terça-feira, 6 de novembro de 2018

Sonny Lo | Macau e Hong Kong sofrem pelo “clima de insegurança” no seio do regime chinês


Sonny Lo defende que a crescente securitização vivida em Macau e Hong Kong é fruto de medidas mais rígidas adoptadas por Pequim devido a um clima de “insegurança” vivido no seio do regime chinês desde 2012, quando ocorreram os primeiros ataques terroristas no país e Xi Jinping sofreu algumas ameaças.

Convidado da Associação de Ciência Política de Hong Kong para a conferência anual promovida por esta entidade, o académico Sonny Lo, professor do Instituto de Educação de Hong Kong, falou no passado sábado sobre o crescente panorama de securitização vivido nas duas regiões administrativas especiais da China.

Ao HM, o professor universitário confessou que Macau e Hong Kong “estão a caminhar no sentido [da existência] de ‘Um País, vários sistemas’”, uma vez que “o desenvolvimento do conceito ‘Um País’ tem vindo a influenciar uma mudança no conceito ‘Dois sistemas’”.

Isto porque “a securitização do sistema político chinês desde o presidente Xi Jinping tornou-se visível quando este foi eleito secretário-geral do Partido Comunista Chinês em 2012, o que veio trazer uma transformação profunda nas formas como Hong Kong e Macau têm sido governadas”, referiu na sua apresentação.

Leia mais na edição impressa de amanhã do HM

O INCT e os desafios da investigação científica e tecnológica em Timor-Leste


Há uns dias tive uma reunião com Maria Costa, Secretária Executiva do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT). O desânimo é a palavra-chave para definir o estado de espírito desta investigadora, a única mulher timorense que possui um diploma de pós-doutoramento.

M. Azancot de Menezes* | Tornado | opinião

De facto, Maria Costa, doutorada em Biologia e pós-doutorada em Química pela Universidade de Aveiro, dedica-se de corpo e alma, desde 2016, com os seus abnegados funcionários, para conseguir a implementação plena dos estatutos da única instituição pública nacional vocacionada para desempenhar um papel central na supervisão, no desenvolvimento e na disseminação do conhecimento científico e tecnológico de Timor-Leste.

O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), aprovado pelo Decreto-Lei Nº 23/2014 de 3 de Setembro, tem autonomia administrativa, financeira, patrimonial, científica e editorial, com inúmeras atribuições que por serem imensas não as vou aqui mencionar, nem estou mandatado para o fazer, contudo, e já o afirmei numa intervenção na 7ª Conferência do Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa (FORGES) realizada em Novembro de 2017 em Moçambique, o INCT pode promover investigações científicas, cooperar com universidades, incentivar a difusão dos resultados de pesquisa, apoiar projectos de ensino e pesquisa e servir como repositório de ciência e tecnologia do Estado, entre outras competências e atribuições.

Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) precisa de mais atenção do Estado

No final do diálogo que tive com a investigadora Maria Costa ficou claro que o INCT pretende concretizar o processo de cooperação com as Instituições de Ensino Superior do país e com outras instituições de pesquisa com vista ao desenvolvimento da pesquisa científica e da formação de pesquisadores mas está impossibilitado de o fazer por falta de verbas e de outros apoios do Estado.

Para o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia no país, também mencionei esta preocupação em Moçambique, e partilho agora no Jornal Tornado, é imprescindível proceder-se a um inventário da actividade de pesquisa realizada e fazer o registo dos estudos científicos nacionais e internacionais da autoria de nacionais ou estrangeiros. O INCT possui alguns recursos humanos disponíveis e gostaria de concretizar esta finalidade mas está impossibilitado de o fazer por falta de verbas e de outros apoios do Estado.

É importante que a comunidade científica nacional e internacional, com destaque para a lusófona, e a sociedade em geral, conheçam os trabalhos científicos que estão a ser desenvolvidos no país, as áreas mais trabalhadas, e haver um cruzamento dessa informação no âmbito do plano estratégico nacional, e também para facilitar o intercâmbio científico entre os países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Para que se possa concretizar este desiderato terá que haver outra postura do Estado timorense. Os decisores políticos terão que ter uma visão estratégica no sentido de compreender e assumir, no espírito e na letra, que a investigação, ciência e tecnologia são o motor de desenvolvimento do nosso país.

Nesta linha de raciocínio parece-me da maior relevância que o Governo preste apoio ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) e que se elabore com carácter de urgência um Plano Estratégico para o Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia em Timor-Leste.

DESAFIOS QUE SE COLOCAM AO DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA E AO ENSINO SUPERIOR EM TIMOR-LESTE

Segundo estatísticas de 2017 existem em Timor-Leste treze Instituições de Ensino Superior. A Universidade Nacional de Timor Lorosa´e (UNTL), a única universidade pública, constituída por nove faculdades e outras unidades orgânicas – onde se incluem Centros de Investigação, o Instituto Politécnico de Betano, também público, e onze Instituições de Ensino Superior privadas reconhecidas pelo Governo.

No seu conjunto, estas Instituições de Ensino Superior timorenses englobam 50 a 60 mil estudantes e pouco mais de 2000 docentes, sendo 1222 com o grau de licenciado, 750 com o grau de mestre e 50 docentes com o grau de doutor.

Independentemente destas estatísticas estarem ou não actualizadas, há um conjunto de desafios fundamentais e urgentes que se colocam ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) e às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa. Partilhei estas preocupações na intervenção da 7ª Conferência do FORGES, pelo que, pela sua pertinência, aqui deixo para reflexão do nosso recém criado Ministério do Ensino Superior, Ciência e Cultura, bem como da comunidade científica e da sociedade em geral.

O primeiro grande desafio passa pela forma como perspectivamos o Ensino Superior. No meu entender, na linha do que tem sido defendido por Zabalza (2007), essa perspectiva terá que acontecer de forma “complexa”, com a inclusão de várias dimensões que dele fazem parte (Política de educação superior, Pesquisa científica, Mundo do trabalho e sociedade, Avaliação institucional e acreditação, Docência, Professor, Inovação curricular, Instituição/comunidade de formação e Estudante), num processo dinâmico e interactivo.

O segundo grande desafio passa pela promoção de Programas de Iniciação Científica em todas as Instituições de Ensino Superior de Timor-Leste. Portanto, uma questão central e estratégica é a contratação de docentes que sejam pesquisadores e contribuam para um ambiente institucional que potencie a pesquisa científica.

O terceiro grande desafio é a criação de um Repositório de Ciência e Tecnologia Nacional de livre acesso, sob supervisão e responsabilidade do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), para que os investigadores e a comunidade discente e docente possam registar os estudos nacionais e internacionais, e a sociedade em geral possa conhecer os estudos científicos, as dissertações de mestrado e as teses de doutoramento produzidas no país ou em cooperação internacional.

O quarto grande desafio relaciona-se com a reformulação das políticas de educação superior e dos critérios e procedimentos utilizados na concessão de bolsas de estudo e atribuição de subsídios. Efectivamente, tal como os téoricos e críticos nos vêm ensinando desde finais da década de 60 e 70, e estou a referir-me a Bourdieu e Passeron, não pode escamotear-se o facto do sucesso educativo depender muito das condições sociais, económicas e culturais do estudante, realidades que tornam ainda mais urgente estudar as medidas de acção social possíveis, para além da atribuição das bolsas de estudo, que contribuam para elevar o grau de equidade do sistema.

O quinto grande desafio é o início do processo de avaliação da pesquisa, seja através de publicações, seja mediante a adopção de outros critérios transparentes e rigorosos reconhecidos pela comunidade científica internacional. A avaliação da pesquisa é fundamental porque os investigadores devem expor os seus trabalhos científicos, valorizando-se a qualidade, a ética e a integridade.

O sexto grande desafio para Timor-Leste passa pelo incremento de programas de pós-graduação pois, como todos bem sabemos, o aumento da produção científica está associado à existência de cursos de pós-graduação, de mestrado e de doutoramento.

*Professor universitário

Moçambique | Ataques armados em Cabo Delgado pressionam órgãos da justiça


Os ataques armados, em Cabo Delgado, estão a criar uma pressão aos órgãos de Justiça, que pedem uma ajuda especial do governo devido a complexidade e sensibilidade do caso.

Para os órgãos de Justiça em Cabo Delgado, os ataques armados, exigem uma atenção especial do governo, por se tratar de um caso histórico e sensível , devido ao tipo de crime, e complexo, devido ao elevado número de arguidos.

A preocupação foi apresentada pelo Director provincial de Justica durante as comemorações do dia da legalidade.

Na ocasião, o governador de Cabo Delgado, Júlio Parruque, reconheceu a preocupação e as dificuldades dos órgãos de justiça, mas mesmo assim, espera que os culpados sejam aplicadas penas exemplares.

O julgamento do caso ataques armados em Cabo Delgado, iniciou do dia três de Outubro último, e já foram ouvidos em audição, mais da metade dos 189 arguidos do processo 32/2018.

Hizidine Achá | O País

CEDEAO quer eleições na Guiné-Bissau até ao fim do ano


Continua a não haver consenso quanto a nova data para as eleições legislativas na Guiné-Bissau. Para a Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO), a votação não deveria ser adiada para o próximo ano.

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Nigéria, Geoffrey Onyeama, afirmou esta segunda-feira (05.11) em Bissau que a Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO) quer que as eleições legislativas na Guiné-Bissau se realizem ainda este ano.

No final de uma visita de algumas horas a Bissau, o chefe da diplomacia nigeriana, que liderava uma delegação da qual faziam parte, entre outros, o presidente da comissão da CEDEAO, Jean-Claude Brou, disse ter transmitido aos responsáveis políticos e da administração eleitoral e aos representantes da comunidade internacional que as eleições devem ter lugar antes do final de 2018.

A delegação da CEDEAO reuniu-se, por duas vezes, com o Presidente guineense, José Mário Vaz, com o primeiro-ministro do país, Aristides Gomes, partidos políticos e ainda com representantes do P5, espaço de concertação entre as Nações Unidas, União Africana, CEDEAO, Comunidade de Países de Língua Portuguesa e União Africana.

Para quando eleições?

As eleições legislativas na Guiné-Bissau estavam inicialmente marcadas para dia 18 deste mês, mas dificuldades na preparação do processo, nomeadamente atrasos no recenseamento eleitoral, levam a que o escrutínio seja adiado para uma data ainda por marcar.

Os atores políticos ainda não alcançaram um entendimento quanto à nova data, com alguns a pedirem mesmo a mudança do atual Governo, que acusam de incapacidade para organizar as eleições.
Nova data "em concertação com CEDEAO".

A posição quanto à necessidade das eleições se realizarem este ano foi também vincada no comunicado final da visita da CEDEAO, ao qual a agência de notícias Lusa teve acesso.

No documento lê-se que a CEDEAO saúda a decisão das autoridades eleitorais em prolongar o recenseamento eleitoral até dia 20 deste mês, mas convida os atores políticos a uma abertura para permitir que as legislativas tenham lugar antes do final do ano.

"Uma nova data [das eleições] será proposta às autoridades em concertação com a CEDEAO", sublinha o comunicado.

No documento, a organização sub-regional africana promete desencadear diligências para que os equipamentos de registo biométrico de potenciais eleitores cheguem à Guiné-Bissau no mais breve prazo, sem, contudo, indicar uma data exata.

A CEDEAO exorta ainda as autoridades a tudo fazerem para que as eleições decorram num clima de total transparência e credibilidade.

O comunicado felicita, igualmente, o Presidente e o primeiro-ministro guineenses pelos esforços desenvolvidos para que as eleições tenham lugar em 2018, conforme decisão saída da última cimeira de líderes da CEDEAO.

Agência Lusa | em Deutsche Welle

Eleições nos EUA. O valor de uma cuspidela


Os norte-americanos vão hoje às urnas escolher entre Republicanos e Democratas. Há alaridos em suspensos sobre se os Democratas vão crescer na votação e os Republicanos perderem lugares. O que talvez não esteja esclarecido para as pessoas é que independentemente do resultado tudo continuará na mesma e Trump prosseguirá a sua senda xenófoba e outras de “artes” habituais, mas também novas. Essas podem vir a ser mais perigosas para o mundo no que se refere à economia e à paz que já é tão periclitante.

De um modo ou de outro para Trump o resultado terá o desprezo de uma cuspidela. Se assim não acontecer será surpreendente.

Dito. Mais sobre o assunto está já a seguir no Expresso. Lauda de  Santos Costa e sabe disto. Fiquemos mais esclarecidos ao ler. Força.

Bom dia e boas festas aos animais de estimação. (MM | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Trump quer apanhar boleia da caravana. Mas pode ficar apeado

Bom dia.
Filipe Santos Costa | Expresso

Uma caravana de migrantes que se desloca no México, em direção a norte, rumo à fronteira dos EUA, tornou-se no principal argumento de Donald Trump para as eleições de hoje nos Estados Unidos. Numa campanha de choque e pavor, sempre em tom nós-contra-eles, Trump nunca hesitou em espicaçar o medo dos eleitores norte-americanos em relação a uma hipotética invasão do país por uma horda de sul-americanos-criminosos-terroristas-traficantes-de-droga-violadores-e-assassinos-de-polícias.

Se julga que exagero, acredite que não. Ao ponto de um anúncio da campanha de Trump ter sido recusado pela NBC, pela CNN, pelo Facebook e até, pasme-se!, pela Fox News, o canal de “informação” que desde a campanha de 2016 leva Trump ao colo. O anúncio em causa misturava imagens da caravana com as de um mexicano que estava ilegal nos EUA e foi condenado em março pelo assassinato de dois polícias, tudo embrulhado em acusações sem fundamento contra o Partido Democrata. Se até a Fox achou que a coisa era racista e incendiária, imagine…

O que está em causa hoje nas eleições parlamentares (chamam-se intercalares porque acontecem a meio do mandato presidencial) é, basicamente, o futuro da presidência de Trump. São as condições em que o inquilino da Casa Branca poderá continuar a governar - logo, as condições em que se apresentará para a reeleição. Ou, como escreve a Vox, os eleitores decidirão que controlo será exercido sobre o poder dos republicanos, que atualmente dominam a Casa Branca e as duas câmaras do Congresso.

Embora o presidente não vá a votos, foi ele quem mais fez para tornar o dia de hoje num plebiscito a si próprio. E assim será: se os republicanos mantiverem a maioria no Congresso, Trump será religitimado, esmagará as resistências que ainda existem em relação a si no Partido Republicano, quebrará a espinha ao Partido Democrata e poderá mais facilmente concretizar as suas promessas eleitorais e ser reeleito em 2020. Se...

Todas as previsões indicam que Trump sofrerá pelo menos meio-revés. Embora tenha boas hipóteses de segurar a vantagem republicana no Senado, a maioria da Câmara dos Representantes deverá virar para os democratas. A diferença tem a ver com o que está em disputa. Estão em jogo todos os 435 lugares da Câmara dos Representantes, mas apenas um terço dos lugares do Congresso (35 dos 100 senadores). A Vox, que explica tudo melhor do que a concorrência, tem aqui o que precisa de saber. Em português, recomendo o trabalho do Público(acesso condicionado).

Com todos os lugares da câmara baixa em aberto, mais facilmente se refletirá nessa votação a impopularidade de Trump. No Congresso é mais complicado: dos 35 lugares em jogo, só nove são atualmente de republicanos, enquanto 26 são de democratas - ou seja, a esquerda tem de segurar muitos mais lugares do que os conservadores. Bastaria que os democratas não perdessem qualquer corrida e tirassem dois assentos aos republicanos para ficarem em maioria no Congresso - mas não é fácil, apesar de um dos maiores pontos de interrogação ser o Texas, estado tradicionalmente republicano onde, para surpresa de todos, Beto O’Rourke ameaça o poderoso Ted Cruz com uma campanha ao contrário daquilo que a América tem visto: otimista, inspiradora e positiva (tenha atenção, vamos ouvir falar dele).

A confirmarem-se as sondagens, a câmara baixa do Congresso poderá bloquear quase toda a ação da Casa Branca, tornando o país de Trump, já politicamente caótico, ingovernável.

Mas nada é garantido para os democratas - precisam, sobretudo que haja grande mobilização de mulheres e de minorias étnicas, e que o discurso de Trump não consiga, do seu lado, uma mobilização semelhante. E convém lembrar que a economia e o emprego estão em alta, embora esse argumento não seja central no discurso do presidente. Para Trump tem sido mais importante agitar o papão dos imigrantes, acusar os democratas de todas as malfeitorias possíveis e achincalhar as mulheres que acusaram Bret Kavanaugh, o juiz do Supremo Tribunal. À cautela, até já veio avisar para fraude eleitoral. Enfim, um repertório bem conhecido.

OUTROS TEMAS

João Galamba apresentou a sua visão para o setor da energia. Sem surpresa, nessa visão aparece Sócrates.

Mais um dia, mais um desmentido. Marcelo Rebelo de Sousa voltou a negar qualquer conhecimento das manobras de encenação e encobrimento relativas à devolução das armas de Tancos. Numa nota oficial, o chefe do Estado garante que nunca teve contactos com o diretor ou outro elemento da PJ Militar nem estava a par da operação de descoberta das armas.

Também António Costa voltou a falar do assunto. Depois do Presidente da República ter assegurado que, sobre este caso, ninguém o cala, o primeiro-ministro veio, à sua maneira sibilina, recomendar menos ansiedade a Marcelo. O Público puxa para manchete esta subida de tensão entre Governo e Presidência.

Rui Rio, o único político que teve pressa de anunciar que sabia mais sobre Tancos do que aquilo podia dizer, declara agora que “até ver” recusa qualquer envolvimento do Presidente da República na encenação da recuperação das armas. Quanto a António Costa, Rio insiste que deve dar explicações no Plenário e não na comissão parlamentar de inquérito (CPI) - este recurso, insiste, será só “numa situação excecional”. Ou seja, aquilo que é Tancos desde o início. Aliás, o líder parlamentar do PSD, Fernando Negrão, já admitiu ao Expresso a hipótese de questionar o primeiro-ministro na CPI, e até Costa já se disse disponível para isso.

Já que falamos em Rui Rio: o líder do PSD reafirmou a confiança no seu secretário-geral. O mesmo que oficialmente estava em reuniões da Assembleia da República a que, na verdade, não foi. O facto, como noticiou o Expresso no sábado, é que alguém validou por José Silvano a presença em plenários da Assembleia da República onde este não estava - com a correspondente retribuição financeira. Um mistério que o secretário-geral do PSD confessou não conseguir explicar. Mas nada que faça Rio perder a confiança em Silvano. Considera o caso “uma pequena questiúncula”, ainda que não seja um caso “agradável nem positivo”.

Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, ainda nada disse sobre mais este caso que envergonha o Parlamento.

De acordo com o Expresso Diário de ontem, o BE vai aliar-se à direita para garantir a redução do IVA nos festivais de verão. Uma maioria negativa para uma notícia positiva.

Começou a Web Summit, no Parque das Nações, em Lisboa. O Expresso espreitou para o iPhone do fundador do evento, Paddy Cosgrave, e conta o que lá viu. O Eco deitou contas aos números da cimeira. Ontem, o inventor da internet foi o primeiro orador e deixou um plano para tornar a sua invenção melhor, mais inclusiva e mais segura. Estas são as principais palestras previstas para hoje.

O Novo Banco perdeu uma batalha de milhões, noticiou a SIC. O património insolvente do Grupo Espírito Santo na Beira Baixa vai mesmo ser colocado à venda, mas o NB não receberá um cêntimo desse negócio.

Outra investigação da SIC dá conta do abandono de locomotivas e carruagens da CP nas oficinas da EMEF, ao mesmo tempo que são suprimidas carreiras por alegada falta de material circulante.

Os juizes entregaram o pré-aviso de greve no Conselho Superior de Magistratura. Serão dez dias de paragem ainda este ano e mais onze no ano que vem. Em causa estão reivindicações salariais. Uma greve que o constitucionalista Jorge Miranda considera “inadmissível”.

A ex-procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, vai fazer uma comissão de serviço no Tribunal Constitucional.

Há 14 consórcios internacionais interessados na construção e operação de um centro espacial na ilha de Santa Maria, nos Açores. Um deles é a agência espacial russa.

No Brasil, a defesa de Lula da Silva entregou um novo pedido de “habeas corpus”, depois de confirmada a transferência de Sérgio Moro da justiça para a política. Moro foi o juiz que conduziu a investigação do processo Lava Jato, que culminou com a prisão de Lula, impedido de concorrer à Presidência do Brasil. Os defensores de Lula alegam “falta de imparcialidade do juiz”, pedindo a anulação de todas as suas decisões em relação ao ex-presidente brasileiro.

Para quem as queira ouvir, as Spice Girls vão voltar. É oficial. Mas serão só quatro - Victoria Beckham não volta. Em todo o caso, não cantava.

AS MANCHETES DE HOJE

Jornal de Notícias: Demolições na costa começam já para o ano
i: Bloco quer suspender o Dia da Defesa Nacional
Negócios: Salários levaram 60% do aumento da despesa em Saúde
Correio da Manhã: Buraco de 90 milhões na saúde militar
Público: Caso Tancos faz subir tensão entre Presidente e Governo

O QUE ANDO A LER

Em 2016, durante a campanha para as presidenciais nos EUA, Donald Trump republicou na sua conta de Twitter uma citação de Mussolini: “É melhor ser leão por um dia do que viver cem anos como cordeiro”. A frase tinha sido publicada numa conta de paródia (@ilduce2016), com o hashtag #MakeAmericaGreatAgain - era um teste do site Gawker para ver se Trump resistiria à tentação de difundir frases do ditador fascista que pudessem ser associadas à sua campanha. Trump, claro, não resistiu. Quando a partida foi revelada pelo site que a promoveu, o jornalista do Gawker escreveu: “Donald Trump é fascista? Especialistas, historiadores e comentadores há meses que debatem a questão. Uma coisa é já certa: Ele escreve tweets como um” (soa melhor em inglês: “He tweets like one”).

Este episódio não está incluído no novo livro de Madeleine Albright, mas podia estar. “Fascismo - Um Alerta” (ed. Clube do Autor) dedica a Trump um dos seus capítulos mais críticos, elevando o presidente norte-americano à categoria de grande incentivador, ou avalista, da nova vaga de líderes autoritários que vão ocupando o poder um pouco por todo o Mundo.

Na epígrafe de “Fascismo”, Albright usa uma frase de Primo Levi: “Todas as eras têm o seu fascismo.” Mais adiante, prossegue a citação de Levi sobre as formas do fascismo: “não apenas através do terror da intimidação policial, mas negando e distorcendo a informação, minando o sistema de justiça, paralisando o sistema educativo e espalhando numa miríade de modos subtis a nostalgia por um mundo em que a ordem reinava”.

Este ponto de partida permite a Albright uma visão muito ampla (e muito pouco rigorosa) sobre o que pode ser considerado fascismo. E, daí, sobre o que pode caber neste seu “alerta”. “Quando se aborda este tema”, escreve a primeira mulher a chefiar a diplomacia dos EUA, "muitas vezes surgem confusões acerca das diferenças entre fascismo e conceitos relacionados, como totalitarismo, ditadura, despotismo, tirania, autocracia, e assim por diante. Na qualidade de académica, posso sentir-me tentada a vaguear por esse matagal, mas, como antiga diplomata, preocupo-me sobretudo com os atos, não com as etiquetas. Na minha ideia, fascista é alguém que se identifica fortemente com uma nação inteira ou com um grupo e que reivindica falar em seu nome, alguém que não se preocupa com os direitos dos outros e que está na disposição de usar todos os meios necessários – incluindo a violência – para alcançar os seus objetivos. Dentro desta conceção, um fascista será talvez um tirano, mas o tirano não tem de ser fascista.”

Para quem diz que não se preocupa com etiquetas, é sintomático que tenha escolhido para título do livro a etiqueta mais vistosa que poderia encontrar: “fascismo”. Chamar-lhe “autoritarismo”, ou “extremo-nacionalismo populista” não teria o mesmo impacto. Alarmista? Sim, mas como dizia a ex-secretária de Estado dos EUA numa entrevista publicada ontem no Público, “se queremos que alguém saia da cama de manhã, utilizamos um relógio de alarme”.

Por isso convivem nestas páginas, lado a lado, as referências históricas de Hitler e Mussolini e uma ampla galeria de protagonistas dos nossos tempos, uma espécie de liga autoritária mundial, capitaneada por Trump e Putin, que junta o turco Erdogan, o filipino Duterte, o húngaro Orbán, os venezuelanos Chávez e Maduro, o norte-coreano Kim Jong-un, os polacos Kaczynsky. E aposto que só não está lá Bolsonaro porque o livro foi lançado nos EUA em abril.

Apesar da ligeireza teórica com que trata o fascismo, Albright apresenta um caso convincente sobre a força que estão a ganhar os inimigos da democracia liberal. Basta que se juntem as condições certas, como se viu na Venezuela - “A experiência venezuelana mostra que, quando as condições sociais e económicas se deterioram e os políticos democráticos falham no dever de liderar, é difícil resistir à tentação de ir atrás de um flautista mágico.”

O exemplo de Caracas é demasiado distante? Olhe-se então para o que propõem os partidos de extrema-direita que vão ganhando força na Alemanha, na Grécia, na Suécia, na Finlândia, em França, na Áustria. “Nos programas e declarações destes partidos ouvimos ecos de temas fascistas clássicos: medos da decadência e do declínio; afirmação de uma identidade nacional e cultural; uma ameaça à identidade nacional e à boa ordem social por parte de estrangeiros não assimiláveis; e a necessidade de maior autoridade para lidar com estes problemas.

E convém não esquecer nem desvalorizar o efeito-Trump. “O Presidente dos EUA deve ser líder na defesa das instituições, princípios e práticas democráticas. O atual Presidente não abraçou esse papel, que nem tenho a certeza se compreende. Essa falha encorajou líderes noutros países que querem aumentar os seus poderes sem respeito pelos valores democráticos”, disse Albright, numa entrevista ao Expresso publicada em outubro. Entrevista que tinha como título: “O fascismo cresce onde as pessoas são convencidas de que toda a gente mente”.

E se Primo Levi tiver mesmo razão? “Se ele tiver razão (e penso que tem)", escreve Albright, temos motivos para estar preocupados com a variedade que se está a juntar de correntes políticas e sociais que nos golpeiam atualmente – correntes impulsionadas pelo lado negro subterrâneo da revolução tecnológica, os efeitos corrosivos do poder, o desrespeito do presidente americano pela verdade e a aceitação crescente de que os insultos desumanizadores, a islamofobia e o antissemitismo se situam dentro dos limites do debate público normal. Ainda não chegámos lá, mas estes parecem ser já sinais ao longo de uma estrada para regressar a uma era em que o fascismo encontrou alimento para si e as tragédias individuais se multiplicaram por milhões.”

Retenho, desta última frase, quatro palavras: “Ainda não chegámos lá.”

Tenha um bom dia.

Portugal | O crime não pode compensar


Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

Foi durante a Comissão de Inquérito ao BES que Luís Horta e Costa, antigo administrador da ESCOM, explicou o paradeiro da comissão de €27 milhões que a sua empresa recebeu por ter sido intermediária na compra de dois submarinos pelo Estado português. Sabia-se que 5 milhões tinham sido entregues à família Espírito Santo e 16 milhões aos administradores da própria ESCOM. Foi com espanto que a Comissão ouviu de Horta e Costa que os outros 6 milhões tinham sido "investidos" a montar um esquema de ocultação e fuga ao Fisco, que envolvia fundos e contas bancárias offshore para todos os gostos. Faltava então saber como voltou o dinheiro a Portugal. Horta e Costa explicou: "Há uma lei aprovada aqui na Assembleia da República, e foi essa que a gente aproveitou".

A lei que permitiu ao clã Espírito Santo repatriar o seu capital sem outras consequências, a troco de uma pequena taxa de imposto, foi o Regime Especial de Regularização Tributária - RERT I, aprovado em 2005 pelo PS. Depois disso, não só Salgado como muitas outras personalidades e empresas puderam branquear as suas práticas de fraude e fuga ao Fisco através de mais dois RERT, um em 2010 e outro em 2012. Este último, aprovado já no tempo de Passos Coelho, foi o mais bem-sucedido. Pelo pagamento de uma modesta taxa de 7,5%, foi possível amnistiar 3445 milhões de euros, sem que sequer fosse exigida a repatriação desse dinheiro.

Por conta destes RERT o Estado perdoou mais de 3 mil milhões de euros relativos a mais de 7 mil milhões, cujos detentores foram amnistiados dos seus crimes e fraudes. Como se isto não fosse chocante e perverso quanto baste, quem fez estas leis delegou no sistema financeiro a responsabilidade de certificar os clientes que acederam a estas amnistias, e no Banco Portugal as funções de guardião da informação. O que é que isto quer dizer na prática? Quer dizer que a Autoridade Tributária (AT) não tem como investigar estas pessoas e empresas.

Quem usou um RERT poderá sempre usar esse certificado como um salvo-conduto que impede o Fisco de investigar, não só essa, mas outras operações não amnistiadas. O Fisco está de mãos atadas e trabalha às escuras.

O Bloco votou contra todos os RERT, criados pelas mãos, ora de PS, ora de PSD e CDS. Sabemos que dificilmente se podem alterar leis do passado. Mas isso não quer dizer que pactuemos com o regime de opacidade por elas criado. Porque não o queremos fazer apresentámos uma proposta para que a AT possa deter e controlar a informação relativa aos RERT, impedindo que estes sejam usados abusivamente para proteger outras fraudes. É o mínimo da decência exigida por quem não se resigna à ideia de que o crime compensa.

* Deputada do BE

Merkel e o seu contributo para a consolidação da democracia europeia


Ana Alexandra Gonçalves* | opinião

Angela Merkel, considerada agora como liderando o grupo de grandes arautos da Europa democrática, anunciou o seu abandono do seu partido, CDU.

Ainda não tendo abandonado quer o partido, quer o próprio cargo de chanceler que, ao que tudo indica, é mesmo para levar até ao fim, já há quem lamente a saída da maior figura democrata da Europa recente.

Para a construção dessa imagem muito tem contribuído uma inacreditável falta de memória ou, uma incapacidade de relacionar as decisões tomadas, sobretudo na esfera económica, e um afastamento cada vez mais notório dos cidadãos relativamente aos políticos e aos partidos convencionais. 

Merkel e o seu governo, liderando uma Europa que continua a ser acéfala, humilharam Estados-membros da UE, empurrando-os ainda mais para a miséria, depois de anos e anos a despejarem nesses mercados o que se produzia na Alemanha, dando um forte contributo para o endividamento dos países que mais tarde viriam a ser alvo da humilhação.

Ora, neste contexto considerar a chanceler alemã como o melhor exemplo de democrata é simplesmente desonesto. A sua acção política, que contou com a participação central do inefável Schäuble, deu uma forte machadada no projecto europeu de democracia, ou alguém pode esperar que esse projecto subsista quando não existiu o mínimo de coesão? 

De resto, muitos almejaram uma Europa como antídoto contra as divisões e contra as ideologias mais nefastas. Merkel, ao contrário do que por aí dizem, não protegeu a Europa dessas investidas anti-democráticas, bem pelo contrário, ao humilhar, ao desprezar e ao cuspir em cima de alguns Estados-membros deu um forte contributo para o enfraquecimento do próprio projecto europeu.

*Ana Alexandra Gonçalves | Triunfo da Razão

Um referendo sobre Trump


Americanos devem comparecer em número recorde às urnas, em eleições legislativas tidas como um termômetro da atual gestão. Se perder maioria no Congresso, presidente pode ter projetos travados pelo restante do mandato.

Os eleitores americanos vão às urnas nesta terça-feira (06/11) para renovar parte do Congresso. As eleições de meio de mandato ("midterm") ocorrem sempre cerca de dois anos após a posse do presidente e, especialmente neste ano, são vistas como um referendo sobre a gestão na Casa Branca.

O pleito pode ter consequências sobre a agenda do governo Donald Trump no Congresso: se o governo perder a maioria, os projetos que dependem da aprovação das duas casas podem ficar travados pelo restante de seu mandato. Um exemplo é o polêmico muro na fronteira dos EUA com o México.

Hoje, o Partido Republicano, de Trump, tem a maioria tanto na Câmara dos Representantes quanto no Senado. Pesquisas preveem que os republicanos percam a maioria entre os deputados, mas continuem sendo a maior força entre os senadores.

Além de frustrar a agenda legislativa de Trump, um revés dos republicanos na Câmara permitirá que os democratas criem comitês para investigar erros nas condutas pessoal e profissional de Trump e, possivelmente, até processos de impeachment do presidente.

A Câmara dos Representantes tem 435 deputados. Os estados são representados proporcionalmente de acordo o número de habitantes. Hoje são 236 republicanos, 193 democratas e seis assentos vagos. Todas as vagas são disputadas a cada dois anos, e o novo mandato dos parlamentares começará em janeiro de 2019.

O presidente da Câmara é o republicano Paul Ryan, de Wisconsin, que não está buscando a reeleição. A democrata e ex-presidente da Casa Nancy Pelosi é a líder da minoria democrata. Os democratas precisam ganhar 23 cadeiras para assumir o controle. Há boas chances de que consigam.

Já o Senado é composto por 100 parlamentares, sendo dois senadores para cada estado. A atual legislatura é composta por 51 republicanos e 49 democratas. Com mandatos de seis anos, cerca de um terço do Senado está em jogo a cada dois anos.

Na eleição desta terça-feira, 35 assentos estão em disputa – 26 deles atualmente ocupados por democratas, e nove por republicanos. O líder da maioria no Senado é Mitch McConnel, do estado de Kentucky. No Senado, é provável que os republicanos mantenham a maioria. 

Além de renovar o Congresso, os eleitores de 36 dos 50 estados americanos vão às urnas para eleger governadores neste ano. Atualmente, os republicanos controlam 29 estados, e os democratas, 21.

Duas disputas têm grande destaque neste ano: na Geórgia, onde a democrata Stacey Abrams tenta se tornar a primeira mulher negra a ser governadora de um estado americano; e na Flórida, onde o democrata Andrew Gillum está em disputa árdua com o republicano Ron DeSantis.

Além de eleger seus legisladores, americanos em vários estados vão decidir ainda sobre diferentes temas: cinco estados votam a legalização da maconha medicinal ou recreativa; dois sobre o aumento do salário mínimo e três sobre acesso ao aborto e financiamento para a realização do aborto.

Uma pesquisa divulgada no domingo (04/11) pela NBC News e o periódico The Wall Street Journalmostra a demografia do voto americano. Os democratas lideram entre os eleitores afro-americanos (84% contra 8%), latinos (57% a 29%), de 18 a 34 anos (57% a 34%), mulheres (55% contra 37%) e independentes (35% a 23%).

Entre as mulheres brancas com diploma universitário, os democratas têm 28 pontos percentuais de vantagem: 61% contra 33% para os republicanos.

Por outro lado, os republicanos lideram entre os eleitores entre 50 e 64 anos (52% a 43%), homens (50% a 43%) e brancos (50% a 44%). Eles também têm a maioria dos votos dos homens com diploma universitário (65% a 30%).

Os democratas esperam eleger um número recorde de mulheres para o Congresso. Eles também devem fazer história com a eleição de candidatos LGBT e muçulmanos. O ex-presidente Barack Obama tentou motivar os eleitores nos últimos dias antes da votação.

"Uma eleição não eliminará o racismo, o sexismo ou a homofobia", disse Obama em uma aparição na Flórida. "Isso não vai acontecer em uma eleição, mas será um começo."

Já Trump fez discursos contra imigrantes latino-americanos que procuram asilo na fronteira dos EUA. Com uma caravana de migrantes centro-americanos se aproximando das fronteiras americanas, ele enviou mais de 5 mil homens para a região. O presidente afirmou que os soldados poderão usar força letal contra quem jogue pedras.

Cerca de 37% dos eleitores participaram das eleições legislativas de 2014, contra 42% em 2010. Já na votação de 2016, quando a Presidência estava em jogo, mais de 60% dos eleitores foram às urnas. Há a expectativa de que os últimos acontecimentos, como a caravana de latinos em direção aos EUA, possam levar a um recorde de participação eleitoral.

FC/afp/ap/ots | Deutsche Welle

Breve ensaio sobre a irracionalidade humana


Historiadora norte-americana descreve, em livro, a louca propensão das sociedades a insistir em seus próprios erros, ignorando os fatos “incômodos”. Algo a ver com o Brasil de 2018?

Ladislau Dowbor | Outras Palavras | Imagem: Louise Williams

Resenha de:
The March of Folly: from Troy to Vietnam [“A marcha da Insensatez: de Troia ao Vietnã”]
De Barbara W. Tuchman – Random House, New York, 2014 – 470 p.

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A minha idade e a minha confiança na racionalidade do ser humano têm evoluído em sentidos inversos. Mas como somos animais sofisticados, quanto mais absurdo o que defendemos, mais argumentos racionais inventamos. E, sobretudo, quando já fomos identificados com uma posição ou atitude política completamente absurda, conseguimos apenas nos aprofundar na burrice. Segundo as sábias palavras de Barbara Tuchman, a propósito de como os norte-americanos foram se afundando no Vietnã, ao custo de imenso sofrimento daquele povo, e desgaste político de quatro sucessivos presidentes, “uma vez que uma política foi adotada e implementada, toda atividade subsequente se transforma num esforço para justificá-la.” (263) Qualquer semelhança com o golpismo no Brasil insistir numa política que empurra o país para trás, mesmo depois de 4 anos de desastre, não é evidentemente uma coincidência, é a regra. No túnel da burrice, os que a perpetram sempre imaginam que logo adiante surgirá a proverbial luzinha. Se a política sacrifica em vez de ajudar, dirão que o sacrifício não foi suficiente, é só aprofundar um pouco mais.

Não perceber a nossa irracionalidade é simplesmente perigoso. E obviamente pouco inteligente. Nada como a história para substituir o conceito de homo sapiens pelo de homo demens. Já pensaram que em nenhum momento da história registrada da humanidade deixamos de nos massacrar uns aos outros? Em cada guerra ou massacre que estudamos, buscamos definir quem eram os bons e quem eram os maus. E se a própria incapacidade de vivermos em paz e colaboração, o que sem dúvida seria mais proveitoso para todos, fosse objeto da nossa análise? Eu gosto muito do texto de Frans de Waal, Our Inner Ape (O Primata Dentro de Nós), em que surge com toda clareza o quanto nos comportamos, quanto à defesa dos nossos territórios, como os nossos parentes mais próximos, os chimpanzés [leia resenha]. Guerras tribais, guerras nacionais, guerras mundiais, alguma delas tem algum sentido?

Um outro belíssimo texto, The Righteous Mind (a mente moralista), Jonathan Haidt analisa as nossas motivações, e em particular como as conseguimos embelezar [leia resenha]. O Ku-Klux-Klan massacrava para proteger as virgens brancas e queimava casas para civilizar os negros. Os nazistas estavam limpando a raça. As guerras das religiões mataram e torturam em toda parte segundo as ordens expressas dos respectivos deuses. A inquisição torturava mulheres, de preferência nuas, para extirpar o demônio que se apossara das suas almas. No Vietnã mataram dois milhões, na Argélia um milhão, na II Guerra Mundial 60 milhões, o Oriente Médio está aumentando a conta a cada dia. Tudo em nome dos mais elevados ideais. O que Haidt deixa claro é como é agradável, profundamente satisfatório, dar livre vazão do que há de mais podre dentro de nós, em nome dos mais elevados ideais. É o orgasmo supremo. O ódio justificado gera um gozo irreprimível. É ignorância? Sem dúvida, mas não falta de diplomas. Metade dos médicos da Alemanha aderiu ao partido nazista.

Barbara Tuchman escreve muito bem, e isso não é secundário. Mas em particular faz uma análise maravilhosa da burrice no poder, da imensa capacidade de coletivos humanos de gente bem informada, e com poder de decisão, se enterrar em políticas que não só representam interesses egoístas, mas que ao fim e ao cabo prejudicam os próprios agentes que as implementam. É o que ela chama de folly, insensatez: “a implementação de políticas contrárias ao próprio interesse da instituição ou do Estado envolvido. Auto-interesse é qualquer política que conduz ao bem estar ou vantagem do grupo sendo governado: insensatez é uma política que nestes termos é contraprodutiva.” (6) A exploração colonial por parte da Grã-Bretanha era uma violência inadmissível, mas pelo menos compreensível pelas vantagens. A extorsão que tentaram impor à sua colônia americana foi tão burra que conseguiram obter o impensável: a unificação indignada dos tão diversos segmentos do que hoje são os Estados Unidos, e uma guerra fadada ao desastre. É o que resumimos no Brasil com a expressão “dar um tiro no próprio pé.” Haja tiro, e haja burrice.

As patéticas políticas da Grã-Bretanha frente aos Estados Unidos foram em grande parte devidas ao que podemos chamar de solidariedade da ”patota”, que permite avançar gloriosamente até a evidente derrota. Tentando entender a marcha da insensatez dos britânicos, Tuchman lembra como era a composição dos ministérios: “Eles provêm de cerca de 200 famílias incluindo 174 nobres em 1760. Conheciam-se da escola e da universidade, eram relacionados por meio de cadeias de primos, alianças de casamentos, sogros e familiares de segundos e terceiros casamentos. Casavam com as irmãs, filhas e viúvas uns dos outros, e regularmente trocavam amantes (uma tal Senhora Armstead serviu neste papel ao lorde George Germain; ao seu sobrinho, o duque de Dorset; ao lorde Derby; ao príncipe de Wales e a Charles James Fox, com quem viria a casar), nomeavam-se uns aos outros em posições de autoridade e asseguravam uns aos outros posições e aposentadorias”. (145) Soa familiar? Com duques e lordes a menos, patotas semelhantes empurram o mundo para o desastre nas mais variadas circunstâncias.

Tuchman nos traz uma análise detalhada dos seis papas que conseguiram, entre 1470 e 1530, e sempre em nome dos mais sagrados ideais, se comportar de maneira tão corrupta e indecente, que liquidaram o imenso poder que a instituição representava, abriram portas escancaradas para a reforma protestante e para as sucessivas guerras das religiões. Não eram inconscientes. Mas tinham gerado uma dinâmica que não permitia a volta. Como se os grandes erros buscassem justificativas em erros ainda maiores. Voltar atrás significaria admitir demasiados erros para que fosse possível. Constitui-se um processo irreversível de autodestruição.

Particularmente interessante é a análise detalhada de como se montou e manteve durante décadas uma narrativa completamente surrealista que justificaria o aprofundamento do envolvimento dos EUA na guerra do Vietnã. Com o fim da II Guerra Mundial, a França queria retomar o seu papel colonial neste país. Levaram uma surra homérica na batalha de Dien-Bien-Phu, apesar do apoio aéreo norte-americano. Mas tinha sentido os americanos se envolverem numa guerra pela manutenção de um poder colonial francês na Ásia? Como parlamentares bem informados fizeram discursos, em público, explicitando aos colegas e aos cidadãos que se o Vietnã ganhasse a guerra, os Estados Unidos se veriam “irremediavelmente cercados”!! Quando os franceses, depois da surra, se tornaram mais sábios e voltaram para a França, repassaram a bola para os americanos, que nunca conseguiram se desvencilhar da herança – até que levassem eles também uma surra, décadas e milhões de mortos depois.

As grandes burradas exigem grandes narrativas, que de tanto repetidas acabam sendo aceitas até por quem as inventa. É tão agradável poder se justificar de forma simples e compreensível para si e para os outros. Imaginar que países asiáticos como Vietnã, Laos, Cambodia, Tailândia e outros fossem pedras de dominó, caindo uma cairiam as outras, aparece hoje como ridículo. No entanto, tantos acreditaram, e em particular os americanos. “Confundir vários países da Ásia do Leste como se não tivessem individualidade, nem história, nem diferenças ou circunstâncias próprias foi o pensamento – desinformado, superficial ou ainda conscientemente falso – que criou a teoria do dominó, e permitiu que se tornasse dogma. Porque os orientais no conjunto pareciam tão semelhantes aos olhos dos ocidentais, esperava-se que agissem de forma idêntica e atuassem com a uniformidade de dominós.” (271) Algum americano conhecia os séculos de lutas do Vietnã por sua independência relativamente aos vizinhos? Os GIs que desembarcavam em Saigon não falavam nem francês, nem vietnamita. O racismo implícito nesta visão do “perigo amarelo” teve sem dúvida um papel importante. (296)

A autora usa um conceito rico, cognitive dissonance, que poderíamos traduzir como dissonância cognitiva, em que o conjunto da narrativa criada se mantém apesar de os fatos a desmentirem de maneira escandalosa. Entre a realidade e a narrativa, dane-se a realidade. “Para o governante é mais fácil, uma vez que entrou num casulo político (a policy box), permanecer dentro dele. Para um político em nível hierárquico inferior é melhor, para o bem da sua posição, não gerar marolas, não pressionar com evidências que o chefe acharia penoso aceitar. Os psicólogos chamam esse processo de filtrar evidências discordantes de ‘dissonância cognitiva’, uma forma fantasiosa para o acadêmico dizer ‘não me confundam com fatos’.” (322) Em outros termos, o apego aos erros torna-se mais rígido. Como é possível que com mais de 1,5 milhões de toneladas de bombas, mais do que na II Guerra Mundial, os vietnamitas não se convencem que devem negociar? Mais bombas! (367)

Tuchman, claramente, não tem muita confiança na lógica do poder ou na inteligência dos grupos que o manejam. “A ausência de pensamento inteligente no exercício do poder é outro dado universal, que levanta a questão de a que ponto, nos Estados modernos, há algo na vida política e burocrática que reduz o funcionamento do intelecto em favor de ‘manejar as alavancas’ sem considerar as expectativas racionais. Isso parece ser uma prospectiva que se mantêm.” (398) A filosofia que permeia os escritos de Barbara Tuchman resulta sem dúvida dos seus próprios estudos da História, mas o seu ceticismo relativamente ao exercício do poder tem raízes mais antigas. A autora lembra Platão: “Ele também teve de aceitar que os seus colegas humanos estavam ancorados na vida de sentimentos, agitados como bonecos pelos fios dos desejos e medos que os fazem dançar. Quando o desejo não está de acordo com o julgamento da razão, disse ele, há uma doença na alma. E quando a alma se opõe ao conhecimento, ou opinião ou razão que são as suas leis naturais, isso eu chamo de insensatez.” (404)

Uma belíssima leitura. Boa tradução em português, disponível por exemplo em Estante Virtual.

*Ladislau Dowbor é professor de economia nas pós-graduações em economia e em administração da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e consultor de várias agências das Nações Unidas. Seus artigos estão disponíveis online em http://dowbor.org

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