segunda-feira, 4 de maio de 2020

Porto | PUBLICIDADE CARA E ENGANOSA


Rui Sá* | Jornal de Notícias | opinião

Rui Moreira fez sair, na semana passada, em diversos jornais e como publicidade paga, anúncios ocupando páginas inteiras com loas à situação financeira do município sob o título "Câmara Municipal do Porto com contas que lhe permitem enfrentar a pandemia".

É naturalmente discutível que, independentemente da boa situação financeira do município, se gastem tantos milhares de euros neste ato de propaganda que não se insere, por muito que nos queiram fazer crer, na desejável "prestação de contas aos munícipes".

Mas o que me choca nestes anúncios é a tentativa de falsificação da verdadeira razão do atual estado das contas e, particularmente, do saldo de gerência resultante de 2019 (98 milhões de euros). Diz Rui Moreira que "é este saldo histórico, que tantas vezes foi diabolizado, que nos permite, agora, sem um imediato sobressalto, enfrentar a crise". O que é uma falácia! Se não vejamos (com linguagem que pode não ser rigorosa contabilisticamente, mas que toda a gente entende): pelas regras da contabilidade das autarquias, os orçamentos municipais têm de dar saldo zero, ou seja, as receitas e as despesas têm de ser iguais. Portanto, se há um saldo de gerência, ou seja, se no final do ano há "lucro", isso só pode significar que: arrecadou-se mais receita do que o previsto, mantendo-se a despesa; ou fez-se menos despesa mantendo-se a receita prevista.

Desde que Rui Moreira é presidente da Câmara, o que tem acontecido é sempre a segunda opção, ou seja, nunca a Câmara consegue executar a despesa a que se propõe no início do ano - e que em 2019 correspondeu aos tais 98 milhões de euros, o que representa cerca de 30% da despesa orçamentada. Dir-me-ão que isso pode corresponder a uma melhor gestão, que faz com que, com menos custos, tenhamos ganhos de eficiência. Infelizmente não é isso que acontece, dado que as despesas correntes (recursos humanos e restantes custos de estrutura) cumprem o orçamentado. O busílis é sempre nas despesas de capital, ou seja, nos investimentos, que nunca são cumpridos. Por manifesta incompetência, apesar da existência de seis empresas municipais, sempre apresentadas como modelo de profissionalização e de agilização, a verdade é que nunca Rui Moreira e a sua maioria conseguem cumprir o que se propõem fazer!...

Portanto, não é por termos "boas contas" que sobra dinheiro para fazermos face à pandemia! Nem sequer foi por capacidade de previsão (em dezembro, ninguém sonhava com o que aí vinha...). É, isso sim, por a Câmara não conseguir, por consecutiva "falta de arte e engenho", fazer os investimentos a que se tinha proposto. Bem sei que muitos eram mera propaganda e outros erros profundos, mas a verdade é que essa é a razão de sobrarem 98 milhões de euros, que agora podem ser gastos noutras coisas - e fico à espera de saber em que condições...

*Engenheiro

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