PS ainda mais à direita. Pega ou não pega? |
Esta reta final está a mostrar
que o PS vê a “geringonça” como uma camisa de forças da qual se quer ver livre.
Pedro Filipe Soares* | Público
| opinião
A solução política que se
alcançou em 2015 conseguiu um inequívoco reconhecimento popular. Os resultados
das políticas seguidas transformaram o insulto “geringonça” numa palavra
acarinhada pelo país. Os medos ou receios não se tornaram realidade, ficando apenas
para assombrar os partidos de direita. Quatro anos depois, as pessoas fazem um
balanço positivo.
O que pareceria uma benção para o
Partido Socialista, está a transformar-se numa maldição para as ambições de
António Costa. É certo que os últimos quatro anos serviram para fazer esquecer
a governação de Sócrates e permitiram um lifting na imagem que o país
tem do PS. O problema para o primeiro-ministro é que as pessoas reconhecem
neste processo os méritos dos acordos feitos com os partidos de Esquerda e
sabem como seria diferente se o PS tivesse governado sozinho. E esse é o grande
obstáculo aos desejos de maioria absoluta que estão na mente dos dirigentes
socialistas.
Carlos
César foi mais explícito quando pediu uma “maioria clara” para evitar
“exigências excessivas” de eventuais parceiros. Esta formulação é um inequívoco
ataque ao espírito que levou à assinatura dos acordos em 2015. Neste grito pela
autossuficiência do PS está implícita a morte de quaisquer diálogos, concluindo
que acordos são já parte do passado, agora o tempo é de outras modas.
Os métodos de António Costa são
mais subtis, reconheça-se, mas a tática é a mesma. Alerta para eventuais
perigos dos atuais parceiros - até parece debitar os mesmos problemas que
faziam parte da lista com que há quatro anos Cavaco Silva o ameaçou -, para dar
a entender que o futuro só será risonho se o PS tiver o poder absoluto. Para
António Costa a “geringonça” foi chão que já deu uvas, só não lhe toca a
finados porque ela está no coração nacional e isso traria má publicidade em
período eleitoral.
Ao mesmo tempo que afirma que “um
dos fatores distintivos de Portugal no conjunto da Europa é sermos praticamente
uma espécie de aldeia do Astérix da estabilidade”, António Costa alerta para a
instabilidade que os partidos de Esquerda poderão causar (os mesmos que
garantiram durante quatro anos a estabilidade que apregoa). Na banda desenhada,
o grande medo do chefe da aldeia gaulesa é que o céu lhe caia na cabeça. Nesta
aldeia nacional, o grande medo do chefe do executivo parece ser o de não ter
todo o poder, daí esta incongruência. As juras de amor à “geringonça” parecem
ser promessas de traição futura.
Até o discurso do diabo parece
agora ressurgir, cavalgando o primeiro-ministro os prenúncios de uma crise
internacional para cumprir o objetivo habitual: difundir o medo para tornar as
pessoas menos exigentes e menos reivindicativas. Mais um golpe no espírito da
solução política iniciada em 2015, pois a primeira vitória que se conseguiu foi
quando a esperança nas novas políticas venceu o medo de quem defendia a
austeridade. E até chega a faltar à verdade quando diz que, no que toca à forma
de gerir o enorme problema da dívida pública, não seria possível ter acordo com
os partidos à Esquerda. Ora, isso até foi conseguido no Grupo de Trabalho que o
Bloco de Esquerda teve com o PS, o governo é que não quis aplicar aquilo que o
próprio PS assinou.
Ainda precisa de mais exemplos
para aceitar que a agulha mudou? Há um que é lapidar: perguntaram a António
Costa quem era o seu maior adversário, se o PSD ou o Bloco de Esquerda, e o
primeiro-ministro fugiu à pergunta. Um dos parceiros passou rapidamente a
adversário porque se coloca como o grande entrave a essa maioria absoluta.
Esta reta final está a mostrar
que o PS vê a “geringonça” como uma camisa de forças da qual se quer ver livre.
Não gostou de ter de negociar com os partidos à Esquerda para aumentar salários
e pensões, combater a precariedade ou redistribuir melhor a riqueza? Será
dessas medidas de justiça na economia que quer fugir para a maioria absoluta?
O que vale é que, em democracia,
não são os políticos que escolhem os vencedores, é o povo que decide em quem
vai votar. Assim foi em 2015 e assim será agora.
O autor escreve segundo o novo
acordo ortográfico
*Presidente do Grupo Parlamentar
do Bloco de Esquerda
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