Quando o aumento extraordinário
das pensões ou possíveis aumentos salariais são «riscos de desvio» para as
contas públicas, mas mais dinheiro para o Novo Banco é uma decorrência do
acordo de capitalização.
AbrilAbril | editorial
Não é nova – mas nem por isso
deve deixar de ser sinalizada sempre que surge – a visão dicotómica entre
políticas que são vistas como «riscos de desvio» para as contas públicas
(como o investimento nas funções sociais do Estado), em contraponto com as «prementes
necessidades financeiras» de acudir à banca privada.
O Conselho das Finanças Públicas
(CFP) vem juntar-se, sem surpresas, ao rol daqueles que entendem ser
preocupantes medidas que representam «aumento da despesa» na proposta de
Orçamento do Estado (OE) para 2020.
É já recorrente a análise de
diferentes instituições – como a Comissão Europeia (CE) ou agora o CFP – que
optam por se alhear do impacto social e económico de determinadas políticas
necessárias para as populações e o interesse nacional, privilegiando
uma visão economicista que beneficia os mesmos de sempre.
É que o juízo, puramente
numérico, não se estende a outras dimensões da «despesa pública», como acontece
com os casos em que se chama o Estado a salvar a banca privada.
É essa a lógica subjacente à
análise divulgada esta terça-feira pelo CFP, que entende que a «evolução
programada da despesa» apresenta desvios de «despesa primária líquida de
medidas discricionárias e de medidas temporárias e não recorrentes».
É uma «ajudinha» aos puxões de
orelhas que a CE já deu ao País, agora pela voz do CFP, que vê no OE para 2020
«um risco de desvio face ao cumprimento das regras comunitárias tal como
reflectidas na mais recente Recomendação do Conselho da União Europeia».
Mas, se esse raciocínio se aplica
a mais investimento público em infra-estruturas ou serviços públicos, no mesmo
documento do CFP admite-se que pode haver a necessidade de mais injecção de
capital no Novo Banco do que aquela que vem prevista na proposta de OE para
2020, «dadas as obrigações decorrentes do Acordo de Capitalização Contingente
daquela instituição bancária».
É só mais um episódio que ilustra
as opções políticas de quem profere determinadas análises. Aqueles que
apoiaram a venda de 75% do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star, em
2017, na qual se acordou a possibilidade de se vir a injectar 3,89 mil milhões
de euros no Novo Banco até 2026 (só em 2017 e 2018, este banco já recebeu 1941
milhões de euros...), são os mesmos que vêem como «desvios na
despesa» políticas de maior justiça fiscal – taxando mais o capital e
menos os trabalhadores –, a eliminação das propinas ou o fim da precariedade na
Administração Pública.
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