Lula está preso há um ano
Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça decide manter condenação, mas reduz pena aplicada no caso do tríplex
no Guarujá. Progressão para semiaberto ainda depende de petista não acumular
novas condenações.
A Quinta Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, nesta terça-feira (23/04)
manter a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do
tríplex no Guarujá, mas reduziu um quarto da pena, abrindo a possibilidade de
que o petista venha a progredir para o regime semiaberto (quando o preso pode
deixar a prisão durante o dia) já a partir de setembro deste ano, após cumprir
um ano e meio de prisão.
Essa possibilidade, no entanto,
vai depender de que o petista não acumule novas condenações na segunda
instância e do pagamento da multa devida no caso do tríplex. Lula é réu em oito
ações penais. Já a multa fixada pelo STJ hoje no caso do tríplex é de 2,4
milhões de reais - equivalente ao valor do apartamento.
O STJ julgou um recurso
apresentado pela defesa do petista. Nesta terça-feira, todos os quatro
ministros que participaram do julgamento do recurso do ex-presidente votaram
tanto pela manutenção da condenação quanto pela redução da pena. Com a nova
decisão, a pena de Lula, que havia sido fixada em 12 anos e um mês em regime
fechado na segunda instância, passa a ser de 8 anos, 10 meses e 20 dias. Lula
foi preso em abril de 2018, poucos meses depois da sua condenação por corrupção
e lavagem de dinheiro no caso do tríplex ter sido confirmada pelo Tribunal
Regional Federal da 4º Região.
A nova pena estipulada pelo STJ é
menor daquela imposta em 2017 pelo ex-juiz Sérgio Moro na primeira instância,
que havia sido de nove anos e seis meses de prisão. O STJ também reduziu
substancialmente o valor a ser pago pelo ex-presidente no caso, que passou de
29 milhões de reais para 2,4 milhões. Originalmente, os 16 milhões,
corrigidos, ultrapassavam 30 milhões de reais.
Inicialmente, a defesa de Lula
havia apresentado ao STJ um pedido de anulação da condenação no caso,
argumentando uma suposta falta de imparcialidade de Sérgio Moro, que deixou a
magistratura para assumir um ministério do governo Bolsonaro; a ausência de prova
pericial no processo; e a falta de competência da Justiça Federal no caso,
seguindo o entendimento do STF de que casos que tenham conexão com crimes
eleitorais devem ser enviados à Justiça Eleitoral.
Só que o histórico do STJ não
contava a favor do ex-presidente, já que entre 2015 e 2017 os ministros do
Tribunal só votaram pela absolvição de réus em 0,62% dos recursos julgados. No
final, os ministros Felix Fischer (relator do recurso), Jorge Mussi, Reynaldo
Soares e Marcelo Navarro Ribeiro Danta negaram os pedidos da defesa,
reafirmando a competência de Moro e da Justiça Federal no caso.
O quinto ministro que compõe a
Quinta Turma do STJ, Joel Paciornik, declarou-se impedido de participar do
julgamento - o advogado dele também defende a Petrobras, empresa relacionada ao
caso de Lula.
Mesmo não conseguido a anulação
da condenação ou que o caso fosse transferido para a Justiça Eleitoral, a
decisão desta terça-feira abriu a possibilidade de melhorar a situação do
ex-presidente. A legislação brasileira estabelece que presos que cumpriram um
sexto da pena possam progredir para o regime semiaberto ou até mesmo passarem a
cumprir prisão domiciliar, quando não um houver um estabelecimento adequado
para o cumprimento do semiaberto. A possibilidade de que o ex-presidente cumpra
a pena em casa vai depender da juíza Carolina Lebbos, responsável pela execução
da pena do ex-petista.
Com a condenação original de 12
anos e um mês, Lula, que tem 73 anos, só teria essa possibilidade depois de
cumprir dois anos de pena em regime fechado. Agora, ele pode vir a passar para
o semiaberto depois de cumprir 17 meses de pena. Como ela já cumpriu pouco mais
de 12 meses de prisão, o prazo para requerer o regime semiaberto passaria para
meados de setembro deste ano.
Isso, no entanto, vai depender de
que o petista não venha a ser condenado mais uma vez em segunda instância. Em
janeiro, Lula acumulou mais uma condenação na primeira instância, desta vez no
caso do sítio em Atibaia, com pena de 12 anos e 10 meses de prisão. O recurso do
caso ainda não começou a tramitar no Tribunal Regional da 4ª Região. Caso essa
mesma pena seja confirmada, o prazo para a progressão do regime será estendido
até pelo menos 2021, e Lula dependerá de alguma decisão favorável do STF para
deixar o regime fechado. Se o petista já estiver no semiaberto caso o TRF-4
confirme a sentença no processo do sítio, Lula ainda poderá voltar para a
prisão.
Essa eventual progressão também
vai depender do pagamento da multa impostas na condenação do caso do tríplex,
que passou a ser de 2,4 milhões de reais, de acordo com a decisão dos
ministros. Num lance irônico, a legislação que prevê que
condenados por corrupção só passem para o regime semiaberto após o pagamento
das multas foi sancionada pelo próprio Lula em 2003.
Apesar da manutenção da
condenação ter sido levemente atenuada pela redução da pena, a decisão desta
terça-feira tem um potencial impacto negativo para o ex-presidente. O STF ainda
deve julgar a jurisprudência que autorizou em 2016 que condenados em segunda instância
passem a cumprir pena em regime fechado. O tema tem gerado conflitos no Supremo
e alimentado a pressão da opinião pública pela sua manutenção. Nos últimos
meses, tem crescido entre os ministros do STF a possibilidade de uma solução
intermediária, permitindo que os presos cumpram a pena em regime fechado após a
confirmação da condenação em uma instância superior, como o STJ.
Com o resultado desta
terça-feira, Lula não será mais beneficiado caso a maioria dos ministros STF
siga esse entendimento. No entanto, uma eventual decisão nesse sentido pode
atenuar os efeitos de uma eventual nova condenação em segunda instância do
ex-presidente e reforçar a possibilidade de que ele passe para o semiaberto
ainda este ano.
A condenação
Em julho de 2017, o ex-presidente
foi condenado em primeira instância, pelo então juiz Sérgio Moro, a nove anos e
seis meses de prisão, no âmbito da Operação Lava Jato. Na sentença, Moro
entendeu que Lula foi beneficiário de propina paga pela empreiteira OAS em
troca de contratos com a Petrobras. Esses valores, que somam mais de 3,7
milhões de reais, não foram pagos em espécie, mas por meio da compra e reforma
de um apartamento no Guarujá, segundo o juiz.
O ex-presidente sempre negou a
prática de ilegalidades e alega não ser dono da propriedade investigada. Em
janeiro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4)
confirmou em segunda instância a decisão e aumentou a pena para 12 anos e um
mês de prisão.
A votação desta terça-feira
marcou a primeira vez que um tribunal superior analisou o mérito da condenação
de Lula. Até o momento, o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) haviam
analisado e rejeitado somente pedidos de soltura apresentados pela defesa do
petista, sem entrar no mérito do processo que o condenou. Não cabe ao tribunal
reanalisar provas, mas sim avaliar se as provas foram consideradas de acordo
com o que estabelecem o Código Penal e o Código de Processo Penal.
Lula está preso
desde 7 de abril de 2018, na carceragem da Polícia Federal (PF) em Curitiba. Em
fevereiro deste ano, o ex-presidente foi novamente
condenado a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de
dinheiro na ação penal sobre as reformas realizadas num sítio em Atibaia, no
interior de São Paulo. A condenação foi em primeira instância, e, portanto, a
pena ainda não está sendo cumprida.
Ao todo, Lula enfrenta
oito ações penais – contando os dois casos em que já foi condenado e que
aguardam recurso – e mais duas denúncias criminais. A denúncia mais recente foi
apresentada em dezembro, e envolve acusação de que o ex-presidente recebeu 1
milhão de reais para intermediar negócios entre o governo da Guiné Equatorial e
uma construtora brasileira.
Em março deste ano, foi a vez de
Lula ser indiciado pela PF por suspeita de tráfico de influência e lavagem de
dinheiro no âmbito da investigação que apura repasses milionários da
empreiteira Odebrecht para a empresa de um de seus filhos.
Jean-Philip Struck | Deutsche
Welle
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