Eugénio Rosa [*]
A grave crise económica e social, causada pela pandemia que obrigou ao confinamento e ao fecho nomeadamente dos setores mais débeis da economia, com perdas de emprego, de rendimentos e fecho de empresas está a agravar ainda mais as desigualdades que já eram enormes no nosso país antes do COVID. A riqueza criada no país diminuiu no 1º Trim.2021, o desemprego continua a aumentar de uma forma rápida como os últimos dados do IEFP revelaram, a procura de ajuda alimentar disparou, o ritmo de vacinação continua frouxo e aos ziguezagues, e ainda não terminou esta vaga e já meios de comunicação social alarmistas anunciam uma outra vaga ou outra variante do vírus. A insegurança que se está a criar nos portugueses é muito grande. Era necessário que as autoridades de saúde e o governo fossem mais claros e assertivos, que o governo planeasse bem antes de executar, e que acabasse com avanços e recuos contínuos que gera perda de confiança e o desautoriza, e que os órgãos de comunicação social deixassem de promover a incerteza com notícias e com declarações de especialistas que se contradizem uns aos outros. Assim a economia não conseguirá funcionar e muito menos recuperar e o descalabro económico e social será maior. Para que se possa ter uma ideia da gravidade do aumento das desigualdades causado pela pandemia, é importante ter presente que Portugal era já um país profundamente desigual antes do COVID como se vai mostrar utilizando apenas dados oficiais.
O gráfico 1, construído com os dados das Contas Nacionais divulgados pelo INE, mostra como evoluiu a repartição da riqueza criada no país, entre o TRABALHO e o CAPITAL de 2008/2019
Em 2008, os Trabalhadores receberam sob a forma de
"Ordenado e salários" 65.454 milhões € (36,5% do PIB) e os donos
do Capital 72.757 milhões € sob a forma de Excedente Bruto de Exploração (40,6%
do PIB), ou seja, mais 7303 milhões € do que os Trabalhadores. Em
2019, essa diferença já tinha aumentado para 12.828 milhões € (+75,6%),
pois os salários somaram 74.640 milhões € (35% do PIB) e o
Excedente Bruto de Exploração que reverteu para os donos do Capital 87.468
milhões € (41% do PIB). Entre 2008/2019, o total de "Ordenados e
salários" recebidos pelos trabalhadores foi inferior ao Excedente Bruto de
Exploração, recebido pelos donos do Capital, em 149.957 milhões €, o que
agravou enormemente a repartição da riqueza criada no nosso país (entre
2008 e
Portugal é um país de baixos salários (em 2019, o custo da mão de obra no nosso país correspondia apenas a 51% da média dos países da UE e a 46% dos da Zona do Euro segundo o Eurostat). Para além disso, também se verifica uma grande desigualdade salarial entre os próprios trabalhadores imposta pelos patrões para aumentar a exploração. O gráfico 2, publicado pelo Ministério do Trabalho, mostra de uma forma clara essa realidade. E é neste contexto de baixos salários e desiguais que surge a pandemia.
Os dados do gráfico 2, referem-se aos ganhos (inclui a remuneração base mais subsídios recebidos pelos trabalhadores e trabalhadoras) dos quadros de pessoal das empresas enviados ao Ministério do Trabalho. E são dados de 2018, que são os últimos disponíveis e que foram divulgados em 2021. Eles mostram as profundas desigualdades que existem a nível salarial no nosso país
Comecemos por comparar os ganhos anuais mais elevados (9º decil) com os ganhos
mais baixos (1º decil). O ganho mais elevado dos Homens, do 9º decil
(33.099€/ano, 2369,2€/mês) é 3,7 vezes superior (+273%) ao dos Homens com ganho
mais baixo, ou seja, do 1º decil (8881€/ano, 634€/mês). E o ganho das Mulheres
que recebem mais, do 9º decil (30368€/ano, 2169€/mês) é 3,6 vezes superior
(+257%) às que ganham menos, ou seja, do 1º decil (8500€/ano, 607€/mês).
Se compararmos os ganhos dos Homens com os das Mulheres as desigualdades
são também enormes. No escalão mais baixo (1º decil) o ganho do Homem é
superior ao da Mulher em 381€ (8881€/ano/H versus 8500€/ano/M), enquanto no
escalão mais alto (9º decil) o ganho do Homem é superior ao da Mulher já em
6127€ (36495€/ano/H versus 30368€/ano/M).
Em relação ao ganho mais frequente, ou seja, o recebido pela maior parte dos
trabalhadores e trabalhadoras – a Moda – o das Mulheres era 8500€/ano
(607€/mês) e o dos Homens 8881€/ano (634€/mês). E em relação àquele valor do
ganho em que existem o mesmo número de trabalhadores e trabalhadoras a
receberem mais e a receberem menos que esse valor, designado por Mediana, ele
era para os Homens de 13821€/ano (987€/mês) e para as Mulheres de 11891€/ano
(8849€/mês). As desigualdades salariais no seio dos próprios trabalhadores/as e
entre trabalhadores e trabalhadoras é aproveitada pelos donos do Capital para
aumentar a exploração de quem trabalha, para assim aumentar a parcela da
riqueza criada de que se apropriam. A isto ainda se junta uma política fiscal
profundamente injusta, de que é ex. recente o caso da EDP/ENGIE que, através de
um planeamento fiscal agressivo, conseguiu não pagar 110 milhões € de impostos
bem como o não pagamento de IRS pelos reformados dos países ricos (devido
ao escândalo na UE o governo aprovou uma taxa máxima de IRS de 10%, mas não
para trabalhadores e pensionistas portugueses) o que levou a ministra das
Finanças sueca a gozar da "ingenuidade" portuguesa, o que agrava mais
a injustiça que existe em Portugal que nenhum governo ou partidos políticos tem
coragem ou força para pôr cobro. Para terminar observem-se os dados quadro 1.
Como se conclui do gráfico 2, a Moda dos ganhos era apenas 44,8% da Media dos ganhos em 2018. Isto significa que o ganho da maioria dos trabalhadores (Moda) em 2019 era muito inferior ao ganho Médio que era 1188€ em abril de 2019.
28/Março/2021
[*] edr2@netcabo.pt
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