Umaro Sissoco Embaló anunciou o
fim da ocupação militar às instalações do Estado na Guiné-Bissau. Rede de
mulheres pede afastamento das Forças Armadas da arena política.
As portas dos edifícios das
principais instituições do Estado da Guiné-Bissau reabriram nesta quarta-feira
(04.03). Os militares abandonaram os edifícios, permitindo a retoma dos
trabalhos, anunciou Umaro Sissoco Embaló. No entanto, registou-se uma fraca afluência
dos funcionários públicos. Está em curso uma greve na Função Pública.
Sissoco Embaló, que
preside à Guiné-Bissau, foi entretanto ao Palácio do Governo para abrir a
primeira reunião do Conselho de Ministros do Governo liderado por Nuno Gomes
Nabiam.
Sanções
Vários eurodeputados socialistas
pediram, na terça-feira, ao chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, para
considerar aplicar sanções contra todos os que prejudiquem a estabilidade da
Guiné-Bissau. No entanto, Sissoco Embaló disse à porta da reunião
do Conselho de Ministros que não tem medo de possíveis sanções,
desvalorizando ainda a posição tomada pela maioria da comunidade internacional,
que pede que se aguarde a decisão do Supremo Tribunal da Justiça sobre o
contencioso eleitoral.
"A Guiné-Bissau não faz
parte da comunidade europeia. Somos apenas parceiros da União Europeia. Os
deputados da Guiné-Bissau também podem escrever uma carta ao Comissário dos
Assuntos Políticos da União Africana para pedir sanções a qualquer outro membro
da União Europeia. Para mim, esse assunto é extemporâneo", comentou Embaló
em declarações aos jornalistas.
"Eu ganhei as eleições,
e agora sanções ao Presidente da República? A Guiné-Bissau deixou de ser
república das bananas", acrescentou.
"Fui eleito pelos
guineenses"
Sissoco recusou-se a comentar a
decisão da Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO), de não
reconhecer qualquer organismo criado fora do quadro legal.
"Eu não fui eleito pelo povo
senegalês, angolano, português, francês ou chinês. Fui eleito pelos guineenses.
Eu sou Presidente da Guiné-Bissau", frisou.
Antes de participar no Conselho
de Ministros, o candidato dado como vencedor das presidenciais pela Comissão
Nacional de Eleições (CNE) reuniu-se com o líder sindical Júlio
Mendonça sobre a greve em curso no aparelho de Estado.
À saída do encontro no Palácio da
Presidência da Guiné-Bissau, Mendonça afirmou que a maior central sindical, a
União Nacional dos Trabalhadores da Guiné (UNTG) mantém a paralisação da Função
Pública: "A greve está em curso neste momento. Até quinta-feira, iremos
tomar mais posições."
"Apenas fizemos questão de
entregar ao Presidente o memorando de entendimento que assinámos com o Governo
e o pré-aviso que já tínhamos entregue ao Governo. De momento, não há nada de
concreto e estamos à espera de quem tem a competência e atribuição legais para
negociar connosco", disse.
A greve abrange todos os setores
da vida pública da Guiné-Bissau, com maior destaque nos da saúde e educação.
Órgãos públicos a meio gás
Entretanto, a Rádio Nacional e a
televisão pública TGB retomaram as emissões, depois de serem silenciadas
pelos militares.
À DW África, o diretor-geral da
TGB, Catouplin da Costa, confirmou a reabertura da emissão, embora a meio
gás: "Na verdade, temos o sinal no ar a pôr a música, porque os
trabalhadores não estão aqui em plenitude. Temos menos de dois terços dos
trabalhadores, quase meia dúzia. Vamos aguardar, talvez amanhã tenhamos mais
gente."
Mulheres pedem militares fora do
campo político
Soldados das Forças Armadas
ocuparam as instituições públicas desde terça-feira, depois da tomada de posse
de Umaro Sissoco Embaló como Presidente. O Governo que resultou das
eleições legislativas de 10 de março, liderado pelo
primeiro-ministro Aristides Gomes e entretanto demitido por Umaro Sissoco
Embaló, considera a ação dos militares como sendo um golpe
de Estado.
A presidente da rede para a
paz e segurança das mulheres no espaço da África Ocidental da Guiné-Bissau,
Elisa Pinto, está preocupada com a crise pós-eleitoral.
"A rede manifesta a sua
indignação face à atual situação política institucional que assola o país,
apela aos políticos a velarem pelo respeito à Constituição da República e às
demais leis e exorta as forças de defesa, no sentido de se manterem
equidistantes aos jogos políticos e continuarem a garantir a integridade
territorial", afirma Pinto.
Ainda exorta ainda a comunidade
internacional a intensificar as suas ações para encontrar "uma solução
rápida para a crise vigente", apelando ainda à população
para manter a calma e serenidade, em defesa da paz e da não violência,
preservando a unidade e a irmandade nacional.
CEDEAO pode ser parte do problema
Na mesma senda, o líder do
Partido da Unidade Nacional (PUN), Idriça Djaló, entregou nesta quarta-feira
uma carta à representação da CEDEAO
em Bissau.
"Pedi à CEDEAO para
encontrar soluções justas e democráticas pelo respeito pelo Estado democrático
na Guiné-Bissau. Não estamos do lado de nenhum dos candidatos, acho que é o
mínimo que se possa pedir à CEDEAO. Não é admissível negociar o Estado de
direito democrático, o que seria uma tragédia para o país", disse Djaló em
entrevista à DW África.
O político sublinhou que, apesar
dos apoios dados à organização das legislativas e das presidenciais, a CEDEAO
"não avaliou convenientemente as derrapagens que acompanharam as eleições,
nem assinalou a gravidade dos atentados ao jogo democrático, nomeadamente as
interferências de países vizinhos ou a afluência massiva de dinheiro de
proveniência duvidosa".
"Como deverá ser do seu
conhecimento, o nosso país está gangrenado pelo narcotráfico e o dinheiro sujo
é reciclado em momentos de embate político desvirtuando os equilíbrios e
bloqueando toda e qualquer possibilidade de uma verdadeira alternativa ao atual
sistema", salientou.
Segundo o líder do PUN, depois do
anúncio provisório dos resultados eleitorais pela CNE, os comunicados da CEDEAO
"não só não acalmam a situação, como não apresentam
solução". Idrissa Djaló considerou mesmo "tristes" os
comunicados da organização, que pedem ao Supremo Tribunal de Justiça e à CNE
"para colaborarem".
"Estas duas instituições não
podem ser postas no mesmo patamar", afirmou, salientando que a
Constituição da Guiné-Bissau define claramente a hierarquia jurídica e o papel
e competências da CNE, que está obrigada a cumprir com as decisões do Supremo
Tribunal de Justiça em matéria eleitoral.
ONU apela à contenção
A partir de Nova Iorque, o
secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, apelou às partes em
conflito político na Guiné-Bissau para que aguardem a decisão do Supremo
Tribunal de Justiça, pedindo "máxima contenção".
Também a França
apelou às forças de defesa e segurança da Guiné-Bissau para que se
mantenham "fora da vida política" do país, pendido contenção e
respeito às partes em conflito político para que se resolva o impasse eleitoral.
Braima Darame | Deutsche Welle
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