quarta-feira, 8 de maio de 2019

Angola | O país do petróleo onde falta combustível


Escassez de combustíveis gera filas intermináveis, especulação de preços e falta de transporte. Presidente angolano reuniu-se de emergência com equipa económica e concluiu que "faltou diálogo" por parte da Sonangol.

Os cidadãos começaram a sentir a escassez de combustíveis no domingo (05.05). Passados três dias, a situação tende a piorar, como constatou a DW nalgumas ruas e avenidas de Luanda, onde há pouca circulação de veículos.

No centro e na periferia da capital angolana, há bombas de combustíveis quase vazias, onde só se veem trabalhadores à espera do abastecimento. Nos locais onde há combustíveis, as filas são de perder de vista.

Há quem não consiga abastecer o seu carro, nem mesmo depois de passar horas a fio à espera da sua vez. É o caso do automobilista Francisco José. "A fila que eu ocupei é muito longa e quando chegou a minha vez, o bombeiro disse que não havia gasóleo e eu estou à procura de gasóleo", conta à DW.



Por causa da enchente, o atendimento nas bombas de combustível é difícil. Para além das viaturas e motorizadas que aguardam pelo abastecimento, há também cidadãos com recipientes de 5, 10 e 25 litros na fila. António João, motociclista, mostra-se irritado. "Eles atendem, mas só os de 20 ou 30 bidões e quando pegam nos carros ou motas é só dois ou três. Acho que há aqui negócio", lamenta.

Especulação de preços no mercado informal

Os acusados fazem ouvidos de mercador ao suposto negócio paralelo de combustível. Mas uma coisa é certa: há especulação de preços no mercado informal, diz o mototaxista Precioso Tchinhamu, residente em Luanda. O gasóleo e gasolina custam oficialmente 135 (0,36 euros) e 160 kwanzas (0,43 euros), respetivamente. "Nas ruas a gasolina subiu muito. O litro está a 750 kwanzas (cerca de 2 euros)", conta o taxista.

A especulação de preços não é a única consequência da escassez do produto no mercado. Não há transportes públicos nem táxis nas principais paragens. Para se chegar ao serviço, é o "salve-se quem puder". É assim no período da manhã e no princípio da noite. A quem viaje até em viaturas de mercadoria.

O fornecimento de energia elétrica também já começou a ser afetado. E se o problema não for resolvido a curto prazo, haverá escuridão e produtos básicos como o pão vão subir.

Francisco José não entende como um dos maiores produtores e exportadores de petróleo em África permite uma ruptura de stocks. "Nós somos produtores de petróleo há mais de 40 anos, até agora não conseguimos ter uma refinaria boa e grande para dar resposta a essas preocupações. Estamos há três dias assim e até agora não conseguiram resolver", lamenta este cidadão angolano.

Quem já está parado há dois dias é o motoxista Precioso Tchinhamu, que não sabe como vai completar a conta do patrão. "O patrão está a contar os dias. Assim, vou começar a trabalhar mais tarde para conseguir dinheiro ou fico sem nada."
"Boicote" a João Lourenço?
petrolífera angolana Sonangol aponta a falta de divisas e a dívida com a empresa fornecedora como estando na base da falta de combustíveis em Angola. Esta terça-feira (07.05), o Presidente da República, João Lourenço, chamou a sua equipa económica incluindo a petrolífera estatal Sonangol, para encontrar uma solução para o problema.

Segundo um comunicado da Casa Civil do Presidente, "faltou diálogo e comunicação entre a Sonangol e as diferentes instituições do Estado, o que terá contribuído negativamente no processo de importação de combustível."

A nota acrescenta que já "foram tomadas medidas e mobilizados todos os recursos necessários para a completa estabilização do mercado de abastecimento nos próximos dias." O governo reconhece os constrangimentos criados pela situação e "apela à compreensão dos utentes e da população em geral."

Para o jornalista angolano Ilídio Manuel, há indícios de boicote à governação de João Lourenço. "Esta crise parece ser artificial. Terá sido provocada justamente numa perspetiva de desabonar a imagem da governação do Presidente João Lourenço", diz. "Acho que é um paradoxo que um país que é produtor de petróleo tenha que atravessar ciclicamente essas crises."

Para o analista, das duas uma: "ou há uma crise de gestão por parte nova administração da Sonangol ou há mesmo uma tentativa no sentido de querer sabotar os esforços da nova governação" do Presidente angolano. "Não faz sentido que a própria Sonangol, que no primeiro trimestre apresentou lucro na ordem dos três mil milhões de dólares, um mês depois não tenha dinheiro para pagar combustíveis", argumenta Ilídio Manuel.

Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche Welle

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