinfligida!
Martinho Júnior - Luanda, 22 de Agosto de 2018
Imagens:
- Donald Trump e o clã Clinton,
figuras protagonistas da relativa ruptura entre o capitalismo financeiro
transnacional e o capitalismo produtivo do“The americans first”;
- Michel Cohen, considerado
recentemente culpado de oito acusações, uma brecha no sistema do Presidente
Trump, que pode levá-lo ao“impeachment”;
- Paul Manafort, o outro ponto
fraco do sistema do Presidente Trump, tem concentrado as estratégias
republicanas mais intensas no âmbito do neoliberalismo que flui também no
capital financeiro transnacional, ou a partir dele;
- George Soros, um factor “transversal” pela
natureza de contenciosos que se prendem à especulação financeira e à
filantropia, um pacote capaz de todo o tipo de ingerências, manipulações e de
ser usado nas próprias tensões internas da aristocracia financeira mundial;
- Agora a trama das tensões
intestinas da aristocracia financeira mundial, pode induzir-se na direcção
dum “golpe suave”, a coberto ou não dum pré anunciado “impeachment” ao
Presidente Donald Trump.
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