Vítimas, familiares e especialistas testemunharam no julgamento simbólico dos crimes da missão da ONU (2004-2017). A iniciativa insere-se no contexto de mobilizações anti-imperialistas e pelos direitos.
O chamado Tribunal Popular contra os Crimes da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah) decorreu ao longo desta terça-feira na capital haitiana, Porto Príncipe, visando reforçar a reivindicação de justiça e reparação para as vítimas dos abusos cometidos pelas tropas envolvidas na operação.
A missão da ONU foi liderada pelo Brasil e prolongou-se por 13 anos, entre 2004 e 2017. As críticas e denúncias à sua actuação surgiram ainda nesse período e, três anos volvidos, mantêm-se, da parte da população haitiana, que espera reparação das Nações Unidas, refere a TeleSur.
A iniciativa do tribunal popular, para responsabilizar o organismo internacional, partiu de organizações sociais como a Plataforma Haitiana para o Desenvolvimento Alternativo (Papda), a Rede Nacional em Defesa dos Direitos Humanos, a Comissão Nacional Episcopal de Justiça e Paz, a Plataforma de Organizações de Defesa dos Direitos Humanos.
Entre as violações de direitos referidas pelo tribunal durante a permanência da Minustah no Haiti, contam-se políticas contrárias ao acesso da maioria da população à educação e o aumento da repressão militar sobre manifestações populares.
Também o crescimento de grupos criminosos organizados como milícias, o desrespeito pelos direitos das mulheres e das crianças, o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e outros crimes sexuais, além da cultura de impunidade como marca do poder judicial local.
Denunciar a natureza imperialista da missão
A propósito do tribunal, Camille Chalmers, director executivo da Papda, disse: «Agora, existem milhares de mulheres com filhos sem pai, milhares de órfãos numa situação difícil», tendo referido que a instabilidade política também se agravou no país – algo a que, em seu entender, não é alheia a interferência dos EUA.
Ainda a propósito do tribunal popular, Chalmers afirmou: «Desde o início, levámos a cabo uma campanha para denunciar não só a natureza desta ocupação militar, mas também o perigo e a ameaça que representava para todos os povos do continente, como o presidente [Jovenel Moïse] e muitas formas de ocupação que, sob o pretexto da manutenção da paz, estavam a executar a agenda imperialista dos EUA.»
Mortes por cólera
Uma das questões mais destacadas no que respeita às irregularidades e violações da Minustah foi a propagação da cólera a partir da presença no país de tropas nepalesas, em 2010, que provocou a morte a 10 mil pessoas (números oficiais) e afectou cerca de um milhão. A ONU só reconheceu a responsabilidade em 2016.
«Uma década depois da epidemia de cólera no Haiti, há milhares de famílias que ainda guardam experiências dolorosas», lamentou Camille Chalmers, citado pela Prensa Latina, acrescentando que «muitas casas continuam abandonadas» e que há «zonas devastadas que jamais regressaram à normalidade».
«Além do balanço humano catastrófico, o impacto económico foi terrível, pois muitas pessoas afectadas pela cólera perderam o trabalho e foram discriminadas», denunciou, sublinhando que a epidemia também desorganizou os circuitos de produção agrícola.
AbrilAbril
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