Mariana Mortágua | Jornal de Notícias
| opinião
Fazer política é escolher que
interesses se defende. André Ventura diz representar "o português
comum", mas na verdade quer proteger os interesses dos ricos que querem
pagar menos impostos.
Em 2018, os 10% mais ricos do
país ganhavam 8,6 vezes o rendimento dos 10% mais pobres. A desigualdade é
enorme, mas é o registo mais baixo de sempre no INE. Sucede que estes dados
escondem outras injustiças. Porque no topo dos 10% mais ricos há quem ganhe,
por mês, o que um trabalhador com o salário mínimo não leva para casa em três
anos de trabalho. É o caso, por exemplo, do presidente do Novo Banco, que
recebe 400 mil euros por ano.
As causas das desigualdades são
muitas. Para a maioria, o contexto social e familiar significa falta de
oportunidades e uma vida presa ao salário mínimo ou pouco mais. Para muitos
jovens licenciados, mil euros é o salário mais frequente, num país em que o
salário médio mais alto de sempre, registado em 2019, foi de 1276 euros
(bruto).
Combater os baixos salários e a
precariedade é uma forma eficaz de reduzir as desigualdades. A outra são os
impostos: quem ganha mais contribui mais, proporcionalmente, para os serviços
públicos que beneficiam todos. Assim, o presidente do Novo Banco paga 161 mil
euros de IRS ao ano (40% do seu rendimento), enquanto o trabalhador que recebe
o salário médio paga 2040 euros (12% do rendimento) 1*. A todos é dada, em
troca, a segurança de saber que terão acesso a cuidados de saúde, escola para
os filhos e apoio social em caso de necessidade. Parece pouco? Nos EUA, onde
não existe um SNS, as dívidas de saúde são a principal causa de falência
pessoal e a maior parte dos jovens estão enredados em empréstimo bancários para
pagar os estudos.
Não faltou na História quem
tentasse acabar com este modelo de Estado social que é a maior conquista dos
trabalhadores contra a selva social e a miséria do século XIX e início do
século XX. Não é por acaso que os serviços públicos são tão atacados por
figuras com Trump, que deu prioridade à redução dos impostos dos mais ricos.
Em Portugal, essa é também a
proposta do partido Chega, que defende uma taxa única de IRS. Com uma taxa
única de 15%, o presidente do Novo Banco pagaria muito menos de metade dos
impostos que hoje paga. Ventura beneficiaria de um desconto de 25% nos impostos
sobre o seu salário de deputado. Já o Estado perderia receitas essenciais à
Saúde e à Educação. Mas é mesmo esse o plano do Chega: no seu programa oficial
está o fim do SNS e a entrega das escolas aos privados. Para os mais ricos, que
poderiam pagar por estes serviços, isso não é um problema. Para o
"português comum", seria o empobrecimento imediato.
Agora, no Parlamento, o advogado
Ventura continua a defender os seus clientes de antes: ricos que não querem
pagar impostos.
1* Simulação simples para
casado com dois dependentes e 50% de deduções em educação e saúde.
*Deputada do BE
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