Em cúpula no Panamá, Pequim
consolida presença na região. Enquanto economias latino-americanas parecem ter
aprendido a tirar proveito disso, elas se tornam cada vez mais dependentes do
comércio com o país asiático.
A cúpula comercial China-América
Latina e Caribe ocorre desde 2007, e a edição de 2019 acaba de terminar na
Cidade do Panamá. Com esse misto de feira de negócios e reunião de cúpula, a
China quer promover a cooperação econômica com os países da América Latina e do
Caribe. As edições anteriores ocorreram no Chile, Colômbia, Peru, Costa Rica,
México e Uruguai e testemunharam o forte interesse da China pela América
Latina.
Recentemente, Nayib Bukele,
presidente de El Salvador, foi recebido em Pequim como "chefe de Estado de
importância internacional" e ficou satisfeito por receber apoio financeiro
para projetos de infraestrutura – sem obrigação de reembolsá-los. Durante a
visita de Estado, Bukele disse que seu país usará o presente do presidente Xi
Jinping "para construir um novo estádio de futebol, uma nova biblioteca
nacional e uma estação de tratamento de água, entre outras coias".
"Não é novo que a China
tenha boas relações comerciais com quase todos os países da região. Mas tem
laços particularmente estreitos com países que exportam matérias-primas para a
China, como Chile, Equador, Peru, Brasil e Argentina", afirma Margaret
Myers, especialista em relações Ásia-América Latina do think tank Diálogo
Interamericano, com sede em Washington.
A presença chinesa em projetos de
infraestrutura na América Latina e no Caribe está se tornando cada vez
mais abrangente. Segundo o Diálogo Interamericano, empresas e bancos chineses
têm até agora "interesse em cerca de 150 projetos no setor de transportes
e já assinaram contratos para alguns deles".
O comércio entre a América Latina
e a China mudou nos últimos anos. "Os latino-americanos passaram da compra
de brinquedos de plástico chineses para a compra de ferrovias, ônibus, redes de
telecomunicações e alta tecnologia para portos marítimos para melhorar sua
infraestrutura", conta Myers. Esse é um desenvolvimento que a China
impulsionou com sua Nova Rota da Seda, uma rede global de estradas, ferrovias e
vias marítimas.
Mas a visão da China sobre a
América Latina também mudou, afirma a analista. "Há três anos, a China não
só considerou os países como parceiros comerciais regionais, mas também como
parte de um conceito econômico global, já que Pequim chegou à conclusão de que
precisa responder mais de perto às necessidades e interesses desses países."
Esse
desenvolvimento, naturalmente, preocupa Washington. De acordo com Myers,
os latino-americanos fizeram um bom número de equilibrismo porque queriam
manter boas relações tanto com os Estados Unidos como com a China. Em alguns
casos, os países da América Latina poderiam até mesmo se beneficiar da
guerra comercial entre EUA e China.
"Embora a imposição
recíproca de tarifas tenha tido impacto sobre as moedas de alguns países, o
México, por exemplo, se beneficiou do fato de que algumas empresas se
estabeleceram no país por medo de tarifas adicionais", acrescenta a
especialista.
Latinos caíram na "armadilha
da dívida"?
Desde 2005, os bancos chineses
emprestaram mais de 141 bilhões de dólares a países e empresas estatais da
América Latina e do Caribe. A questão é a seguinte: quais concessões tinham que
ser feitas para os países receberem empréstimos mais baratos? Os
latino-americanos caíram numa "armadilha da dívida" chinesa,
como aconteceu anteriormente com alguns países africanos?
"Nos últimos três anos, a
China quase não concedeu grandes empréstimos à região",
sublinha Myers, que também não vê sinais de uma "armadilha da
dívida". "De todos os países da região que receberam empréstimos
da China, como Equador, Argentina, Brasil e Venezuela, só este último teve um problema
grave."
Mesmo a Venezuela não parece
estar em risco de perder o controle. Apesar dos empréstimos de cerca de 67
bilhões de dólares concedidos por Pequim aos regimes de Hugo Chávez e Nicolás
Maduro desde 2007, Caracas tem hoje uma dívida de "somente" 20
bilhões de dólares com Pequim, e a paga com petróleo bruto.
A obrigatoriedade de vender o
próprio petróleo à China para pagar as dívidas também pode, no entanto, ser
considerada como uma "armadilha da dívida". Em entrevista à BBC,
Kevin Koenig, da organização ambiental Amazon Watch, afirmou que o Equador deve
abandonar a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) em 2020 para
poder aumentar sua produção de petróleo e, assim, liquidar sua dívida de
cerca de 14 bilhões de dólares com a China.
Myers tem outra opinião: "Eu
não estou certa se Pequim tem consultores em Quito que dizem ao presidente
Lenín Moreno que ele tem que deixar a Opep." Afinal de contas, cada país
decide por si próprio como quer cumprir com as suas obrigações financeiras. A
única coisa certa é que "as economias da América Latina estão cada vez
mais dependentes do comércio com a China".
José Ospina-Valencia (fc) |
Deutsche Welle
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