Parlamento húngaro aprova uma
série de leis antidemocráticas visando calar e limitar ainda mais a oposição. É
preciso não se iludir a respeito de Viktor Orbán, opina o correspondente da DW
Keno Verseck.
Há pouco, talvez nada, que seja
mais importante para o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, do que ser o
real número um no poder e no Estado. Por isso, ele considera as derrotas
eleitorais como algo muito pessoal. Após a eleição de 2002, em que perdeu surpreendentemente,
Orbán disse uma de suas frases mais famosas: "A pátria não pode estar na
oposição!"
Pátria, nesse caso, significava
seu partido, seus eleitores e acima de tudo, ele próprio. Em seus círculos mais
próximos, diz-se que a derrota o atingiu traumaticamente, mergulhando-o numa
crise pessoal. Consta também que ele jurou a si próprio fazer todo o possível
para, caso se tornasse novamente chefe de governo, impossibilitar a própria
saída do poder.
Agora isso aconteceu novamente:
pela primeira vez em 13 anos, Orbán sofreu uma derrota eleitoral. Em outubro, o
partido Fidesz de Orbán perdeu as eleições locais de forma inesperada e
sensível. Embora tenha conseguido manter sua base eleitoral genérica e tenha se
saído bem principalmente nas áreas rurais, a perda de votos em muitas das
principais cidades do país, incluindo Budapeste, foi de grande importância
simbólica. Pois o sistema Orbán, com seus numerosos e pequenos mecanismos para
paralisar a oposição, era considerado praticamente impossível de derrotar.
Pôde-se perceber o quanto a derrota doeu no premiê, que antes da eleição
desdenhara bastante da oposição, tachando-a de "chorona".
Agora Orbán contra-ataca, para
imunizar ainda mais a si mesmo e a seu sistema, intitulado "Ordem da
Cooperação Nacional", contra a perda de poder. Uma expressão disso são as
novas disposições legais que o Parlamento Húngaro está aprovando neste início
de dezembro. Elas variam de restrição à formação de bancadas partidárias no
Parlamento, passando por maiores opções de controle no setor cultural até novos
cortes na soberania fiscal dos municípios. Particularmente drásticos são os
novos regulamentos sobre possíveis infrações administrativas de membros do
Parlamento durante as sessões. São tão amplos e dão ao presidente do Parlamento
tanto poder e tantas opções de sanções financeiras, que ele pode praticamente
amordaçar a oposição.
E isso num Parlamento que, após
alterações em seu regulamento interno nos anos 2013 e 2014, se tornou, em
grande parte, uma mera máquina de votação, onde o papel da oposição é
praticamente decorativo. O presidente László Kövér, um propagandista de teorias
de conspiração extremistas de direita, quase não deixa passar uma oportunidade
de punir parlamentares da oposição e jornalistas atuantes no Parlamento.
O premiê da Hungria vinha se
comportando de maneira relativamente moderada nos últimos meses. A principal
razão é que ele queria garantir para seu país o cargo de comissário da
Ampliação da UE, um dos postos de mais repercussão pública da Comissão Europeia,
que lhe dá muita margem de manobra em sua política para os Bálcãs Ocidentais e
em seu apoio aos líderes autoritários da região. Nessa manobra, Orbán teve
sucesso.
Desde o dia em que Olivér
Várhelyi foi confirmado como novo comissário para Ampliação da UE, Orbán
reativou sua metralhadora giratória: contra o bilionário Soros, contra a
sociedade civil e a oposição, contra o Ocidente moralmente decadente e liberal,
com palavras ou com leis. Isso mostra novamente que não é recomendável
nutrirem-se ilusões a respeito de Orbán: a transformação antidemocrática da
Hungria continuará; Orbán empurrará ainda mais os limites de sua
pseudodemocracia em direção a um sistema autoritário e ditatorial.
A apreciação de Orbán pela UE e
seus valores fundamentais fica evidente quando se vê o Parlamento da Hungria
ser degradado mais uma vez justamente nesta terça-feira, quando Bruxelas debate
sobre os procedimentos disciplinares contra a Hungria por violações do Estado
de direito, segundo o Artigo 7º do Tratado da União Europeia.
Keno Verseck (md) | Deutsche
Welle | opinião
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