Artur Queiroz*, Luanda
A revolução em Portugal, Abril de 1974, vai fazer 48 anos, chegou a Angola num momento particularmente difícil para as forças nacionalistas e particularmente as progressistas e revolucionárias. A FNLA de Holden Roberto estava paralisada mas nunca o velho líder nacionalista se vendeu aos colonialistas como fez Jonas Savimbi. O MPLA sofreu um ataque brutal dois anos antes, com a chamada Revolta do Leste e a situação agravou-se com o surgimento da Revolta Activa logo após o triunfo dos revolucionários portugueses, comandados por Otelo Saraiva de Carvalho.
As divisões internas no MPLA duraram pouco tempo. Manuel Pedro Pacavira, Hermínio Escórcio e Aristides Van-Dúnem refundaram o movimento no interior e a liderança de Agostinho Neto foi confirmada por esmagadora maioria dos militantes. Mas eram poucos na defesa dos valores revolucionários que davam suporte à Independência Nacional “total e completa”. Norberto de Castro era um dos mais competentes radialistas angolanos (para mim era de longe o melhor) mas foi perseguido por oportunistas e invejosos. Acabou por aderir à UNITA. Nunca lhe pedi satisfações mas ele explicou-me por que tomou tal decisão, sendo um homem do MPLA desde o início dos anos 60.
Raimundo Sotomaior foi um dos maiores jornalistas angolanos com quem trabalhei. O trabalho feito no Diário de Luanda até meados de 1976 teve a sua marca, o seu empenho, o seu sacrifício. Um dia aderiu à UNITA. Para mim foi um choque tremendo. Quando trabalhava num jornal de Lisboa ele procurou-me, sem aviso prévio. Recebi-o de braços abertos. Não me informou que ia ao meu encontro porque temia que não o recebesse. Quis explicar-me por que motivo aderiu à UNITA, depois de prestar valiosos serviços como militante do MPLA. Disse-lhe que para mim seria o “Souto” de sempre, amigo e companheiro de profissão.
Xavier Figueiredo é um grande jornalista angolano. Colaborei com ele e com o Moutinho Pereira no projecto mediático “O Huambo”. Um dia o Chico Simons disse-me que ele estava na base militar para apanhar o avião da “ponte aérea”. Pedi ao motorista para me levar lá. Procurei-o entre a multidão de refugiados e quando o encontrei dei-lhe um abraço de despedida. A guerra nas ruas de Luanda estava no auge e as pessoas normais fogem das guerras. Um dia soube que ele se entregou à UNITA. Um camarada do MPLA, com quem trabalhei num projecto jornalístico descentralizado, importantíssimo, mudou de campo. Continuo a ser amigo dele. E penso que ele é meu amigo.
José Luís Mendonça é um dos maiores poetas de Língua Portuguesa e em Angola é seguramente o maior poeta contemporâneo . Um dos serviços mais importantes que prestei ao Povo Angolano (fiz tão pouco por ele, para tanto que me deu) foi convencer o conselho de administração da Empresa Edições Novembro a lançar o jornal “Cultura”. E ter conseguido que o Mendonça fosse convidado para dirigir o projecto. Ele não desmereceu. Entre o mais importante papel da publicação foi a revelação de jovens que ninguém suspeitava que existissem. Gente de alta categoria literária e intelectual.
O jornal acabou porque, segundo o conselho de administração da empresa, não havia condições financeiras para continuar. Victor Silva, o responsável máximo, gastava mais por mês em viagens e ajudas de custo, do que o “Cultura” em pré impressão, impressão, salários e pagamento das colaborações. Não assumiram o ódio que têm ao fabuloso mosaico cultural angolano e aos intelectuais, dos quais José Luís Mendonça é um lídimo representante. Não sei o que pensa disso, mas eu nunca lhes perdoarei o crime de lesa cultura. Aquele jornal era meu queridíssimo filho e eles mataram-no. Não há perdão para os matadores.
Xavier Figueiredo acaba de divulgar um texto onde critica a neutralidade de Angola e Moçambique numa “guerra tão ignominiosa como a que por mão da Rússia estalou na Ucrânia”. Uma coisa é aceitares como verdadeiro o argumento da UNITA segundo o qual fizeram a guerra em Angola contra os russos. Outra é hoje classificares de ignominiosa a guerra na Ucrânia e nunca teres escrito o mesmo sobre a guerra colonial. É verdade, se escrevesses, a censura cortava o texto e tu ias preso. Por essa falha estás desculpado.
Mas é indesculpável que entre 1976 e 1988 nunca tenhas escrito uma linha sobre a guerra de agressão da África do Sul contra o teu país, Angola. Os nazis do regime de apartheid bombardearam sanzalas, acampamentos de refugiados, vilas e cidades. Milhares de mortos civis. Os nazis do regime de apartheid destruíram equipamentos sociais e estruturas económicas lançando o Povo Angolano na miséria. O esforço de guerra pela soberania nacional e a integridade territorial custou o futuro a milhões de angolanos. Ainda pagam essa pesada factura. E tu, Xavier, nunca escreveste uma linha a condenar tão ignominiosa guerra de agressão estrangeira ao teu país.
Entre 1992 e 2002, Jonas Savimbi e seus sequazes lançaram o terror e a morte em todo o país. Mais de um milhão de refugiados e deslocados, milhares e milhares de mortos, tudo partido, tudo destruído. E tu, Xavier, nunca escreveste uma linha condenando o criminoso de guerra Jonas Savimbi de a sua ignominiosa rebelião. Ainda estás preso à propaganda colonial-fascista, quando metia na cabeça dos portugueses e angolanos que Portugal combatia em Angola contra os comunistas russos! Tenho para ti uma má notícia.
Na Federação Russa os comunistas são minoritários e está no poder um partido liberal, tão ao gosto do Ocidente. O problema é que os governantes russos não deixam roubar os seus recursos nem prestam vassalagem ao estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) nem à falida União Europeia. A guerra dos teus amigos nazis da África do Sul contra Angola existiu. Causou milhões de vítimas. Jonas Savimbi aproveitou a boleia e disparou contra o seu povo. Matou angolanos por conta do regime de apartheid. Xavier escreve qualquer coisinha sobre isso e depois falamos de ignomínia.
José Luís Mendonça afirma que os Media estão todos nas mãos do Executivo. Aponta como excepções a Rádio Despertar e o Folha 8 “que tem pouca tiragem”.Olha que a lista é muito maior. Também dizes que a UNITA é ostracizada pelo poder. Essa é boa. Ostracizados mas quando os patrões foram derrotados no Triângulo do Tumpo e forçados ao Acordo de Nova Iorque, tiveram honras de Acordo de Bicesse. Ostracizados mas depois da rebelião de 1992, foram para o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional. Ostracizados mas depois de 2002 foram mais bem tratados do que os Heróis Nacionais que puseram fim à aventura belicista de Jonas Savimbi. Equívoco ou confusão mental? Desengana-te. Olha que não existe Galo Mulato!
A veneranda juíza presidente do Tribunal. Laurinda Cardoso, fez uma declaração importantíssima. Disse as palavras certas no momento exacto. Leiam. “Os partidos políticos devem competir entre si e não usar as instituições públicas, com realce do poder judicial, como bodes para expiar os respetivos pecados. É imperioso que interiorizemos o seguinte: a Justiça não pode ser vista como injusta quando não decide a nosso favor e justa quando decide a nosso favor”.
O líder do PR, Benedito Daniel, reagiu a esta declaração manifestando o seu acordo. O secretário-geral da UNITA, Álvaro Chikwamanga Daniel, manifestou surpresa pela oportuna declaração da presidente do Tribunal Constitucional e voltou a bater na mesma tecla da estupidez natural: “Os órgãos do Estado não se devem imiscuir nos processos eleitorais. Deixem que os políticos trabalhem nisso e que a Comissão Eleitoral cumpra com o seu papel e não receba ordens de outros espaços como a Casa Militar do Presidente da República. Não façam isso”.
José Luís Mendonça achas que este rapaz é ostracizado? Puro engano de alma. Apenas não lhe deixam impor em Angola a justiça das fogueiras da Jamba para só ficarem galos negros e os adversários galos em cinzas. Não te distraias.
* Jornalista
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