Com o fim do estado de emergência, abriu-se a porta à saída para o setor privado. Entre 1 de Maio e 4 de Junho, o Instituto Português de Oncologia de Lisboa viu sair 50 enfermeiros, médicos, técnicos superiores, assistentes e auxiliares.
Vinte enfermeiros, 13 médicos, 10 técnicos superiores, quatro assistentes e três auxiliares. Ao todo, 50 profissionais de saúde saíram do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, desde 1 de Maio até à passada sexta-feira.
Seduzidos pela forte oferta do sector privado na região de Lisboa, estes profissionais de saúde saem do IPO altamente qualificados. Por exemplo, a formação de um enfermeiro intensivista demora vários meses.
E são precisamente os enfermeiros que fazem mais falta no IPO de Lisboa. Nesta altura, o Instituto tem 574 enfermeiros, necessitando de mais 139.
Ao que a TSF conseguiu saber, o IPO já pediu autorização ao Governo para contratar mais 20 enfermeiros, mas a luz verde ainda não chegou.
De resto, é a falta de enfermeiros que está a travar a entrada em funcionamento das novas salas do bloco operatório.
Em declarações à TSF, Guadalupe Simões, dirigente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, adianta que, em abril, cerca de 800 enfermeiros manifestaram a intenção de sair para o privado.
"Há uma inoperância, uma ineficácia total, por parte do Governo, relativamente à tomada de decisões no sentido de retenção dos profissionais", acusa a dirigente sindical.
Com um investimento de 3,7 milhões de euros, as obras de ampliação e requalificação aumentaram a capacidade do bloco, de cinco para nove salas de cirurgia. Com tudo a postos, faltam apenas os testes, mas não existem enfermeiros suficientes que permitam o funcionamento do renovado bloco operatório.
O serviço de radioterapia enfrenta o mesmo problema. Faltam físicos para trabalhar com os aceleradores lineares, um equipamento que ajuda a prevenir e tratar o cancro. Desde 2009, foram adquiridos seis aceleradores lineares, mas por escassez de recursos humanos, 1200 doentes tiveram de ser encaminhados para o sector privado, no ano passado. A fatura foi de dois milhões e meio de euros.
Os físicos que operam os aceleradores lineares integram-se no grupo dos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica. Nesta categoria, o IPO de Lisboa necessita de 82 profissionais. Faltam ainda 63 médicos e 70 assistentes. No total, o Instituto Português de Oncologia de Lisboa precisa, até ao final do ano, de mais 364 profissionais de saúde.
O IPO de Lisboa recebe um quarto dos doentes com cancro na região de Lisboa e Vale do Tejo. São cerca de 14 mil novos utentes por ano. Neste momento, estão a ser tratados e acompanhados 57 mil doentes.
Apesar de ter perdido 50 profissionais em pouco mais de um mês, o presidente do IPO de Lisboa garante que a capacidade de resposta não está comprometida, mas há serviços que arriscam diminuir a atividade.
Ouvido pela TSF, João Oliveira nota um empenho muito grande no Ministério da Saúde, mas sublinha que as Finanças têm obsessão pelo défice.
A situação vivida no IPO de Lisboa não é um exclusivo nacional, garante o presidente da Federação Nacional dos Médicos. Noel Carrilho lamenta, no Fórum TSF, que, depois de um período em que a assistência médica, devido à pandemia, sofreu um atraso, não haja agora condições para recuperar.
A fuga de profissionais de saúde do público para o privado não surpreende o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos. Também no Fórum TSF, Jorge Roque da Cunha lembra que os ordenados dos médicos não são actualizados há uma década, pelo que o privado é mais aliciante.
Já Fernando Zorro, vice-presidente do Sindicato dos Técnicos Superiores de Saúde das Áreas de Diagnóstico e Terapêutica, afirma que o problema só se resolve com vontade política e não com troca de responsabilidades entre ministérios.
Cristina Lai Men | TSF
*A autora não segue o acordo ortográfico de 1990
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