José Gameiro | Expresso | opinião
Se é verdade que vivemos num
mundo cada vez mais volátil, nunca, na minha geração, vivemos um período de
tanta incerteza.
Sempre fomos diferentes na forma
de gerir o incerto. Uns conviviam bem com isto, até gostavam, outros planeavam
a vida e sentiam-se inseguros, se não soubessem o que iria ser o dia de amanhã.
Mas não nos podemos esquecer os que, sem o quererem, sempre viveram na
incerteza económica e na precariedade.
Desta vez a incerteza é bem mais
grave. Apesar das estatísticas, não conseguimos deixar de pensar que podemos
morrer ou perder os nossos familiares mais velhos.
Alguns ficaram surpreendidos com
a reação, em geral, calma dos portugueses, perante uma ameaça que é sentida
como terrível. Mais tarde a sociologia poderá explicar esta aparente e paradoxal
resposta, mas há uma explicação que pode já ser dada. Perante um inimigo comum
as pessoas unem-se, ajudam-se, conseguem fazer humor e, muito importante,
confiam nas autoridades.
Mas a incerteza também atinge
quem é responsável. A própria Ministra da Saúde – temos a sorte de ter uma
Ministra cheia de energia e muito empática -o reconheceu e bem. Cito uma frase,
inúmeras vezes dita, “no estado actual do conhecimento o que se deve
fazer é isto”.
Tivémos a “felicidade” de termos
sido atingidos, depois de já haver algum conhecimento da epidemia e termos
visto os resultados negativos, dos atrasos com que as medidas mais radicais,
foram implementadas noutros países ocidentais. Por razões politicas e também
opiniões divergentes dos meus colegas infeciologistas e epidemiologistas penso
que nos atrasámos uns dias nas medidas que foram tomadas.
As repercussões económicas vão
ser terríveis, mas mais uma vez e sempre, de forma desigual. Vão ser os mais
pobres, sem almofadas financeiras, a sofrer na pele uma crise prolongada, sem
dó nem piedade. Vai haver muito oportunismo, faltas de pagamento com a desculpa
da crise, despedimentos em empresas que podem ter prejuízo, mas de quem, nem os
sócios, nem os acionistas prescindem do seu bem estar económico. Vamos assistir
aos bancos pedirem ajudas, justificáveis e injustificáveis.
Mas nesta fase o mais importante
é a conduta de cada um de nós. Proteger-se e proteger os outros, saber bem
distinguir quarentena e isolamento social. Não entrar em radicalismos
higienistas. Tenho sido criticado porque disse nas televisões que, quem está
bem, pode fazer marcha ou corrida na rua, longe dos outros. Mantenho tudo o que
disse, as próprias medidas do Governo assim o dizem. Acrescento que, mesmo para
os mais velhos, que sejam saudáveis, um passeio é muito importante, para a
saúde mental e para não correrem o risco das atrofias musculares.
Mesmo numa crise destas haverá
sempre vozes que criticam tudo e todos.
Alguns encontraram uma “brecha”
para criticar o PR, foi uma oportunidade de criticar alguém que tem uma enorme
popularidade. Dou-lhe inteira razão na atitude de isolamento que decidiu. Só
ele e mais ninguém teve a capacidade e o conhecimento de avaliar os contactos
suspeitos que teve. E decidiu em conformidade. Alguns comentadores não têm a
noção do ridículo quando o criticam por nos ter falado por Skype de má
qualidade.
Vamos esperar pelos números dos
próximos dias.
Deixo um conselho, se me é
permitido. A equipa da saúde pode e deve ouvir os técnicos, mas não pode ser
seguidista.
Sigam alguns exemplos da aviação.
Alguns acidentes podiam ter sido evitados se os pilotos não tivessem seguido à
risca todos os procedimentos. Por vezes é preciso arriscar e fazer diferente....
Sem comentários:
Enviar um comentário