A Guiné-Bissau parece
insanavelmente dividida, a começar uma nova era sem legitimidade
constitucional. Resta saber se os líderes regionais foram cúmplices da quebra
da ordem constitucional no país.
António Rodrigues | Público |
opinião
São muitos os interesses em luta
na Guiné-Bissau e, aparentemente, nenhum deles está relacionado com o povo
guineense. Temos os interesses do PAIGC, que governa o país desde a
independência e agora se comporta como a virgem enganada da política porque a
sua hegemonia está cada vez mais posta em causa. Temos os interesses do
ex-Presidente José Mário Vaz (conhecido por Jomav), sempre disponível para
contrariar Domingos Simões Pereira e o PAIGC com encenações à margem da
Constituição, do Governo e do Parlamento. Temos os interesses de Umaro Sissoco
Embaló que já tinha demonstrado por gestos e palavras os seus tiques
autoritários e que inaugura uma nova era, indo para além da cartilha do seu
antecessor — já não se trata de uma interpretação diferente da Constituição,
mas um completo desrespeito pela sua aplicação e pelas regras do Estado de direito.
Temos os interesses do narcotráfico e de quem no país ganha muito dinheiro com
ele, a quem só serve comprar os dirigentes ou minar as instituições, para
seguir utilizando o país como plataforma giratória entre a América do Sul e a
Europa.
Temos ainda os interesses dos
militares que, a julgar pela presença das suas chefias na cerimónia de posse de
Nuno Nabiam como primeiro-ministro, acham que estão melhor salvaguardados com
Embaló no poder. Temos ainda os interesses dos países da região, a maioria
preferiu não se envolver directamente na tomada de posse encenada por Embaló,
só a Gâmbia e o Senegal mostraram estar com o candidato do Madem-G15. E o
interesse do petróleo, que está por explorar, mas cuja renegociação do contrato
de exploração com o Senegal está em discussão.
Com tantos interesses em jogo,
muitos antagónicos, não admira que o conflito esteja instalado, os problemas se
multipliquem e a Guiné-Bissau esteja insanavelmente dividida. O caos tornou-se
quotidiano, uma outra forma de vida para a classe dirigente do país.