PORTUGAL ELEITORAL
Findas as eleições, prepara-se o novo Governo e a arquitectura do poder socialista no Parlamento. Edite Estrela deverá ser indicada para presidir à Assembleia da República e Ana Catarina Mendes ser reconduzida como líder parlamentar. Costa tem agora de formar uma equipa. Há pelo menos quatro ministros com saída garantida.
m dia depois da inesperada vitória do PS com maioria absoluta - inesperada até para António Costa -, toda a intriga interna dentro do partido se centra agora na forma como o poder socialista se organizará para a nova legislatura. Dito de outra forma: que Governo António Costa formará; e como será estruturado o poder parlamentar do partido.
No capítulo do poder parlamentar, há dois dados que são apresentados como garantidos: Ana Catarina Mendes continuará como líder parlamentar; e Edite Estrela será a candidata do PS a presidente da Assembleia da República.
Há algumas semanas, a escolha de Edite ainda não era dada como segura, dada a perspetiva de o PS poder voltar a governar sem maioria absoluta. Encarava-se com preocupação a possibilidade de uma candidatura de Edite Estrela ao lugar que ainda é hoje de Ferro Rodrigues não recolher apoio maioritário quando fosse a votos no Parlamento (o voto é secreto). O resultado das eleições, domingo, resolveu o problema.
Já quanto a Ana Catarina Mendes especulou-se sobre a possibilidade de, finalmente, ao fim de mais de duas décadas de carreira política, transitar para um cargo governativo. Mas há um problema.
Esse problema chama-se António Mendonça Mendes. É irmão de Ana Catarina e deverá, tudo o indica, ser reconduzido no cargo de secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Costa, escaldado com o desgaste que sofreu por causa das ligações familiares na constelação socialista e consequentes sugestões de nepotismo, não quer dois irmãos no mesmo Governo. Ana Catarina Mendes deverá então manter-se líder parlamentar do PS. E o que se espera é que contribua para o esforço que António Costa diz querer empreender de "reabilitar a ideia de maioria absoluta". Ou seja: entre outras, Ana Catarina deverá ter a missão de manter as portas abertas ao diálogo do PS com os partidos à sua esquerda. Sabendo, ao mesmo tempo, que a maioria absoluta permitirá que se aprove o que o PS quiser.
João Leão sai ou não?
A manutenção de António Mendonça
Mendes nos Assuntos Fiscais remete para outro problema. João Leão vai manter-se
ou não como ministro das Finanças? Recentemente, foi noticiado que Costa
poderia estar a pensar
A composição do Executivo é um segredo guardado a sete chaves na cabeça de António Costa - nem o próprio já determinou para si próprio que lista levará ao Presidente da República.
As certezas que existem são, na verdade, pela negativa. Sabe-se que a pasta da Justiça vai ficar vaga dada a indisponibilidade pública já manifestada pela atual ministra, Francisca Van Dunem. E sabe-se, também, que na prática o ministério da Administração Interna ficou também vago com a saída de Eduardo Cabrita (Van Dunem passou a acumular essa pasta com a da Justiça mas num movimento assumidamente provisório).
Para a pasta da Justiça fala-se
de Alexandra Leitão, atual ministra da Modernização do Estado e da
Administração Pública. Currículo como jurista não lhe falta (é licenciada,
mestre e doutora em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa) e chegou a ser em tempos (de
Já quanto à Administração Interna, especula-se dentro do PS sobre a possibilidade de o cargo ser entregue a Duarte Cordeiro. Atual secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Cordeiro foi o dirigente que dirigiu a campanha que deu no domingo a maioria absoluta a António Costa - e não há no PS quem não ache que essa proeza não merece ser premiada com uma promoção a ministra. O que falta saber é se o próprio Cordeiro não achará que ser nomeado ministro da Administração Interna é um presente envenenado em vez de uma promoção. A pasta é conhecida por ser incendiária para todos os seus titulares.
Tida como inamovível no Governo estará a titular da pasta da Saúde. Marta Temido só não continuará se não quiser. Nas eleições de domingo foi a votos como cabeça de lista em Coimbra e fez aumentar o score do partido: passou de 39 para 45,2 por cento e de cinco para seis deputados (conquistando esse novo deputado ao BE, que ficou sem nenhum). O PS, em Coimbra, subiu de 79,6 mil votos para 97,3 mil e assim Temido confirmou que a gestão da pandemia não lhe terá provocado erosão na relação com o eleitorado, pelo contrário. Há quem sublinhe, além do mais, que o PS chegou a estas eleições em Coimbra, agora, depois de, em setembro ter perdido a câmara da capital do distrito.
Augusto Santos Silva, João Cravinho Gomes, Siza Vieira e Pedro Nuno Santos também parecem seguros nos seus ministérios, respetivamente Negócios Estrangeiros, Defesa, Economia e Infraestruturas. Santos Silva já fez saber que quer voltar à docência universitária mas também referiu que é algo que só terá de acontecer "até 2026" - ou seja, poderá cumprir uma nova legislatura ao comando da diplomacia portuguesa. João Pedro Matos Fernandes também se deverá manter no Ambiente.
Depois, ouvem-se especulações várias sobre ministros eventualmente de saída: Graça Fonseca (Cultura), Manuel Heitor (Ciência e Ensino Superior), Maria do Céu Antunes (Agricultura) e Ricardo Serrão (Mar).
Para a Agricultura fala-se no
regresso do eterno Capoulas Santos - que aceitou ser cabeça de lista em Évora
depois de ter sido que se despedia da política - e para a Ciência e Ensino
Superior
Nos corredores socialistas também é dado como provável que ou Nelson de Souza (Planeamento) ou Ana Abrunhosa (Coesão Territorial) um dos dois sairá, provavelmente para se fazer destes dois ministérios um só. A reorganização orgânica do Executivo já prometida por Costa - que disse querer agora uma equipa "mais curta, renovada e ágil, com um novo modelo de Governo" - poderá também envolver o Mar e o atual ministério de Modernização Administrativa.
Hoje e amanhã, o Presidente da República receberá os partidos com assento parlamentar. A última delegação a ser ouvida será a do PS, chefiada por António Costa, amanhã, às 18.00. E depois Marcelo convidará o chefe socialista a formar Governo, cumprindo-se o artigo 187 da Constituição: "O primeiro-ministro é nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais".
Já os novos deputados deverão assumir funções até meados de fevereiro, esperando-se entretanto que seja publicado em Diário da República o mapa geral dos resultados finais das eleições. Este terá de ser entregue à CNE (Comissão Nacional de Eleições) até 9 de fevereiro, determinando depois este organismo a sua publicação. Acontecendo isso, o Parlamento poderá reabrir portas, já com a sua nova composição. Na primeira sessão elege-se o presidente. Em 2019, as eleições realizaram-se em 6 de outubro e o mapa oficial dos resultados foi publicado em 22 de outubro, com a primeira reunião plenária a realizar-se no dia 25, 19 dias depois das legislativas.
Já quanto ao Governo, a verdade é que o primeiro-ministro indigitado não tem prazos para cumprir para apresentar equipa. 25 dias foi o prazo mínimo entre a data das eleições e a da tomada de posse.
João Pedro Henriques | Diário de Notícias
Imagem: Ana Catarina Mendes deverá ser reconduzida como líder parlamentar do PS © Orlando Almeida / Global Imagens
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