sexta-feira, 10 de junho de 2022

LARANJINHA NO BANQUETE DOS GALITOS – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Naquele tempo eu era solteiro, bom rapaz e um esforçado repórter, cavando notícias dos casos do dia. Os leitores conheciam os subterrâneos da cidade e sabiam o que tinha acontecido enquanto dormiam a sono solto, até acordarem com  o roncar das máquinas. Nunca me dei bem com a situação de celibatário. Por isso inventei os casamentos instantâneos. Quando me apaixonava, convidava amigas e amigos para a boda da minha princesa. A duração do matrimónio dependia da disponibilidade das adoráveis esposas. 

Um dia casei com uma senhora bastante rica. O marido tinha ido a Portugal traficar moeda e no intervalo fizemos um casamento de arromba. Um dos meus convidados, o Kid Kindumba, rei do munhungo, disse mal do pitéu, servido esmeradamente pelo restaurante Tongo. Ficou riscado da minha lista de convivas. É preciso ter muita lata para ir a uma boda de casamento instantâneo e dizer mal do banquete. Entrada cortada!

Marcolino Moco e Francisco Viana imitam o desalmado Kid Kindumba. Aparecem em tudo quanto é Media dizendo mal do banquete que o MPLA lhes serviu ao longo de meio século! São muito parecidos com o Zelensky da Ucrânia. Diz mal da comida que a França e Alemanha lhe metem no prato. Qualquer dia morre empanturrado com tanto dinheiro e tanta arma. Não desejo o mesmo fim aos propagandistas da UNITA. Pelo contrário, desejo-lhes longa vida para verem muitos anos, os sucessos políticos do MPLA.

Uma tal Rita Laranjinha, directora-geral para África no Serviço Europeu de Acção Externa (União Europeia) veio a Luanda fazer figura de Kid Kindumba, Marcolino Moco, Francisco Viana e outros trânsfugas da democracia. Fez declarações públicas que considero próprias do Agapito ou do Silvério Marques. Fez-se convidada para observar as eleições gerais em Agosto. Alguém tem de explicar a esta flatulência retardada do colonialismo que Angola é que decide quem observa as eleições e com que regras. Não é Bruxelas e muito menos ela. 

Uma burocrata da União Europeia vem a Luanda mendigar gás e petróleo, à boleia da situação nos Grandes Lagos ou na África Central. Diz uns disparates de circunstância e depois faz-se convidada para observar as eleições. A dona Laranjinha, antes de partir para Luanda, devia estudar umas coisinhas. Primeira: Saber se Angola é uma feitoria, como Portugal, ou um país independente. Segunda: Como foi nas eleições de 2017. Sou bom rapaz e vou ajudá-la, sem sofisma nem segundo sentido. Nada de avanços. 

Nas eleições de 2017, a Comissão Nacional Eleitoral convidou dezenas de organizações internacionais para observarem a legalidade e justiça do acto eleitoral. A União Africana enviou observadores. Os países africanos de língua portuguesa enviaram observadores. Penso que Portugal também, nas não tenho a certeza. E a União Europeia? Tome nota, Laranjinha: O seu cartel falido também foi convidado. Mas quis impor as suas regras de observação eleitoral. Fez pior do que Kid Kindumba, Marcolino Moco e Francisco Viana. Exigiu escolher a ementa do banquete! 

O ministro das Relações Exteriores na época, Georges Rebelo Chicoti, quando soube que a União Europeia queria impor as suas regras de observação eleitoral, fez esta declaração: “O convite que fazemos às instituições, é aberto. Mas não queremos quaisquer acordos específicos com cada uma destas organizações. Quem quiser vir, vem. Mas o convite é aberto. Não há nenhuma declaração política final, nem relatório oficial para divulgação após as eleições”. A União Europeia não aceitou as regras. Bruxelas queria o mesmo abuso protagonizado por Ana Gomes, que se comportou como uma Savimbi de saias. Foi mais papista do que os pagadores com diamantes de sangue. Isso acabou, dona Laranjinha! Não deixe que o engenheiro à civil Adalberto da Costa Júnior a emprenhe pelos ouvidos. Não dá gozo nenhum (lá estou eu com as ordinarices).

Portanto, se nas eleições anteriores a União Europeia não aceitou as regras definidas pelos órgãos de soberania angolanos, não é agora, que está faminta de petróleo e outras matérias-primas valiosas, que vai aceitar. Quero prestar mais um serviço à sona Laranjinha. Oiça atentamente as declarações do ministro das Relações Exteriores da União Indiana, Subrahmanyam Jaishankar. Ele disse que os problemas da Europa não são os problemas do mundo: “A Europa tem de crescer e abandonar a mentalidade de que os problemas da Europa são os problemas do mundo”. Oiça com atenção e não venha para Luanda com paleio de Agapito e dona da lavra. 

Antes que a dona Laranjinha tome as dores da UNITA e dos seus apoiantes trânsfugas do MPLA, vou revelar-lhe mais este pormenor. A Comissão Nacional Eleitoral definiu como limite máximo, a acreditação de 2.000 observadores nacionais às eleições de 24 de Agosto. Até 30 dias antes do acto eleitoral têm de dar os passos necessários à sua acreditação.

Por piedade (devemos sempre ajudar as e os analfabetos) vou transcrever à dona Laranjinha o Artigo 7º do Regulamento sobre o Reconhecimento e Acreditação dos Observadores Eleitorais, que foi publicado em Diário da República, no passado dia 6 do corrente mês de Junho: “Para efeitos de reconhecimento e acreditação de Observadores Eleitorais Nacionais, a Comissão Nacional Eleitoral fixa a quota de até 2.000 observadores”. 

O que são observadores eleitorais nacionais? O Artigo 7º do regulamento explica: “São as organizações, os indivíduos ou entidades nacionais, legalmente reconhecidas para observarem o processo eleitoral”. Não consigo explicar melhor. Estou a ficar laranjinha da cabeça.

Hoje tomei nota da notícia retumbante. Os ossos dos assassinos que comandaram e dirigiram o golpe de estado de 27 de Maio, decapitando o Estado-Maior General das FAPLA, vão ser enterrados no Cemitério do Alto das Cruzes, ao lado dos comandantes e altos funcionários da República Popular de Angola que eles mataram. Eu sabia que Boris Vian era um transformador da ficção em realidade. Um dia ele escreveu o livro EU VOU CUSPIR NOS VOSSOS TÚMULOS. Já sabia que os familiares de Monstro Imortal, Shianuk e Nito Akves, membros da direcção política e militar do golpe de estado de 27 de Maio de 1977, haviam de pisar e cuspir nos túmulos daqueles que os golpistas assassinaram. Já está.

Mas nunca esqueçam que ele também escreveu MORTE AOS FEIOS ainda que usando o nome de Vernon Sullivan. Como dizia o outro, daqui ninguém sai vivo. Desculpem-me alguma palavra mais maldita.

*Jornalista

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