Corrupção. Governo quer alargar
período de afastamento de funções de políticos condenados e prazo de prescrição
de crimes
A Estratégia Nacional de Combate
à Corrupção propõe que “o regime da proibição do exercício de função, previsto
no Código Penal, seja alterado no sentido da elevação do limite máximo”. O
documento contempla ainda alterações relativas aos denunciantes, aos
‘megaprocessos’ e ao financiamento partidário, “nomeadamente em relação aos
períodos eleitorais”
Os titulares de cargos políticos
condenados pelo crime de corrupção podem ficar mais tempo impedidos de ser
eleitos ou nomeados, contemplando-se uma pena acessória a somar à pena
principal. Esta é uma das medidas previstas na Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024, cujas
linhas gerais foram apresentadas na semana passada pela ministra da Justiça,
Francisca Van Dunem. O documento, que foi disponibilizado esta segunda-feira,
identifica sete prioridades para reduzir o fenómeno da corrupção em Portugal.
Aquela medida insere-se na quinta
prioridade identificada pelo grupo de trabalho constituído para o efeito:
“garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria
de repressão da corrupção, melhorar o tempo de resposta do sistema judicial e
assegurar a adequação e efetividade da punição”. No documento pode ler-se que
“a adequação e efetividade da punição dos crimes de corrupção implica que o
regime da proibição do exercício de função, previsto no artigo 66.º do Código
Penal, seja alterado no sentido da elevação do limite máximo do período de
proibição do exercício de função”.
Atualmente, segundo o ponto 1 daquele artigo, “o titular de cargo público,
funcionário público ou agente da administração, que, no exercício da atividade
para que foi eleito ou nomeado, cometer crime punido com pena de prisão
superior a três anos, é também proibido do exercício daquelas funções por um
período de dois a cinco anos quando o facto for praticado com flagrante e grave
abuso da função ou com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são
inerentes; revelar indignidade no exercício do cargo; ou implicar a perda da
confiança necessária ao exercício da função”. A proposta do documento
estratégico é alargar o período de proibição de eleição ou nomeação dos titulares
de cargos políticos condenados.
SANÇÕES DISSUASORAS PARA
DIVULGAÇÃO NÃO AUTORIZADA
Ainda no quadro da quinta
prioridade definida e no ponto relativo aos ‘megaprocessos’, o documento refere
que “deve fixar-se como regra a documentação das declarações das testemunhas,
do assistente e das partes civis através de registo áudio ou audiovisual,
registo este acompanhado de uma súmula das matérias sobre as quais incidiram”.
A estratégia prevê igualmente “sanções dissuasoras para a divulgação não
autorizada” e “com violação das regras de proteção de dados pessoais”.
Quanto aos mecanismos de proteção
adequada dos denunciantes, “a denúncia passou a ser um instrumento autónomo de
política criminal contra a criminalidade empresarial em geral e contra a
corrupção em particular”, lê-se ainda na estratégia definida pelo Governo. O
documento contempla igualmente uma alteração ao Código de Processo Penal que
preveja “a possibilidade de celebração de um acordo sobre a pena aplicável, na
fase de julgamento, assente na confissão livre e sem reservas dos factos
imputados ao arguido, independentemente da natureza ou da gravidade do crime
imputado”.
MAIOR EFICIÊNCIA NA PUBLICAÇÃO
DAS CONTAS DOS PARTIDOS
Outras das medidas da estratégia
incluem a promoção de uma publicação mais eficiente das contas dos partidos,
nomeadamente em relação aos períodos eleitorais; o reforço da ação de
fiscalização e responsabilização financeira feita pelo Tribunal de Contas; e o
alargamento a outros crimes do prazo de prescrição de 15 anos, previsto no
artigo 118.º do Código Penal.
A melhoria do conhecimento,
formação e práticas institucionais em matéria de transparência e integridade; a
prevenção e deteção dos riscos de corrupção no sector público; e o
comprometimento do sector privado na prevenção, deteção e repressão da
corrupção são outras das prioridades definidas. Além destas, são fixados como
objetivos prioritários o reforço da articulação entre instituições públicas e
privadas, a produção e divulgação periódica de informação fiável sobre a
corrupção, e a cooperação internacional no seu combate.
O documento foi aprovado na
passada quinta-feira em Conselho de Ministros e poderá ser consultado durante
30 dias, antes de seguir para votação no Parlamento. Na semana passada, a
ministra da Justiça antecipou como uma das medidas propostas a celebração
de acordos sobre a pena aplicável em julgamento, com base na confissão, embora
a ministra negue tratar-se de delação premiada. Francisca Van Dunem
realçou então que a “chave do problema” para enfrentar a corrupção está na
prevenção por se entender que o sistema repressivo, por mais sofisticado que
seja, é “insuficiente para diminuir seriamente o fenómeno”.
Hélder Gomes | Expresso
Na imagem: Ministra da Justiça,
Francisca Van Dunem | José Sena Goulão / Lusa
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