quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Mais de cem anos volvidos, ainda o fantasma do rei Leopoldo…


Martinho Júnior, Luanda 

1- O fantasma do Rei Leopoldo desdobrou-se na azáfama sangrenta da sua voracidade e tornou-se mais carniceiro que nunca por que a "civilização" é um mito alienatório dos poderosos contra a fluidez da vida na nossa "casa comum"!...

Nos países que se situam na cauda dos Índices de Desenvolvimento Humano, embora sua riqueza em matérias-primas, tanto pior!

Na RDC a barbárie é fomentada pelas lutas milenares entre africanos, todos eles de origem diversa mas em busca do espaço vital, lutas essas elas próprias agravadas por causa da cobiça pelo acesso e posse dos minérios mais raros e preciosos existentes no ventre da Mãe Terra, decorrentes nos imensos lucros que cada vez mais se acumulam em cada vez menos mãos!...

O interesse do “lobby” dos minerais e dos Democratas dos Estados Unidos, pela região dos Grandes Lagos e bacia do Congo, tiveram nos relacionamentos entre Paul Kagame e Bill Clinton (por tabela entre Pauk Kagame e as seguintes administrações de turno), vínculos privilegiados, sublinhando os interesses comuns (http://www.salem-news.com/articles/august052012/pentagon-rwanda-khs.php).

2- Agora que se vão divulgando os crimes continuados e acumulados de década em década, conhece-se a vitimização, mas os poderosos, usando seus canais elitistas de pensamento e acção, deliberadamente escondem a razão causal dialética da persistência do fantasma transfronteiriço do Rei Leopoldo, acendendo ou apagando os holofotes sobre um continuado genocídio transfronteiriço conforme ao exercício do poder do império da hegemonia unipolar na região e seus interesses capitalistas financeiros transnacionais!...

Essa evidência é tanto mais grave quanto, para instalarem seus “homens de mão” em Kampala, em Kigali e em Bujumbura, deram luz propagandística com amplo eco e espectro internacional, via seus “media de referência”, ao holocausto dos hútus contra os tutsis, quando foi, por exemplo, um reduzido grupo da elite tutsi apto em discretas operações especiais que abateu o avião que transportava os dois presidentes, o do Ruanda e o do Burundi (“na noite de 6 de abril de 1994, um avião que transportava os então presidentes de Ruanda, Juvenal Habyarimana, e do Burundi, Cyprien Ntaryamira, ambos hutus, foi derrubado” –  https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/04/140407_ruanda_genocidio_ms)…

Enquanto nos Kivu vai engordando agora, discretamente, o horrendo fantasma do Rei Leopoldo, dizimando milhões e milhões de seres humanos apanhados na armadilha do espaço vital e da obscena riqueza das matérias-primas disponíveis e tão disputadas, dez anos depois do holocausto ruandês, nos vizinhos Uganda, Ruanda e Burundi, as cidades e as colinas iluminam-se com as migalhas que caem das mesas dos poderosos extra continentais!

A razão dialética entre os horrores contemporâneos dos Kivu, no espaço leste da RDC e a eclosão da riqueza no tão propagandeado bem-estar a leste das fronteiras nos três países dominantes dos Grandes Lagos, faz parte do que está deliberadamente escondido, ao ponto do médico (e pastor pentecostal) premiado agora com o Nobel da Paz em nada se referir a isso em seu discurso de denúncia!

As condições de Bukavu, onde ele nasceu e exerce, assim o determinam, como determinam as “doações” por via de torneiras habilmente manuseadas!

Pensamento e acção elitista exige, instrumentalizando os vínculos de escolhidas doações beneméritas: nada melhor que uma cidade de fronteira como Bukavu, para regular os holofotes da luz e da sombra sobre o transfronteiriço fantasma do Rei Leopoldo!


3- A aristocracia financeira mundial agencia seus preferenciais vassalos gerados na e pela sua própria cobiça, vassalos que se escondem no papel celofane duma quimérica paz nos Grandes Lagos e na bacia do Congo, uma paz que nunca o foi e é hoje radiografada com a visão mesmo assim circunscrita (sob caução?) do depoimento cívico do médico-pastor Denis Mukwege!

De facto o depoimento a quem serve senão aos que, por via da caridadezinha das doações e às obrigações “pentecostais”delas decorrentes, lança luz sobre as conveniências, como lança sobre as inconveniências, esquecendo a profundidade de suas razões causais?

Desse modo a RDC instalada no pulmão tropical mais decisivo de África, contamina de forma inteligente e instrumentalizada, cada um dos seus 11 vizinhos, em especial aqueles que não têm poder suficiente para responder com prontidão à vassalagem ao abrigo do império de contingência-maior, por que sobre esses, quantas vezes se aplica a manipulação entre contrários em carne-viva, para propositadamente fermentar caos, terrorismo e desagregação, dividindo e dividindo, para ao vulnerabilizar, ao fragilizar, ao entorpecer, melhor reinar!

Um pensamento elitista e por isso mesmo formatado e censurado com todo o tipo de doses ideológicas e psicológicas de conveniência, tende a divulgar o encadeado dos fenómenos de forma estruturalista e com juízos de valor a condizer com seus propósitos de domínio e com seus interesses a condizer com suas mãos hipócritas duma aprendizagem antiga: a de Pilatus!

Sobre quem segue essa trilha, mais ainda se tem capacidade (restrita) de denúncia comprovada, chovem naturalmente os prémios!

Até médicos cívicos podem ser contaminados pelas mãos que manipulam o acender ou o apagar dos holofotes e suas mentes formatadas religiosa e tacitamente pelos jogos de luz e sombra emitidos a partir da aristocracia financeira mundial!

O depoimento de Denis Mukwege (https://www.youtube.com/watch?v=xQnvvpHvbss), um homem da cidade fronteiriça por excelência que é Bukavu, é um diagnóstico sintético, mas falho em muitos aspectos de sua dialética em relação à amplitude da barbárie global injectada ao cômputo da região da bacia do Congo e Grandes Lagos, sob o estigma do pensamento e acção elitista e por isso premiado!

Ao denunciar as atrocidades sobre as vítimas, mesmo assim, ainda que timidamente (não assumindo os fenómenos transfronteiriços entre a luz e a sombra) ele evidencia, sem citar nomes, o lucro dos poderosos que anima em pleno século XXI a versão contemporânea dum fantasma transfronteiriço do Rei Leopoldo cada vez mais adiposo do sangue de suas sevícias e vítimas acumuladas, no genocídio mais longevo, em permanência, que se arrasta desde o final do século XIX!...

A lavagem de imagens em cadeia só pode passar por este tipo de “exercícios” tão “inocentemente” adaptáveis aos “jogos africanos” do interesse do “lobby” dos minerais!

Martinho Júnior - Luanda,14 de Dezembro de 2018

Figuras:
O Prémio Nobel da Paz Denis Mukwge;
Capa de uma das edições de “O fantasma do Rei Leopoldo”;
Os genocídios dos congoleses, de Leopoldo IIº a Paul Kagame;
Paul Kagame e Bill Clinton, dois expoentes e aliados do “lobby” dos minerais interessados em África.

A consultar:

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