Pedro Ivo Carvalho* |
Jornal de Notícias | opinião
Esfriar. Não é fácil manter a
cabeça fria quando somos salpicados a toda a hora pelas vagas de um mar em
chamas. Não é fácil convocar a razão quando a guerra que travamos não está nos
manuais de boa governança. Mas é isso que esperamos dos líderes. Mesmo que não
enverguem capa nem tenham poderes sobrenaturais.
É fundamental que a gestão desta
pandemia seja feita de uma forma transparente, mas sobretudo recorrendo a uma
linguagem clara, sem equívocos e sentidos contraditórios. As várias versões
sobre o número de testes de despistagem de que o país dispõe e/ou precisa e as
diferentes interpretações sobre os ventiladores que tem e vai adquirir não
contribuem para a serenidade necessária. Já para não falar na contabilidade
desencontrada sobre o número de mortos e os dados concelhios. Nesta fase,
exigimos apenas o óbvio: quando não há certezas, mais vale estarem calados.
Liderar. Atacar uma epidemia
global de forma isolada é como querer segurar o vento com as mãos. Neste
particular, a Europa está novamente à deriva, permitindo não apenas que impere
a lei do mais forte no ataque à doença - florescem histórias de estados-rapina
que tentam resgatar máscaras e ventiladores a países "concorrentes" -
, como condenando à morte, pela inércia, qualquer tentativa de resposta
concertada à violenta crise económica que se espera. A paralisia europeia só
não é amadorismo porque, quando se trata de agitar a batuta da austeridade para
fazer cumprir os pactos orçamentais, Bruxelas encontra sempre forma de convocar
o espírito da União.
Disparatar. O país parou.
Vivemos em estado de emergência. Há doentes infetados todos os dias. Há doentes
que morrem todos os dias. Milhões de portugueses estão confinados em casa, tudo
em nós está do avesso. Ainda assim, o presidente do Parlamento (segunda figura
do Estado) e um deputado do PSD enredaram-se num debate quixotesco sobre se
deviam estar no hemiciclo a discutir o que fazer no momento mais dramático da
história recente do país ou se deviam tê-lo feito noutro lugar, para evitar
contágios. Folhetim que acabou com Rui Rio a abandonar a bancada do PSD, à qual
passou um tremendo raspanete por ter gente a mais nas cadeiras. Quando não há
adultos na sala, o problema não é a sala.
*Diretor-adjunto
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