terça-feira, 25 de agosto de 2020

Incêndio no Canal de Moçambique: "Atentado à liberdade de imprensa"


Esta é a reação do Sindicato Nacional dos Jornalistas moçambicanos ao incêndio que deflagrou, no domingo, os escritórios do semanário Canal de Moçambique, em Maputo. Sociedade civil e a oposição também se manifestaram.

O editor do jornal Canal de Moçambique não tem duvidas: o incêndio que destruiu os escritórios do Canal de Moçambique, na noite deste domingo (23.08), em Maputo, é mão criminosa.

Em entrevista à DW África, esta segunda-feira, Matias Guente relatou que os autores deste incidente arrombaram as portas e, com recurso a uma bomba artesanal, incendiaram a redação e outros compartimentos.

"Após terem arrombado a porta, introduziram lá bombas artesanais e recipientes de combustíveis. Ou seja, regaram todo o escritório com combustível e quando entras lá dentro tudo exala a combustível", contou.

 
Ameaça aos jornalistas

Para o editor-executivo do Canal de Moçambique, pelas circunstâncias em que ocorreu o  incêndio, trata-se de uma ameaça ao trabalho dos jornalistas. "Para qualquer leigo, este é um atentado terrorista contra a liberdade de expressão e de imprensa, porque nunca vimos na história deste país que tenham queimado os jornais".

Matias Guente considerou ainda que o incêndio corresponde a uma "sequência lógica":  "uns são raptados, outros são partidos pernas e outros são intimidados. Isto está dentro de uma cadeia que agora provavelmente tenham elevado o nível de ameaças".

Todo o material de trabalho do jornal ficou reduzido a cinzas mas a publicação vai sair nesta quarta-feira, garantiu Matias Guente. No entanto, agora a preocupação é com a sua segurança.

"Estamos preocupados, mas não vergamos a estes ataques cobardes e continuamos a fazer o nosso trabalho normal. Há preocupação e muita pressão psicológica, porque entendemos o meio em que estamos a funcionar e não sabemos porque ontem foi atacado o editor, hoje incendiaram os escritórios e não sabemos o próximo passo".

Sindicato exige investigação 

O Sindicato Nacional dos Jornalistas de Moçambique (SNJ) reagiu a este incidente, tendo o secretário-geral, Eduardo Constantino, exigido uma investigação para identificar os autores deste crime.

"Pedimos que os autores sejam identificados, julgados, condenados a indemnizar o Canal de Moçambique pelos prejuízos causados", apelou Constantino.  

O secretário-geral do SNJ mostrou-se agastado com os cenários de intimidação de jornalistas em Moçambique, não só sobre este último incidente, mas também sobre o que esta a acontecer com os que estão a trabalhar em Cabo Delgado.

"Sobre os atentados à liberdade de expressão e de imprensa em Moçambique neste ano, este não é o primeiro. E já houve tantos outros e de fato temos problemas de de impedimento de jornalistas de realizarem os seus trabalhos, isso é um atentado", denunciou o representante sindical dos jornalistas.

O jornal Canal de Moçambique vai temporariamente funcionar embaixo de uma tenda improvisada no pátio do prédio onde estão localizados.

Organizações condenam ataque ao jornal

Entretanto, o Instituto para a Comunicação Social da África Austral - MISA Moçambique condenou esta segunda-feira (24.08) o incêndio que destruiu a redação do semanário moçambicano, classificando-o como "bárbaro e cobarde".

"O MISA Moçambique lamenta profundamente que atos atentatórios contra a liberdade de expressão e contra a liberdade de imprensa aconteçam no país com regularidade, sem que os seus autores e promotores sejam responsabilizados", frisou o instituto através de um comunicado.

Outras organizações da sociedade civil, individualidades e políticos solidarizam-se com a publicação pelo incidente, através de comunicados ou pela presença física. A embaixada norte-americana em Maputo disse que "os danos aparentemente intencionais e extensivos nos escritórios de uma respeitada instituição de meios de comunicação social têm impacto no estado da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa em Moçambique". 

Presidente defende investigação séria

O Presidente Filipe Nyusi também condenou o ataque e avançou que as autoridades foram instruídas para investigar e trazer os autores à "barra da justiça". 

"Condeno veementemente os ataques ao Canal de Moçambique. A Liberdade de Imprensa é um pilar da democracia e conquista dos moçambicanos que deve ser protegida", disse o chefe de Estado moçambicano, numa breve nota divulgada esta segunda-feira na sua página do Facebook.  

Por seu turno, o presidente da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), principal partido da oposição, considerou que o incêndio ao jornal é um "grave ferimento à democracia e ao Estado de Direito". Numa mensagem partilhada na sua página no Facebook, Ossufo Momade disse que "os autores desse crime não devem ficar impunes como sempre".

#Artigo atualizado às 18h06 do Tempo Universal Coordenado

Romeu da Silva (Maputo), Agência Lusa | Deutsche Welle

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