“Diga 33 com voz doce”. Este era
um dos slogans publicitários da Farinha 33. Já lá vão mais de 60 anos. Além
da 33 havia a Farinha Amparo e a Predilecta. Eram concorrentes diretas no
mercado das farinhas alimentícias. Guardadas as tampas das caixas e
apresentadas com uma certa quantidade requerida havia direito a prémios, para a
miudagem – já se vê. Bolas, brinquedos de plástico (uma matéria pouco usual nesses
tempos). Era uma maravilha que enchia de brilho os olhos das crianças. Curiosamente
ainda existe a Farinha 33, talvez também as outras suas concorrentes na sua época
áurea. A embalagem aqui retratada e atual significa que a dita 33 ainda existe
no mercado. Espantoso. Só que já não vimos a sua publicidade, muito menos nos
convidam a dizer “33 com voz doce”.
Lá por isso, hoje, aqui no
Expresso Curto que vem a seguir, a sua autora até parece que aplica a voz doce
aos “33 dias depois” sobre a “eleição de Rui Rio como presidente do PSD”. A
referência irá descambar no congresso do PSD, que se realiza este fim de
semana. Rio líder, Passos que se vai e “não deixa saudades”, no dizer de muitos
do PSD e principalmente dos portugueses espoliados por um eterno imberbe “menino
da mamã” que teve sempre a sua vida fácil e um pouco desconsiderada para com os
seus semelhantes (no dizer de uma amiga de Benfica, que assim escreveu e
apresentou a retórica publicamente).
Rio é um rio de silêncios nestes últimos
dias, faz lembrar Cavaco Silva. Porém, apesar disso, sabemos que é um mar de assertividade
para com os do grande capital e mais alguns que se proponham a fazerem parte
desse clube. É o PSD no seu melhor. Nos seus silêncios irá pé ante pé tecendo a
teia ao estilo de Cavaco Silva, esse tão desprezível personagem que pela surra
fez o ninho atrás das orelhas dos portugueses e levou Portugal à exaustão do ridículo
e das benesses legais e ilegais destinadas aos seus amigos. Alguns deles
enredados em processos judiciais por falcatruas, outros com dezenas, centenas
ou milhões de euros em paraísos fiscais. Uns quantos até condecorados, por ele,
numa mais parecida associação de amizades que teria muito para contar, ou ainda
terá. Ao menos para a história.
Mas Rui Rio é diferente. É
inteligente e possuidor de alguma cultura. Expressa-se corretamente em português,
não é tatebitate como Cavaco Silva. Nunca dará calinadas na língua portuguesa
como Cavaco, quer em primeiro-ministro ou quando foi um tosco presidente da República.
Além disso Rio prima pela legalidade das suas ações, ao que se sabe. Abomina trafulhices.
O que não significa que não entregará aos do grande capital o que a todos os
portugueses pertence. Fará isso mesmo dentro da legalidade. Podem crer. Sem ser
à socapa e sem meter o rabinho de lado, como Cavaco esfinge de santo de pau
carunchoso.
A Rio já estão a impor uma meta e
ainda o homem não se sentou na cadeira de líder do PSD. Querem que vença as próximas
eleições. Tudo indica que não acontecerá assim e que a aliança parlamentar
entre PS, Bloco, PCP e Verdes irá continuar de modo a atingir uma maioria
parlamentar que apoiará o governo de António Costa. Um Costa reeleito, por
assim dizer.
No Curto do Expresso, hoje com a
lavra de Cristina Figueiredo – nada novata nisto – temos badana para toda
semana, ou não fosse ela editora de política da SIC. Sem considerações. Todos
sabem que televisão é televisão, máquinas de manipulação (quase sempre). E
resulta.
Sigam então para o Curto de hoje, uma boa peça. Hora de almoço, para aqueles que almoçam na realidade. Há muitos que vêem o
almoço por um canudo e nem o cheiram.
Quanto a Rio: só será enganado quem quiser.
Bom fim de semana, se
conseguirem. Façam por isso. Saúde. (MM | PG)
Bom dia, este é o Expresso Curto
33 dias depois
Cristina Figueiredo | Expresso |
opinião
Passam hoje 33 dias sobre a
eleição de Rui Rio como presidente do PSD. Mais de um mês em que o maior
partido da oposição esteve num original "stand by", com um líder
cessante que nem por isso cessou as aparições (nem as declarações) públicas, e
um líder eleito que elegeu o silêncio (o próprio e o dos mais próximos) como a
melhor (ou mesmo a única) ferramenta para combater a ansiedade dos que
esperavam dele mais ação do que preparação para a ação. Rio bem avisara (na
única - curta -
entrevista que deu, três dias depois da eleição): "Isto
não é ao cronómetro".
Anteontem (ao trigésimo primeiro dia), por fim, soubemos que convidou o
seu ex-adversário Pedro Santana Lopes para encabeçar a lista para o Conselho
Nacional e lhe cedeu a vez na escolha do próximo presidente do Instituto
Francisco Sá Carneiro (lugares importantes na simbologia partidária, mas
objetivamente irrelevantes na condução quotidiana do partido); também
anteontem, e também por fim, Hugo Soares convocou eleições para liderança
da bancada parlamentar já para a próxima semana; e ainda nem 24 horas
depois, Fernando Negrão (que apoiara Santana na campanha interna)
apresentou-se como candidato ao lugar (obviamente articulado com Rio).
Exclamamos, entre dentes como Galileu Galilei: eppur (o PSD) si muove. Já
não era sem tempo. Ou, melhor, já não havia mesmo mais tempo: os trabalhos do
37º Congresso social-democrata começam hoje, o que significa que, a partir
de hoje, Passos já era e Rio tem de ser. O novo líder do PSD não pode continuar
a ignorar o tal cronómetro que ostensivamente desprezou até aqui. É que já não
são dois anos: entre hoje e as próximas legislativas (que, no prazo ordinário,
acontecerão no final de setembro ou no início de outubro de 2019) medeiam um
ano, sete meses e alguns dias. E o prazo ainda encurta mais se as contas se
fizerem às europeias (que já têm data marcada para 26 de maio de 2019), o
primeiro teste eleitoral do novo líder social-democrata. Com os partidos à
esquerda do PS já em notória pré-pré-campanha eleitoral, Rio tem mesmo que dar
corda... e não é ao relógio, mas aos sapatos. Numa expressão feliz que o antigo
dirigente socialista Jaime Gama usava muito, não há uma segunda
oportunidade para causar uma boa primeira impressão. E a oportunidade de Rio é
hoje, é agora.
Estão elevadas, pois, as expectativas sobre o que vai ele dizer aos militantes
logo à noite, por volta das 21h30, num discurso desde já marcado pelo ingrato timing de
suceder às palavras de despedida de Passos Coelho. É a primeira vez que um
líder cessante fala num congresso, desde que há eleições diretas no PSD, como
lembrava ontem o Público (num artigo da Lusa) e isso
não pode deixar de ser relevado: Passos faz questão de sair pela porta
grande, vai ser ovacionado de pé e Rio sobe ao palanque logo a seguir.
Quem disse que era fácil?
Se o tema PSD lhe interessa, só não sabe tudo o que houver para saber já hoje
se não quiser, pois a imprensa traz abundante informação sobre o assunto.
Sugiro que comece por um divertido regresso ao passado: a Mariana Lima Cunha,
do Expresso, foi aos arquivos buscar
imagens dos momentos mais emblemáticos de vários congressos
sociais-democratas: do "misto de Zandinga com Gabriel Alves" com
que Durão Barroso descreveu Santana Lopes em 2000 ao "show de
Marcelo" em 2014, quando o agora Presidente da República apareceu de
surpresa no Coliseu dos Recreios;
"Rio e Negrão partiram 'do princípio' que bancada mudaria
de líder", explica o Público; Castro Almeida, um dos homens mais
próximos de Rio, dá uma
entrevista ao DN onde assume que "está ao
alcance do PSD ganhar as eleições legislativas" ; e Carlos Carreiras,
um dos mais próximos de Passos,
fala ao Eco para garantir que "não farei a
Rui Rio o que Rui Rio fez a Passos Coelho"; o jornal i conta que "deputados
que apoiaram Rio revoltados com a escolha para a liderança parlamentar" (link
ainda não disponível); a Renascença foi saber
como trabalhava Rio quando era presidente da Câmara do
Porto, numa conversa com o deputado do CDS (ex-vice de Rio na autarquia) Álvaro
Castelo Branco; e a TSF, depois de ontem ter entrevistado Miguel Albuquerque,
traz a antena Alberto João Jardim, que está otimista para o
novo ciclo no partido: "Está na altura do PSD ter juízo", diz. A
partir das 18h, a SIC assenta arraiais no Centro de Congressos de Lisboa para
uma emissão especial que dura até ao encerramento dos trabalhos, à hora de
almoço de domingo.
OUTRAS NOTÍCIAS CÁ DENTRO (sim, há mais vida para lá do PSD)
É um clássico do último dia dos prazos fiscais em Portugal: o Portal das
Finanças ameaça colapsar (ou colapsa mesmo), e
o Governo prolonga o prazo. Desta vez, os contribuintes
ganharam mais um dia para validar as faturas relativas a 2017 e obter o
máximo de deduções possível na declaração de IRS que terão de entregar já
a partir de março. O prazo para entrega da declaração periódica do IVA também
foi esticado até hoje.
É um clássico que já não se verificava desde novembro mas que é previsível que
volte a verificar-se com renovada frequência até... digamos... bem perto das
legislativas de 2019: os professores convocaram uma greve de 13 a 16
de março. A Marta Gonçalves
explica-lhe onde, quando (porque será uma greve
faseada por regiões) e, naturalmente, porquê.
Em greve, mas por ocasião das férias da Páscoa (entre a última
quinzena de março e a primeira de abril), vão estar também os tripulantes de
cabine da companhia de aviação Ryanair, como
noticia o Jornal de Negócios. O Sindicato Nacional do
Pessoal de Voo da Aviação Civil acusa a empresa de voos low-cost de não
respeitar a legislação laboral portuguesa.
O
Diário de Notícias conta que o projeto do PS para
alterar o regime das matérias classificadas não passou no crivo do
Gabinete Nacional de Segurança (responsável, precisamente, pela segurança dos
documentos "secretos"): as reservas desta entidade prendem-se com o
facto de o poder de classificar documentos, no projeto socialista, estar
disperso por demasiadas mãos.
O balanço do jogo entre o Astana e o Sporting para a Liga Europa, que os
leões venceram na capital do Cazaquistão por 3-1 (assim ficando muito bem
posicionados para passar aos oitavos de final da competição), domina o
noticiário desportivo. Na Tribuna, a Lídia Paralta Gomes
dá-lhe conta de um jogo que teve, literalmente, duas
partes: uma primeira "abaixo de zero" e uma segunda "a
ferver".
Jorge Jesus tem uma teoria, claro que tem, para o porquê da
coisa: “Fomos surpreendidos nos primeiros 20 minutos. Até a mim, se me
derem espaço, eu também jogo, já com 60 anos”.
António Costa vai passar o dia em Bragança e Vila Real, no primeiro dia
dedicado pelo primeiro-ministro ao Roteiro da Inovação
ontem aprovado em Conselho de Ministros.
Em Lisboa aguarda-se a visita do ministro das finanças britânico,
Philip Hammond. É a última escala do responsável britânico num périplo que o
levou a várias capitais europeias no caminho para o Brexit.
E LÁ FORA...
O massacre, anteontem, num liceu da Florida, continua nas primeiras
páginas dos maiores jornais, com os artigos a debruçarem-se sobre Nikolas Kruz,
o estudante de 19 anos que foi detido, suspeito (e já acusado oficialmente) de
ter morto a tiro 17 estudantes. "Suspeito tentou escapar
escondendo-se entre a multidão em fuga", escreve o
The Guardian. O
New York Times dá conta do apelo da mãe de uma das
vítimas a Donald Trump, para que o Presidente "retire estas armas das ruas".
Mas sobre o acesso dos cidadãos às armas, Trump, como se sabe, disse nada: o
Presidente norte-americano dirigiu-se ontem ao país lamentando a tragédia mas
focando-se apenas na "doença mental" como gatilho para o sucedido. O
Washington Post é implacável para com o POTUS: "Obama
esgotou as palavras sobre os tiroteios. Trump luta para as encontrar".
Em Espanha, ressurge a discussão sobre o separatismo. Isto a propósito da
intenção do Governo de Madrid de voltar a introduzir o castelhano como língua
oficial do ensino na Catalunha (onde as aulas são atualmente dadas em catalão).
Aos independentistas furiosos com essa possibilidade juntou-se já o Podemos.
Pode ler sobre o tema
aqui,
aqui ou
aqui.
Um dia depois de ter sucedido a Jacob Zuma na presidência da África do
Sul, Cyril Ramaphosa faz esta tarde (às 17h de Lisboa) um discurso sobre o
estado da nação sul-africana. Zuma renunciou ao cargo na quarta-feira,
antecipando-se a uma moção de censura que teria sido votada na quinta-feira, na
sequência das suspeitas do seu envolvimento em vários processos de corrupção.
Hoje é dia de Ano Novo... na China. Começa o ano do cão que, segundo
os especialistas, vai ser
"bom para a China" (nada de novo). Parece
que os nativos deste signo são "pessoas que trabalham com rigor,
responsáveis, firmes, que levam os projetos até ao final e não param a meio".
Não, Rui Rio é nativo de Galo (fui confirmar).
AS MANCHETES DOS JORNAIS
"Centeno proíbe hospitais de pagar a fornecedores" (Jornal de
Notícias)
"Consumidores dão 88 milhões na conta da luz para apoiar indústria" (Público)
"Gabinete de Segurança chumbou lei do PS para matérias classificadas" (Diário
de Notícias)
"As empresas não conseguem contratar porque as pessoas não querem
trabalhar " (i)
"Este monstro devia ter pedido perdão" (Correio da Manhã)
"Casas já se vendem em menos de 90 dias" (Jornal de Negócios)
"Ligados à Europa" (A Bola)
"Quase lá" (Record)
"Leão acordou a meio" (O Jogo)
O QUE ANDO A LER E A VER
É hoje, é hoje! Na Fox, às 22h15, é exibido o primeiro episódio da sétima
temporada de "Segurança Nacional" (que estreou nos EUA há cinco
dias). Se é fã não preciso de dizer mais nada, se não é não sabe o que perde:
resumidamente, Carrie Mathison é uma ex-agente da CIA que quer, mas não
consegue, deixar de salvar o mundo em geral e os EUA em particular. Assim dito
até parece mais do mesmo, mas garanto que não é. Como todas as séries
inteligentes, e "Segurança Nacional" é mesmo muito inteligente,
obriga-nos a pensar e a questionar a realidade complexa destes dias e a admitir
que muitas vezes vemos muito pouco para lá da superfície das coisas. O caderno
Ípsilon, do Público, traz hoje uma entrevista com o produtor da série, Alex
Gansa, que admite que
adorava falar com Trump sobre a série.
Ainda não consegui terminar "Para lá do inverno", de Isabel
Allende. Mas como gosto de adicionar dificuldade ao que já por si não é fácil
(ter tempo para ler mais do que jornais e feeds de notícias), comecei entretanto "Personal
history", a autobiografia de Katharine Graham, a lendária proprietária do
Washington Post - que fui recuperar na estante depois de ter ido ver "The
Post", nomeado para os óscares de Melhor Filme e Melhor Atriz Principal
(devido ao papel, magnífico como sempre, de Meryl Streep). Tenho uma edição (em
inglês - creio que não há tradução em português) do ano em que saiu, 1997, e
que comprei nesse mesmo verão em Washington, mas não cheguei a ler. O livro
valeria à sua autora um Pulitzer no ano seguinte e, vinte anos depois,
inspiraria Steven Spielberg a realizar um filme que reconcilia (fugaz mas
saborosamente) os jornalistas com uma profissão que continuamos a acreditar ser
nobre na essência mas que, sabemo-lo bem, já conheceu melhores dias. "Ah,
foi mesmo por isto que eu quis ser jornalista", dizemos para nós próprios
enquanto saímos do cinema, ainda a vibrar com a dedicação dos repórteres, a
convicção do diretor e a determinação (e coragem) da proprietária do Post que,
em 1971, desafiaram Richard Nixon e o Supremo Tribunal de Justiça e avançaram
com a publicação dos "Pentagon Papers", documentos classificados que
provavam como sucessivas Administrações norte-americanas mentiram ao povo e
mantiveram no Vietname uma guerra que sempre souberam estar perdida.
Claro que o jornalismo épico dos Pentagon Papers ou do Watergate é a excepção.
A regra são as notícias quotidianas que raras vezes merecem prémios mas nem por
isso são menos preciosas - afinal, cumprem essa singela função (que o ainda
incontrolável mundo das "fake news" veio complicar) para que foram
feitas: informar. Tenha um dia bom. E bem informado. É só saber onde clicar.
Por exemplo,
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aqui ou
aqui.