Artur Queiroz*, Luanda
A cadeia da sabedoria começou quando eu era criança. Aprendi muito com os meus pais e as duas professoras que tive na escola primária. Ainda criança aprendi mais com os idosos da minha vida, o Velho Tuma, os meus avós, a minha avozinha Gracinda, Tia Cachucha. Na adolescência aprendi com os mais velhos mas também com alguns professores. Na juventude aprendi com os mais velhos mas também com professores e os colegas.
Já adulto continuei a aprender muito com os mais velhos mas sobretudo com as mulheres que partilharam as suas vidas comigo. Assim foi até chegar a hoje. Nunca apendi tanto ao longo da vida. Já nada aprendo com os velhos, mas os jovens ensinam-me coisas extraordinárias. As e os que mais me ensinaram foram precisamente aquelas e aqueles que era suposto eu ensinar.
Em 1974, aprendi imenso com o Homem Novo do MPLA. Tenho imensa pena que poucos quisessem aprender com os combatentes que vieram da guerrilha. Tinham um mundo fantástico para nos mostrar. Desgraçadamente, o elitismo e as taras do colonialismo afastaram quase todos dessa aprendizagem. Eu tentei aprender o mais possível. E aprendo o máximo da minha capacidade.
Um dia o discurso dos políticos
deixou de veicular sabedoria. Nada de novo. Nada a seguir. Nada a partilhar.
Nada melhorou as nossas vidas. Um deserto de ideias tornou as sementes estéreis
e triunfou a mediocridade, o óbvio, a encenação faz de conta. O fabuloso
mosaico cultural angolano está
Um cardeal argentino chegou a Roma e mudou tudo. Jorge Mário Bergoglio, apenas oito anos mais velho do que eu, abanou o mundo das ideias e começou a ensinar-nos coisas extraordinárias. Aquilo que eu diria em horas ou 100 páginas se reduzisse a conversa a escrito, ele transmitiu assim: Este capitalismo mata! Em poucas palavras, muito simples, o Papa Francisco diz tudo o que os humanos precisam de saber para se libertarem. Já aprendi tanto com ele como com os jovens.
As e os jovens do Executivo, as e os jovens das direcções partidárias já quase me reconciliaram com o discurso dos políticos. Espero que continuem nesse caminho. Ainda que algumas e alguns reproduzam as palavras rançosas dos velhos políticos com perspectivas de batráquio, que tornam ainda mais árido o deserto de ideias em que mergulhámos.
Outra figura da cena mundial que me tem ensinado muito é António Guterres, secretário-geral da ONU. É um rapaz mais novo do que eu, mas sabe muitíssimo mais do que um pobre rapaz da Kapopa que andou a caçar à fisga, pelas colinas de Katunda e nas Mudanças do Bindo.
Hoje no Jornal de Angola foi publicado um texto de opinião (texto mesmo, não é uma masturbação assexuada) assinado por Guterres. Escreve ele:
“Muitos líderes mundiais de hoje reconhecem as nossas ameaças comuns - a COVID19, o clima, o desenvolvimento não regulamentado de novas tecnologias. Todos concordam que é necessário agir. No entanto, esse entendimento comum não é acompanhado por uma acção comum. Na verdade, as divisões continuam a aprofundar-se”. O senhor que escreveu isto é Secretário-Geral da ONU. Se fosse eu, já alguém estava a rosnar que sou um radical.
António Guterres põe o dedo nas
feridas que estão em gangrena e fazem do mundo um sítio mal frequentado e muito
perigoso. No seu texto hoje publicado no Jornal de Angola ele diz que os
gravíssimos problemas são visíveis em todo o lado e aponta corajosamente onde
residem:
“Na distribuição injusta e desigual de vacinas. Num sistema económico mundial
manipulado contra os pobres. Na resposta totalmente inadequada à crise
climática. Na tecnologia digital e numa indústria de Media que lucra com a
divisão. Numa crescente instabilidade e conflito em todo o mundo”.
Se fosse eu a escrever isto, o estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) punha logo os seus serventes a caluniar-me no Club K, na ERCA, nas redes sociais, no Morro da Maianga que agora virou condomínio de luxo e noutros sítios mal frequentados que não vou nomear porque até Agosto deste ano, estou de férias.
António Guterres, no seu texto de opinião (o primeiro no Jornal de Angola em mais de dois anos) escreve esta bomba:
“Ao mesmo tempo, as instituições internacionais com mais poder ou estão paralisadas pela divisão - como o Conselho de Segurança - ou são antidemocráticas - como muitas das nossas instituições financeiras internacionais”.
Como esta é a opinião do Secretário-Geral da ONU, acredito piamente como se o texto fosse escrito por mim. Também acho que o Conselho de Segurança da ONU está paralisado e assim vai continuar enquanto o mundo for um brinquedo nas mãos do estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA). Mas não só. Os seus aliados da NATO são iguais, sem qualquer excepção. Todos de cócoras ante os cobóis que exterminaram os índios e continuam a exterminar povos que não se submetem aos seus interesses.
Muitas instituições financeiras internacionais são antidemocráticas, escreveu António Guterres. Se fosse eu, já estava a ser trespassado com calúnias do bêbado da valeta que representa os jornalistas angolanos na ERCA. O FMI é uma instituição financeira antidemocrática, uma espécie de arma de destruição maciça ao serviço do estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA).
Banco Mundial, igualmente. Banco Central Europeu, sem dúvida. Reserva Federal é uma espécie de Hitler do mundo financeiro. E as agências de notação financeira são verdadeiramente terroristas. Armas mortíferas “de um sistema económico mundial manipulado contra os pobres”, como escreveu hoje António Guterres no Jornal de Angola.
Obrigado pela lição senhor Secretário-Geral da ONU. Espero que o Executivo de Angola também tenha aprendido com tão exuberantes ideias.
* Jornalista
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