Perder o seu melhor cientista e
ser forçada a uma humilhante reviravolta no Covid-19 revela quão fraca e inútil
é realmente a UE
A pandemia tem tido alguns
efeitos úteis. Um deles é ter tornado mais evidente o que é e para que serve a
UE. Toda a forma como a Comissão Europeia tem actuado tem não apenas deixado
claro o que vale o dito “projecto europeu” como deixou à vista como a burocracia
de Bruxelas é avessa a qualquer intromissão na sua prepotente cadeia de
comando. A demissão do Prof. Mauro Ferrari da presidência da Comissão Europeia
de Investigação é exemplar nesse aspecto.
Pela bitola de qualquer um
Bruxelas teve 24 horas catastróficas. A cortina caiu, dando-nos um raro
vislumbre da tóxica mistura política de carreirismo e arrogância que atinge o
próprio coração da UE como, vamos lá, um vírus.
A saída ontem à tarde do principal
cientista da Europa, Mauro Ferrari, do seu cargo de presidente da Comissão
Europeia de Investigação (ERC) já é suficientemente má. Mas as mil palavras da
sua declaração ao Financial Times não apenas foram uma avaliação fulminante das
políticas nos mais altos escalões do poder europeu, como a sua oportunidade não
poderia ter sido pior.
Mauro Ferrari, que apenas ocupava
o cargo desde o início deste ano, claramente não é um sujeito com quem se deva
brincar, e quando confrontado com carreiristas, tanto políticos como
administrativos, não estava preparado para compromissos acerca do que via como
a melhor forma de lidar com a pandemia.
Na sua declaração Ferrari
afirmou: “Peço que me perdoem, mas acredito que a prioridade de agora é deter a
pandemia. A prioridade é salvar possivelmente milhões de vidas. Tem precedência
sobre carreiras, políticas e até sobre a beleza da certeza científica.”
Temos de nos interrogar acerca da mentalidade por detrás da decisão de nomear Ferrari para um cargo em que, embora lhe tenha sido atribuído um orçamento anual de € 2 milhares de milhões (US $ 2,2 milhares de milhões), ninguém estava preparado para dar ouvidos ao seu aconselhamento científico.
Disse o professor: “Pensei que
num momento como este deveriam ser proporcionados aos melhores cientistas do
mundo recursos e oportunidades para combater a pandemia, com novos
medicamentos, novas vacinas, novas ferramentas de diagnóstico, novas abordagens
comportamentais dinâmicas baseadas em ciência, para substituir as frequentemente
improvisadas intuições dos líderes políticos”.
Caramba, estava a trabalhar para
a engrenagem errada. O próprio comité científico da Comissão, tendo lidado com
sucesso com - vamos lá contá-las - zero pandemias em sua história, decidiu que
o chefe do CEI estava lá para fornecer ideias científicas “a partir da base”, e
não para qualquer tipo de liderança “a partir de cima”.
Não se pode deixar de apreciar a
absurda e medíocre balbúrdia administrativa que prevalece em Bruxelas.
Mas havia ainda mais.
De forma humilhante para a CE, a
demissão da Ferrari ocorreu apenas algumas horas depois de esta ter sido
forçada a dar uma volta completa ao seu grande plano de desenvolver uma via
para os países membros abandonarem suas estratégias de confinamento, por entre
sinais contraditórios sobre se a propagação do vírus Covid-19 está ou não a
diminuir.
Primeiro, havia a manchete de um
meio de comunicação: “A Comissão Europeia vai revelar a estratégia para sair do
confinamento do vírus”, onde era anunciado que a Presidente da Comissão, Ursula
von der Leyen, planeava desenvolver uma estratégia visando um alívio coordenado
das medidas restritivas actualmente em vigor na maior parte da Europa.
Screeeeech! O som dos travões
fortemente metidos veio momentos depois, conforme foi relatado em outro lugar
por Politico: “Bruxelas retira o plano de saída do confinamento perante a fúria
das capitais”, graças principalmente a Itália e Espanha, onde milhares de
pessoas morreram, que deixaram claro que acreditavam na Comissão estava a
mover-se com demasiada pressa.
Entretanto, Dinamarca, Áustria e
República Checa estavam a deslocar-se em contra-mão sugerindo que poderiam
suspender as restrições de deslocação já na próxima semana.
Com uma tão clara discordância
visível sobre uma parte tão fundamental da estratégia para lidar com o
coronavírus, até mesmo um cientista pioneiro (em nanociência) com conhecimento
e experiência, à frente da principal instituição científica da Europa, iria
deparar-se com uma batalha para ser ouvido por cima do clamor político.
Portanto, Prof. Ferrari, au
revoir. Está agora nos EUA, onde planeia criar um grupo internacional de
investigação para empreender a batalha contra o Covid-19.
Interrogo-me se terá melhor sorte
com Donald Trump.
*Fonte:
https://www.rt.com/op-ed/485297-scientist-covid-eu-brussels-weak/
Na imagem: Mauro Ferrari
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