No ano letivo passado, estiveram 561 alunos a aprender fora da escola. Este ano, associação MEL já ajudou 832 famílias
"Já soube o que é ter um filho a prazo e vou fazer tudo para o proteger". Carla Rocha resume, desta forma, a opção de, este ano, passar o filho para ensino doméstico por causa da pandemia. Francisco, de 11 anos, está no 6.º ano, teve leucemia aos três anos e meio e uma pneumonia há dois anos. Está longe de ser caso único. O Movimento Educação Livre (MEL) fez, desde julho e até ontem, 832 atendimentos a pais sobre a mudança para o Ensino Doméstico. No ano passado, incluindo outubro "que costuma ter muitos pedidos", frisa Sílvia Cópio, foram 386. Ou seja, a procura aumentou 115%.
No ano passado estavam inscritos 561 alunos do 1.º ciclo ao secundário. Menos 305 do que há dois anos, revelou ao JN o Ministério da Educação. A tutela não avança os dados deste ano "porque os números ainda estão a ser consolidados".
MEL e Associação
Nacional de Pais
"Tem sido uma loucura, todos os dias recebemos mails de pais a pedirem ajuda", revela Alexandra Nascimento, da ANPED. A pandemia, o terceiro período em casa e a discordância quanto às regras aplicadas pelas escolas são os principais motivos para o disparar da procura, explicam.
"Não tomei esta decisão de ânimo leve. Foi extremamente ponderada", explica Carla, assegurando que a mudança será temporária. No próximo ano, se a pandemia o permitir, Francisco regressará à escola em Sintra. O seu maior receio não é o vírus mas as consequências e lesões da infeção. "Ainda ninguém nos explicou o que acontece a seguir".
O pedido já foi aceite pela escola, mas Carla aguarda a reunião para lhe ser atribuído o professor tutor que os irá acompanhar durante o ano letivo. No ano passado, enquanto as escolas estiveram fechadas, Francisco melhorou as notas. Por exemplo, "antes não sabia pôr os dedos na flauta e terminou o ano a tocar Mozart". O pai toca diversos instrumentos. O confinamento permitiu um maior acompanhamento, explica. "Houve pais que se aperceberam que, em casa, os filhos progrediram mais rapidamente por terem uma atenção mais direcionada e alguns ficaram seduzidos com essa possibilidade, de poderem gerir ritmos de aprendizagem e corresponderem mais aos seus interesses", explica Alexandra Nascimento.
As principais dúvidas dos pais prendem-se com a burocracia, apontam. O diploma em vigor desde o ano passado impõe que um dos pais ou encarregado de educação que viva com o aluno tenha, pelo menos, uma licenciatura. Um requisito, asseguram, que é um constrangimento para muitas famílias. A alternativa é o Ensino Individual mas, neste caso, as famílias têm de contratar um professor que se responsabilize pelo processo de ensino.
O pedido de transferência de matrícula pode ser feito durante o 1.º período. Muitos dos contactos recebidos pelas associações são feitos por pais que discordam do uso de máscaras no 2.º ciclo, da redução dos intervalos e dos alunos passarem demasiadas horas fechados nas salas de aula, com pouca distância entre eles.
Alexandra Inácio | Jornal de Notícias
Imagens: 1 - Francisco está no 6.º ano, teve leucemia aos três anos e meio e uma pneumonia há dois anos. Mãe não o quer expor ao risco - Foto: Paulo Spranger/Global Imagens; 2 - Ilustrativa
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