sábado, 2 de julho de 2022

Angola | O POLÍTICO IMBATÍVEL – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

José Eduardo dos Santos andou na política activa desde os seus tempos de estudante liceal. A sua causa foi sempre a mesma: Angola e os Angolanos. A liberdade e as condições concretas que a suportam. A dignidade e a honra enquanto marcos que sinalizam a vida humana. Numa sociedade concentracionária onde todos eram vigiados em permanência, ele rejeitou a submissão e juntou-se aos que lutavam, de armas na mão, pela libertação da pátria. 

Não era fácil atravessar todo o Norte de Angola até à fronteira com os Congos. José Eduardo dos Santos conseguiu. Essa foi a sua primeira grande vitória política. Embora jovem, já era um quadro. Na Angola daquele tempo, quem tinha o curso geral dos liceus estava em condições de assumir cargos de responsabilidade na administração pública ou na iniciativa privada. 

A direcção do MPLA viu nele um futuro dirigente e apostou na sua formação académica. Estudou e tornou-se um técnico qualificado. Foi até onde poucos tinham ido. Subiu a corda a pulso até à alta direcção do movimento revolucionário que lutava de armas na mão, contra a dominação estrangeira. José Eduardo dos Santos foi escolhido pelos seus pares para coordenar a Frente Norte, que em Abril de 1974 era a única que mantinha forças de combate no terreno. 

Há alguns anos, publiquei uma foto onde o responsável máximo da Frente Norte estava com os comandantes Pedalé, Jika e Eurico Gonçalves nas bases avançadas de Cabinda. Foi sob a sua direcção esclarecida que os combatentes do MPLA puseram fim à aventura de Themudo Barata, então governador do distrito de Cabinda, com a FLEC. Nessa altura revelou-se a sua faceta de diplomata. Conseguiu um acordo com o Movimento das Forças Armadas (MFA) para a defesa conjunta do território e também para um governo partilhado. José Eduardo dos Santos foi o arquitecto desse acordo que transformou a província de Cabinda na retaguarda segura do movimento revolucionário, numa altura em que Nixon, Mobutu e Spínola decidiram afastar o MPLA do poder numa Angola independente.

José Eduardo dos Santos foi escolhido pelos seus pares para Presidente da República. As crónicas dizem que em 1979 ele era ainda muito jovem. É verdade. Mas era já um dos mais experientes políticos angolanos. E tinha no seu currículo grandes vitórias políticas. Uma das mais importantes foi, com certeza, ser um dos dirigentes mais próximos de Agostinho Neto, que nos momentos decisivos daquela época o teve sempre a seu lado.

O Presidente José Eduardo dos Santos, até 2002, foi mais um chefe militar do que um político. Os governos eram formados tendo em conta a guerra. Os ministros eram escolhidos em função da sua capacidade para enfrentar a situação de guerra. A economia era de guerra. A sociedade foi-se moldando e construindo em função das condições impostas pela guerra. 

O Presidente da República, nesses anos dolorosos, era acima de tudo um líder militar, que muitas vezes esteve com os seus soldados nas frentes de combate. A política era feita nos campos de batalha e os dias dos angolanos ensombrados pela dor e o luto. Foi este homem causticado pela guerra que teve a coragem de assinar o Acordo de Bicesse. Foi este político experimentado, este chefe militar coberto de glória por ter vencido as mais duras batalhas, que aceitou o desafio da democracia multipartidária, depois de uma longa guerra de agressão contra o seu povo. 

Ao aceitar eleições para o ano de 1992, assumiu o maior risco da sua carreira política. Depois de quase duas décadas de sacrifícios e de penúria, os angolanos iam às urnas escolher o partido que havia de governar o país e o seu Presidente.

José Eduardo dos Santos mostrou em 1992 que no quadro nacional era um político imbatível. O partido que liderou desde 1979 ganhou as eleições com maioria absoluta, apesar de uma boa parte de Angola ter votado sob coacção dos homens armados da UNITA. E ele passou os 49 por cento, batendo estrondosamente o seu adversário directo que, sabedor de uma derrota humilhante, regressou à guerra, com os seus sicários que agora se reclamam de democratas.

O político imbatível voltou a comandar as suas forças, agora para defender a democracia que acabava de nascer. Esse caminho doloroso só terminou em 2002. Então, José Eduardo dos Santos pôde, finalmente, mostrar os seus dotes de líder político imbatível. Na sua imensa generosidade ainda quis dar uma oportunidade aos derrotados, prolongando o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN). Mas eles pensaram que tinha chegado a sua hora e exigiram eleições. 

Pela primeira vez na sua longa carreira política, José Eduardo dos Santos foi a eleições, num clima de liberdade e estabilidade política e social. Arrasou os adversários com mais de 81 por cento.

O político excepcional mostrou então a sua imensa capacidade de decisão e previsão. Dotou o novo regime de uma Constituição da República que promove e favorece a estabilidade política. Neste novo quadro foi de novo a votos. Conquistou mais de 71 por cento dos votos. 

Uma maioria qualificada que premiou um grande político mas também um extraordinário chefe militar. Quando a Comissão Nacional Eleitoral proclamou os resultados definitivos, ficou provado, sem qualquer dúvida, que José Eduardo dos Santos era um político imbatível. Os seus adversários deviam perceber que perder eleições com um adversário chamado MPLA é uma honra. Não percebem.

As unidades hospitalares de todo o mundo, quando estão a cuidar figuras públicas, colocam o director clínico ou o chefe da equipa que cuida as ou os doentes, a informar a opinião pública do estado de saúde. Mais ninguém tem direito à palavra. Ninguém mesmo. Em respeito ao Direito à Inviolabilidade Pessoal. 

O espectáculo mediático não entra. A especulação é criminosa. O boato é uma agressão inqualificável. A situação dispensa o editorial de um tal Armindo Laurenano no Novo Jornal. Declarações do tipo “nós pagamos a conta da clínica” como se José Eduardo dos Santos fosse um indigente. Dispensa sobretudo que a TPA mande a Barcelona um artista que nos manda rezar pelo enfermo.    

A 54 dias das eleições não faz falta nenhuma este desfile de leprosas e leprosos morais, à volta do antigo Chefe de Estado. O político imbatível que salvou Angola da destruição por forças armadas estrangeiras auxiliadas pelos sicários da UNITA, tem de ser respeitado. Basta.

*Jornalista

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