sexta-feira, 10 de abril de 2020

Pandemia poderá alterar hábitos culturais na China “que levam séculos a mudar”


A possível origem do surto epidémico provocado pelo novo tipo de coronavírus suscitou um debate mundial sobre o consumo e venda de animais selvagens. 

Albano Martins, presidente da ANIMA, vê na proibição temporária do consumo e venda de animais selvagens na China uma oportunidade para Pequim dar um exemplo ao mundo, mas Fátima Galvão, chefe da Associação para os Cães de Rua e o Bem-Estar Animal em Macau (MASDAW), mostrou-se mais céptica. Já José Tavares assinalou que o consumo de animais selvagens em Macau decresceu nos últimos anos e que o surto epidémico poderá acelerar esta tendência.

A proibição temporária da venda e consumo de animais selvagens na China poderá abrir caminho a uma interdição definitiva deste hábito após a pandemia mundial provocada pelo Covid-19, afirmou Albano Martins, presidente da ANIMA, acrescentando que a comunidade internacional “está à espera que a China tome essa medida”. Já Fátima Galvão, presidente da Associação para os Cães de Rua e o Bem-Estar Animal em Macau, mostrou-se mais céptica perante “uma mudança de hábitos culturais que levam séculos a mudar”. José Tavares, presidente do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), assinalou que o consumo de animais selvagens em Macau tem decrescido muito nos últimos anos e que o Covid-19 poderá “acelerar” esta tendência.


Apesar de haver dúvidas na comunidade científica quanto à origem da pandemia provocada pelo Covid-19, o Governo chinês proibiu, temporariamente, a venda e o consumo de animais selvagens na China. “A questão está ao nível do Governo Central que, para já, parou este tipo de actividades, mas a seguir provavelmente haverá um término definitivo”, considera Albano Martins, indicando que a comunidade internacional está muito atenta às medidas implementadas por Pequim. “Toda a gente a nível mundial está à espera que a China tome essa medida de proibir definitivamente a venda e o consumo de animais selvagens, e penso que, politicamente, seria inteligente por parte da China tomar essa medida”, afirmou Albano Martins, frisando que, “aos olhos do mundo”, o surto epidémico teve início na província de Hubei. 

“Os chineses vão ter de demonstrar que, de facto, estão a tentar evitar que situações deste tipo possam aparecer. É dever moral do Estado chinês impedir que situações deste tipo voltem a acontecer, e se acontecerem uma vez, podem acontecer duas, três ou quatro vezes. Portanto, têm que eliminar a fonte que provocou esse tipo de problema”, reforçou o presidente da ANIMA, considerando que a decisão da China poderá servir de exemplo a outros países asiáticos como a Indonésia e o Vietname, que também têm hábitos de consumo de animais selvagens.

Na opinião de Fátima Galvão, presidente da MASDAW, o surto epidémico suscitou algum debate sobre o consumo de animais selvagens na China, mas defendeu que o tema “vai passar ao lado da maioria da população” porque não é “uma prioridade para o Governo chinês travar o consumo de animais selvagens”. “Estamos a falar de uma mudança de hábitos culturais que levam séculos a mudar, não vai ser o Covid-19 que vai mudar a mentalidade de ninguém a nível mundial”, frisou Fátima Galvão, acrescentando que os maiores mercados para os caçadores ilegais de animais em África “são a China e o Vietname, autênticos negócios milionários”.

Já José Tavares, garantiu que o consumo de animais selvagens em Macau decresceu nos últimos 20 anos, e assumiu que o surto epidémico até poderá acelerar esta tendência. O presidente do IAM reforçou que há uma lei em vigor que proíbe o consumo de animais como o ‘Paguma Larvata’ e que há um controlo apertado na alfândega para travar o contrabando de animais selvagens. “O consumo de animais selvagens em Macau tem decrescido porque as pessoas têm consciência de que não se deve consumir esse tipo de animais, para além de haver uma lei para a protecção de certos animais. Ao logo dos últimos anos, as pessoas têm muito cuidado com aquilo que consomem, já não é como antigamente, há 20 ou 30 anos, em que comiam cão e gatos”, começou por dizer José Tavares.

“Até a sopa de barbatana de tubarão já não é servida nos hotéis. Isto é uma tendência. Creio que, com o Covid-19, isto veio apressar mais esse decrescimento. Eu julgo, na minha perspectiva, que isto é uma tendência para decrescer”, assinalou ainda o presidente do IAM.

Mercados sem pessoal suficiente para controlar os acessos

O presidente do IAM assumiu que a falta de pessoal para controlar todos os acessos aos mercados de Macau poderá ter levado à concentração de muitas pessoas em determinadas zonas de comércio e frisou que as autoridades também estão dependentes do civismo das pessoas para o cumprimento das regras. “Tentamos fazer o nosso melhor possível, porque também contamos com os meios que temos. E cada mercado tem a sua tipologia diferente. O Mercado Vermelho tem oito entradas, ou seis entradas, o Mercado de Iao Hon tem mais do que isso. Cada mercado tem a sua tipologia. E para controlar o acesso, nada é fácil. E temos tentado restringir acessos. Porque não temos pessoal suficiente para controlar todos os acessos”, começou por dizer José Tavares, quando questionado sobre uma situação presenciada pelo PONTO FINAL no Mercado Municipal de São Lourenço, no fim-de-semana passado, em que os seguranças não conseguiam efectuar correctamente os controlos de temperatura devido à enorme afluência de pessoas ao local. “Há certas afluências em certos pórticos onde há mais pessoas porque fechámos algumas e daí que as pessoas concentram-se noutras. Peço alguma paciência e a sensibilidade às pessoas no sentido de respeitar as normas. Têm de ter a declaração antes da entrada para mostrar rapidamente ao controlo e respeitar as regras da medição da temperatura. Isto tem de ser o próprio civismo das pessoas para podermos fazer bem as nossas tarefas. Só a nossa parte é difícil sem contar com a colaboração das pessoas”, afirmou Tavares.

Eduardo Santiago | Ponto Final (China - Macau) | Imagem: Eduardo Martins

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