(APONTAMENTOS DE LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA, UMA IMPRESCINDÍVEL ESSÊNCIA DA PRÓPRIA HISTÓRIA QUE NOS HAVIA DE TOCAR)
Martinho Júnior, Luanda
01- Há quarenta e cinco anos a vida fluía um pouco como as marés: com refluxos e fluxos movimentados, por vezes em espumosa intempestividade, mas sempre estrondos e cheiro a pólvora, sorvendo dum lado e do outro das frentes de luta um poderoso turbilhão humano!
De forma vigorosa era a dialética da vida que estalava num inusitado frenesim percutindo os tambores do tempo e ecoando pelos horizontes fora, espalhando-se por todo o território angolano!
Nos dois primeiros terços do ano de 1975 foi um refluxo que quase reduziu as fronteiras a um estreito corredor no paralelo de Luanda, com as defesas da capital implantadas nas serranias dos Dembos, a norte e nos altos a sul do Longa, nas eriçadas vértebras do Quanza Sul…
Para oeste, na profundidade do Dondo, eram pequenos destacamentos que vigiavam o eixo do triângulo da planície do litoral, entre o Cuanza e o Bengo, cujas margens se aproximavam nas áreas de Catete… depois era N’Dalatando, Malange e pouco mais no lugar onde nascia o sol!
As Forças Armadas Populares de Angola haviam chegado a essa situação asfixiante, porém com uma contrapartida inestimável, o trunfo que se havia de jogar na hora certa e com reservado sabor a vitória: a partir sensivelmente de Setembro, Luanda guerrilheira e popularmente ciosa de si própria, ficou limpa de forças invasoras trazidas por aqueles que sendo etno-nacionalistas recrutavam mais no exterior do que no próprio país que diziam querer libertar e fê-lo com um amplo esforço, um decidido esforço endógeno mobilizador e catalisador, tirando partido do fermento que havia sido lançado e cultivado, apesar de tantos reveses, desde o 4 de Fevereiro de 1961!
Os progressistas portugueses que ora compunham o MFA, sabiam que a receita colonial de “africanizar” a guerra, significou não só o equívoco “in extremis” que levou ao colapso colonial mas também, por causa dos laços que criou na então Leopoldville e nas nascentes do Lungué Bungo, para dar asas aos etno-nacionalismos em Cabinda, no norte e no centro-sul!...
Era precisamente esse artifício que o movimento de libertação em África teria de neutralizar e se possível vencer, para depois alinhar o seu empenho dialético na justa luta de libertar toda a África Austral!
Sobre Luanda contudo, aproveitando os transvases da planície do litoral que se alongava entre as lagoas do Bengo e o curso final do Dange, a ameaça estava confinada e, escaramuça a escaramuça, foi possível criar o engodo e a armadilha mortal do funil de Quifangondo…
Naquele tempo, o Grupo de Operações Especiais do Estado Maior Geral das FAPLA, desdobrava-se vertiginosamente de missão em missão e à longa batalha popular pelo domínio de Luanda e seus arredores, sucedeu que se havia que saber defender a capital no seu mais profundo entorno (ainda que prevendo sempre o colapso das linhas) para, depois de assegurá-la no contrarrelógio do 11 de Novembro, haver que ir à busca das fronteiras perdidas, nas obrigações de “um só povo e uma só nação”!...