Mariana Mortágua |
Jornal de Notícias | opinião
Segundo a Anacom (entidade
reguladora das telecomunicações), entre o final de 2009 e abril de 2020, os
preços das telecomunicações em Portugal aumentaram 7,7%, enquanto na Europa
diminuíram 10,4%. Estes aumentos colocam as telecomunicações no nosso país
entre as mais caras da UE.
Mas não são apenas os preços que
dão má fama ao setor. Como tantas pessoas já tiveram oportunidade de
experienciar, nomeadamente quando se viram enredadas em contratos de
fidelização muito caros, pouco claros e impossíveis de cancelar, a qualidade
dos serviços destas empresas é lamentável. Só numa semana, entre 25 de abril e
1 de maio, foram apresentadas 1825 reclamações sobre serviços de comunicações.
Dessas, 64% dizem respeito a comunicações eletrónicas e, em particular, à
gestão dos contratos e cancelamento de serviços a clientes. Entre janeiro e
abril, a Anacom apresentou coimas no valor 1,3 milhões de euros associadas a 57
processos de contraordenação, que se juntam a várias condenações passadas,
muitas delas contestadas pelas maiores operadoras do mercado.
Foi já em plena pandemia que o
presidente de uma destas operadoras respondeu ao plano do Governo de criar uma
tarifa social da internet (semelhante à tarifa social da energia suportada pela
EDP) destinada a pessoas com menores rendimentos: "Se concordamos que seja
imposto algo sobre os nossos ativos, construídos com o nosso investimento?
Claro que não". Trata-se do presidente da Altice, que ficou com os ativos
da Portugal Telecom: uma empresa que já foi pública e se tornou dona de
rentáveis concessões do Estado, antes de ter sido destruída nas jogadas dos
seus acionistas privados. Já depois da operação de compra da Portugal Telecom,
a Altice foi acusada pela Anacom de se aproveitar, através da sua subsidiária
Fibroglobal, da exploração das redes de fibra construídas nas zonas rurais...
pagas com fundos públicos.
Haveria mais a dizer sobre estas
empresas de telecomunicações que insistem em provar, uma e outra vez, que a
privatização de setores estratégicos e infraestruturas monopolistas foi
prejudicial aos interesses dos consumidores. Outras, como a Amazon, a Google ou
o Facebook já encheram páginas e páginas de notícias sobre abusos laborais,
fuga ao Fisco e venda de dados pessoais.
O que junta todas estas empresas
neste artigo? O facto de todas terem sido objeto de um louvor formal, publicado
em "Diário da República", por parte do Secretário de Estado para a
Transição Digital, André de Azevedo, em reconhecimento pelo seu enorme
contributo no combate à pandemia, pelo seu "excecional sentido do dever e
permanente disponibilidade para o serviço público".
*Deputada do BE
Nota PG:
André de Aragão Azevedo vai ser
secretário de Estado da Transição Digital. Uma nova pasta no Ministério da
Economia que adota também o nome de Ministério da Economia e da Transição
Digital. A escolha recaiu sobre um gestor que estava, desde 2012, na
Microsoft Portugal, onde ingressou depois de ter passado pelo Ministério da
Saúde, como chefe de gabinete no período, entre 2008 e 2011, em que era Ana
Jorge a ministra da tutela, no governo de José Sócrates. Saiu do ministério e
passados uns meses integrou a Microsoft.
- em Jornal de Negócios
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