#Publicado em português do Brasil
Tentativa de invasão ao
Parlamento mostra que a direita antidemocrática tem um plano: sua narrativa já
está se infiltrando no centro da sociedade alemã. E notas de repúdio de
políticos não bastam, opina Hans Pfeifer.
Parecia uma ação espontânea e
meio descoordenada: uma multidão rompeu
as barreiras diante do Reichstag, a sede do Parlamento alemão em Berlim,
subiu em disparada pelas escadas e pressionou em direção à entrada do edifício
histórico. Cantava suas palavras de ordem e agitava as bandeiras do
Reich alemão – a bandeira dos antidemocratas.
A "tempestade", porém,
não durou muito. Os manifestantes foram mantidos sob controle por alguns poucos
policiais. Em seguida, a área foi esvaziada. Portanto, não há com o que se
preocupar, certo? Pelo contrário: a extrema direita na Alemanha há tempos vem
perseguindo um plano.
Muitos dos extremistas de direita
modernos têm uma nova virtude: paciência. Eles não tentam com todas as suas
forças ocupar o Reichstag. Eles já ficam satisfeitos com as imagens simbólicas
da tentativa por si só e com as bandeiras de seus apoiadores tremulando.
Isso serve como motivação para
seus apoiadores, e o resto da sociedade rapidamente pensa: "Nada
aconteceu". É exatamente essa impressão que mostra como são incendiários
os planos dos extremistas de direita: eles estão evitando os "erros"
que, nas últimas décadas, serviram como obstáculo à sua ganância por poder e
busca por relevância.
O objetivo principal dos homens e
mulheres em frente ao Reichstag não era realmente ocupar o edifício do
Parlamento. Eles queriam desencadear exatamente o que aconteceu agora: uma
grande onda de indignação. Membros do governo, parlamentares e até mesmo o
presidente da República, Frank-Walter Steinmeier, condenaram nos termos mais
fortes a ação.
É claro que a condenação é
correta. Mas o problema é que as respostas dificilmente refletem o quanto a
indignação calculada se tornou agora parte integrante da estratégia da direita:
nos últimos anos, os provocadores têm usado com frequência esta tática de
alfinetada, por assim dizer. Como resultado, o público está cada vez mais
acostumado a tais incidentes, e as rápidas críticas do mundo político estão se
degenerando em um ritual.
A narrativa da direita está se
infiltrando cada vez com mais sucesso no centro da sociedade. O lema é:
"Os políticos devem antes cuidar dos problemas reais do povo!".
Essa tática de camuflagem dos
pregadores de ódio da direita é tão bem-sucedida que eles podem participar dos
grandes protestos de coronacéticos na Alemanha sem causar grande agitação.
Mesmo que a maioria dos manifestantes não seja apoiadora de suas mensagens,
eles conseguem empurrar os limites do que pode ser dito em sua direção, numa
estratégia calculada.
Mas para onde querem ir os
inimigos da democracia com seu plano? Seu objetivo é uma sociedade racista que
não conhece nenhuma democracia e, portanto, nenhuma liberdade de imprensa. O
que conta é exclusivamente sua própria opinião. Os imigrantes e aqueles que
pensam de maneira diferente seriam tudo, menos bem-vindos neste tipo de
sociedade. Há muito tempo existem modelos para tal política na Europa: na
Polônia ou na Hungria, os inimigos de uma sociedade aberta governam há anos.
E também na Alemanha, os inimigos
de uma sociedade aberta percorreram um longo caminho nos últimos anos. No
sábado eles foram contidos na entrada do Parlamento alemão por policiais – mas
as vozes mais poderosas de suas políticas misantrópicas há muito tempo já entraram
lá.
Desde 2017, o partido Alternativa
para a Alemanha (AfD), em parte de extrema direita, está representado no
Parlamento alemão – com a maior bancada de oposição. Com hostilidades
permanentes contra muçulmanos, imigrantes, opositores políticos, igrejas e
instituições sociais, seus deputados estão minando cada vez mais os valores da
constituição liberal da Alemanha.
Este é o perigo real de tais
ações diante do Reichstag: que cidadãos e cidadãs subestimem sua grande
influência e as consequências perigosas que elas podem ter. Não hoje, não
amanhã – mas depois de amanhã.
Hans Pfeifer | Deutsche Welle |
opinião
*Hans Pfeifer é jornalista da Deutsche Welle. O texto reflete a opinião pessoal do autor, e não necessariamente da DW.
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