quarta-feira, 24 de abril de 2019

Brasil | STJ abre caminho para saída de Lula da prisão


Lula está preso há um ano

Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça decide manter condenação, mas reduz pena aplicada no caso do tríplex no Guarujá. Progressão para semiaberto ainda depende de petista não acumular novas condenações.

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, nesta terça-feira (23/04) manter a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex no Guarujá, mas reduziu um quarto da pena, abrindo a possibilidade de que o petista venha a progredir para o regime semiaberto (quando o preso pode deixar a prisão durante o dia) já a partir de setembro deste ano, após cumprir um ano e meio de prisão. 

Essa possibilidade, no entanto, vai depender de que o petista não acumule novas condenações na segunda instância e do pagamento da multa devida no caso do tríplex. Lula é réu em oito ações penais. Já a multa fixada pelo STJ hoje no caso do tríplex é de 2,4 milhões de reais - equivalente ao valor do apartamento. 



O STJ julgou um recurso apresentado pela defesa do petista. Nesta terça-feira, todos os quatro ministros que participaram do julgamento do recurso do ex-presidente votaram tanto pela manutenção da condenação quanto pela redução da pena. Com a nova decisão, a pena de Lula, que havia sido fixada em 12 anos e um mês em regime fechado na segunda instância, passa a ser de 8 anos, 10 meses e 20 dias. Lula foi preso em abril de 2018, poucos meses depois da sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex ter sido confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4º Região. 

A nova pena estipulada pelo STJ é menor daquela imposta em 2017 pelo ex-juiz Sérgio Moro na primeira instância, que havia sido de nove anos e seis meses de prisão. O STJ também reduziu substancialmente o valor a ser pago pelo ex-presidente no caso, que passou de 29 milhões de reais para 2,4 milhões. Originalmente, os 16 milhões, corrigidos, ultrapassavam 30 milhões de reais.

Inicialmente, a defesa de Lula havia apresentado ao STJ um pedido de anulação da condenação no caso, argumentando uma suposta falta de imparcialidade de Sérgio Moro, que deixou a magistratura para assumir um ministério do governo Bolsonaro; a ausência de prova pericial no processo; e a falta de competência da Justiça Federal no caso, seguindo o entendimento do STF de que casos que tenham conexão com crimes eleitorais devem ser enviados à Justiça Eleitoral. 

Só que o histórico do STJ não contava a favor do ex-presidente, já que entre 2015 e 2017 os ministros do Tribunal só votaram pela absolvição de réus em 0,62% dos recursos julgados. No final, os ministros Felix Fischer (relator do recurso), Jorge Mussi, Reynaldo Soares e Marcelo Navarro Ribeiro Danta negaram os pedidos da defesa, reafirmando a competência de Moro e da Justiça Federal no caso. 

O quinto ministro que compõe a Quinta Turma do STJ, Joel Paciornik, declarou-se impedido de participar do julgamento - o advogado dele também defende a Petrobras, empresa relacionada ao caso de Lula. 

Mesmo não conseguido a anulação da condenação ou que o caso fosse transferido para a Justiça Eleitoral, a decisão desta terça-feira abriu a possibilidade de melhorar a situação do ex-presidente. A legislação brasileira estabelece que presos que cumpriram um sexto da pena possam progredir para o regime semiaberto ou até mesmo passarem a cumprir prisão domiciliar, quando não um houver um estabelecimento adequado para o cumprimento do semiaberto. A possibilidade de que o ex-presidente cumpra a pena em casa vai depender da juíza Carolina Lebbos, responsável pela execução da pena do ex-petista. 

Com a condenação original de 12 anos e um mês, Lula, que tem 73 anos, só teria essa possibilidade depois de cumprir dois anos de pena em regime fechado. Agora, ele pode vir a passar para o semiaberto depois de cumprir 17 meses de pena. Como ela já cumpriu pouco mais de 12 meses de prisão, o prazo para requerer o regime semiaberto passaria para meados de setembro deste ano. 

Isso, no entanto, vai depender de que o petista não venha a ser condenado mais uma vez em segunda instância. Em janeiro, Lula acumulou mais uma condenação na primeira instância, desta vez no caso do sítio em Atibaia, com pena de 12 anos e 10 meses de prisão. O recurso do caso ainda não começou a tramitar no Tribunal Regional da 4ª Região. Caso essa mesma pena seja confirmada, o prazo para a progressão do regime será estendido até pelo menos 2021, e Lula dependerá de alguma decisão favorável do STF para deixar o regime fechado. Se o petista já estiver no semiaberto caso o TRF-4 confirme a sentença no processo do sítio, Lula ainda poderá voltar para a prisão. 

Essa eventual progressão também vai depender do pagamento da multa impostas na condenação do caso do tríplex, que passou a ser de 2,4 milhões de reais, de acordo com a decisão dos ministros. Num lance irônico, a legislação que prevê que condenados por corrupção só passem para o regime semiaberto após o pagamento das multas foi sancionada pelo próprio Lula em 2003.

Apesar da manutenção da condenação ter sido levemente atenuada pela redução da pena, a decisão desta terça-feira tem um potencial impacto negativo para o ex-presidente. O STF ainda deve julgar a jurisprudência que autorizou em 2016 que condenados em segunda instância passem a cumprir pena em regime fechado. O tema tem gerado conflitos no Supremo e alimentado a pressão da opinião pública pela sua manutenção. Nos últimos meses, tem crescido entre os ministros do STF a possibilidade de uma solução intermediária, permitindo que os presos cumpram a pena em regime fechado após a confirmação da condenação em uma instância superior, como o STJ. 

Com o resultado desta terça-feira, Lula não será mais beneficiado caso a maioria dos ministros STF siga esse entendimento. No entanto, uma eventual decisão nesse sentido pode atenuar os efeitos de uma eventual nova condenação em segunda instância do ex-presidente e reforçar a possibilidade de que ele passe para o semiaberto ainda este ano. 

A condenação

Em julho de 2017, o ex-presidente foi condenado em primeira instância, pelo então juiz Sérgio Moro, a nove anos e seis meses de prisão, no âmbito da Operação Lava Jato. Na sentença, Moro entendeu que Lula foi beneficiário de propina paga pela empreiteira OAS em troca de contratos com a Petrobras. Esses valores, que somam mais de 3,7 milhões de reais, não foram pagos em espécie, mas por meio da compra e reforma de um apartamento no Guarujá, segundo o juiz.

O ex-presidente sempre negou a prática de ilegalidades e alega não ser dono da propriedade investigada. Em janeiro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmou em segunda instância a decisão e aumentou a pena para 12 anos e um mês de prisão.

A votação desta terça-feira marcou a primeira vez que um tribunal superior analisou o mérito da condenação de Lula. Até o momento, o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) haviam analisado e rejeitado somente pedidos de soltura apresentados pela defesa do petista, sem entrar no mérito do processo que o condenou. Não cabe ao tribunal reanalisar provas, mas sim avaliar se as provas foram consideradas de acordo com o que estabelecem o Código Penal e o Código de Processo Penal.

Lula está preso desde 7 de abril de 2018, na carceragem da Polícia Federal (PF) em Curitiba. Em fevereiro deste ano, o ex-presidente foi novamente condenado a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro na ação penal sobre as reformas realizadas num sítio em Atibaia, no interior de São Paulo. A condenação foi em primeira instância, e, portanto, a pena ainda não está sendo cumprida.

Ao todo, Lula enfrenta oito ações penais – contando os dois casos em que já foi condenado e que aguardam recurso – e mais duas denúncias criminais. A denúncia mais recente foi apresentada em dezembro, e envolve acusação de que o ex-presidente recebeu 1 milhão de reais para intermediar negócios entre o governo da Guiné Equatorial e uma construtora brasileira.

Em março deste ano, foi a vez de Lula ser indiciado pela PF por suspeita de tráfico de influência e lavagem de dinheiro no âmbito da investigação que apura repasses milionários da empreiteira Odebrecht para a empresa de um de seus filhos.

Jean-Philip Struck | Deutsche Welle

Sem comentários:

Mais lidas da semana