domingo, 5 de setembro de 2021

Moçambique -| Dívidas ocultas: O silêncio de Bruno Langa

Na passada sexta-feira (3) Bruno Langa remeteu-se ao silêncio face às perguntas da Ordem dos Advogados. Para o Centro para a Democracia e Desenvolvimento, "o poder judicial tem medo do poder político".

O réu Bruno Langa, 44 anos, ignorou as 27 perguntas da Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM). Limitou-se a dizer: "não vou responder a essa pergunta".

A Ordem, que auxilia o Ministério Público (MP) no julgamento, queria saber se o réu cometeu o crime de tráfico de influências.

Segundo a acusação, Bruno Langa teria levado a brochura sobre o projeto de proteção da Zona Económica Exclusiva (ZEE) da empresa Privinvest a Ndambi Guebuza para que este pudesse influenciar o pai, o ex-Presidente Armando Guebuza, a aprovar a proposta.

Aliás, a procuradora Ana Sheila Marrengula exibiu na quinta-feira (02.09) um e-mail do negociador da Privinvest, Jean Boustani, que tinha como destinatário o filho mais velho do ex-chefe de Estado, com cópia para o réu Bruno Langa.

"Porque é que Jean Boustani tinha que o copiar num e-mail que foi enviado a Armando Ndambi Guebuza, que diz: 'Este é o relatório que lhes foi enviado pelo nosso gestor que foi a Maputo. Por favor envie ao teu pai. O que fazemos agora? Aguardo por ti'", confrontou a procuradora.

"Eu não sei porque é que ele copiou, digníssima. [...] Desculpa digníssima, qual é a data? Eu já não tinha relacionamento com a Privinvest, então era impossível ele ter mandado", esquivou-se o réu.

"Não vou responder à pergunta"

Por tudo isto, o causídico Filipe Sitoe, da Ordem dos Advogados de Moçambique, pediu esclarecimentos sobre o envolvimento de Bruno Langa no alegado crime: "Esperamos que responda. Bruno Langa, o senhor foi acusado e pronunciado de ter entregue uma brochura do grupo Prinvinvest a Armando Ndambi Guebuza para ser entregue ao Presidente da República. Confirma isso?"

O arguido manteve a sua estratégia: "Não vou responder à pergunta".

A OAM questionou ainda Bruno Langa sobre supostas ameaças que teria sofrido na procuradoria durante a fase de instrução preparatória, denunciadas por ele na sessão de quinta-feira.

"Tem ciência de que fez graves acusações ao Ministério Público? Fez graves acusações ao seu advogado, fez graves acusações ao meritíssimo juiz de direito da secção de instrução criminal, o Dr. Délio Portugal. Tem ciência disso?"

Mais uma vez, a reação foi: "Não vou responder à pergunta".

"O poder judicial tem medo do poder político"

Duas semanas depois do início do julgamento, o diretor executivo da ONG Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), critica os procedimentos. Para Adriano Nuvunga, a forma como as perguntas são dirigidas aos réus levanta suspeitas.

"A avaliação que se faz é que o poder judicial tem medo do poder político. É só olhar para a forma como as perguntas são colocadas e para a forma como o juiz ficou quando viu o antigo presidente Guebuza a chegar ao tribunal, quando acompanhava o seu filho, quase perdeu o ar. Isso mostra que o poder judicial tem medo", diz Nuvunga.

Segundo o diretor do CDD, além dos 19 réus em julgamento, falta notificar os "grandes" suspeitos deste escândalo de corrupção, que lesou o Estado moçambicano em mais de 2,2 mil milhões de dólares.

Ele lembra que "o que está em julgamento agora é uma parte pequena. São pessoas importantes, mas vão conduzir apenas à recuperação de uma parte muito pequena. O que está em causa ali são as comissões que aqueles indivíduos receberam no processo da formulação do projeto". Mas, em última análise, o que se pretende saber neste caso é "quem autorizou o projeto, quem se beneficiou dessa autorização e como tudo isso defraudou o Estado", sublinha Nuvunga.

Romeu da Silva (Maputo) | Deutsche Welle

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