Praia, 19 fev (Lusa) - A
Federação dos Jornalistas de Língua Portuguesa (FJLP) notou hoje que o Código
de Ética aprovado pela rádio e televisão públicas cabo-verdianas contém
"um conjunto de medidas de censura", considerando que "não se
concebe num Estado democrático de direito".
Numa carta enviada à Associação
Sindical dos Jornalistas de Cabo Verde (AJOC) e ao Conselho de Administração da
Radiotelevisão Cabo-verdiana (RTC), a FJLP indicou que tomou conhecimento que
as empresas públicas aprovaram, em assembleia geral, no dia 15 de fevereiro, o
seu Código de Ética e de Conduta, a ser cumprido pelos trabalhadores, inclusive
jornalistas.
"O referido Código da RTC,
ao contrário do que se propaga como justificativa da criação, ou seja, para
incentivar nos profissionais uma postura de responsabilidade ético-profissional
conducente, de forma a tranquilizar o público sobre o cumprimento da função
social de mediador independente e responsável, se reveste de um conjunto de
medidas de censura que não se concebe em um Estado democrático de direito", lê-se na
nota da FJLP.
Na missiva assinada pelo
presidente da direção, Alcimir António do Carmo, os jornalistas lusófonos
consideram que o Código de Ética da RTC "ignora que a profissão [de
jornalista] se paute, essencialmente, pelo princípio constitucional de
liberdade de expressão e de opinião".
"Nenhuma corporação pode
exigir que seu funcionário/empregado repercuta e/ou conjugue em sua vida
particular/privada os seus conceitos da administração do veículo,
independentemente do âmbito (credo religioso, privado, público, coletivo ou
personal)", entendeu a FJLP.
O órgão considera que a empresa,
seja ela pública ou privada, pode ter as suas regras administrativas, mas
"devem limitar-se às relações laborais" e de condições técnicas de
exercício profissional.
"A RTC em seu arrazoado de
regras chega à absurda e delirante proposta de que este código pretende ser um
guia orientador para que saibam exatamente o que a sua empresa espera deles em
termos de conduta e preveni-los sobre possíveis conflitos de interesse,
inclusive resultantes da sua atuação nas redes sociais", prosseguiu a
FJLP.
A Federação dos Jornalistas de
Língua Portuguesa considerou que é preciso que sejam tomadas medidas que
impeçam que "regras restritivas da liberdade de expressão e de imprensa,
típicas de regimes de exceção e ditaduras, possam viger sequem um único
dia".
A FJLP congrega como membros
filiados representações de jornalistas de todos os países e comunidades de
língua portuguesa, nomeadamente Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau,
Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor Leste e, ainda, Macau (China)
e Goa (Índia).
O órgão internacional tem sede
administrativa no Brasil e que em setembro próximo passará a ser dirigida pela
Associação Sindical dos Jornalistas de Cabo Verde (AJOC), por um período de
quatro anos.
No ano passado, a proposta de um
Código de Ética da RTC foi contestada pelos jornalistas, que a consideraram
atentatória das liberdades individuais, e levou a tutela a pedir entendimento
entre as partes.
Perante a contestação, o Conselho
de Administração da RTC sublinhou que se tratava de uma proposta que estava na
sua primeira fase "de socialização" junto dos trabalhadores para a
recolha de contribuições.
A RTC disse ainda que o texto foi
elaborado com base num estudo comparativo entre os códigos de ética das
"mais prestigiadas empresas de comunicação social", incluindo a BBC,
New York Times ou RTP, e negou qualquer intenção de "perseguir, limitar ou
ferir a liberdade dos trabalhadores da empresa".
Na altura, o ministro da Cultura
e Indústrias Criativas, Abraão Vicente, que tutela a comunicação social, pediu
diálogo e entendimento entre as partes, adiantando que o Código de Ética a
aprovar não podia representar um retrocesso em relação aos ganhos conseguidos
pelos jornalistas.
Entre outras questões, o
documento defendia que os jornalistas e apresentadores da RTC não devem expressar
publicamente posições políticas, devem separar as páginas pessoais e
profissionais nas redes sociais e ao seguirem a página de um partido político
nas redes sociais, têm que seguir as de todos os demais partidos
cabo-verdianos.
O código recomendava ainda que,
salvo com autorização expressa do Conselho de Administração, os trabalhadores
não podem ser parentes de subordinados diretos ou indiretos.
RYPE (CFF) // VM
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