Para os EUA é intolerável que apenas os seus mais fiéis vassalos os acompanhem nas “sanções” contra a Rússia. Países sobretudo da América Latina, África e Ásia (representando a larga maioria da população mundial) recusam esse alinhamento. Daí a campanha diplomática de ameaças e chantagem - à mistura com promessas - vinda de Washington. Em Moçambique as “promessas” foram devidamente qualificadas: “esmola desprezível”.
A imprensa moçambicana deu destaque à iniciativa de alguns congressistas norte-americanos visando aprovar legislação que permita a Washington aplicar sanções unilaterais a países africanos que mantenham relações de cooperação com a Rússia.
Promovida por Gregory Meeks, do Partido Democrata, presidente do Comité de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes, e por outros congressistas, a proposta, a ser aprovada, teria a esclarecedora designação de Lei para Contrariar as Actividades Malignas da Rússia em África. Tal legislação visaria, entre outras medidas, a imposição de sanções contra os governos africanos «cúmplices no apoio» a relações amigáveis com Moscovo. De acordo com o semanário Savana, de Maputo, a lei seria um instrumento de Washington para pressionar e ameaçar os países africanos – a larga maioria – que se recusam a tomar partido contra a Rússia no conflito na Ucrânia.
Na mesma altura, em meados de Junho, a subsecretária de Estado norte-americana para Assuntos Políticos, Victoria Nuland, visitou Moçambique e anunciou – segundo o jornal Notícias – que os EUA vão desbloquear, para auxiliar a «reconstrução» dos distritos afectados pelo terrorismo na província de Cabo Delgado, uma verba de 14 milhões de dólares por ano ao longo de uma década. «O fundo já foi aprovado pelo Congresso dos EUA e o acordo pode ser assinado nos próximos dois meses», pormenorizou.
Os planos de «ajuda» revelados pela governante norte-americana foram severamente criticados em Maputo.
O meio digital Carta de Moçambique, de grande difusão, qualifica a iniciativa como sendo uma «esmola desprezível» e sugere mesmo que a «ajuda» deveria ser recusada. O seu director, Marcelo Mosse, denuncia «este fingimento de ajuda», lembra que 14 milhões de dólares equivalem ao orçamento anual de uma qualquer ONG financiada pela USAID (a agência governamental dos EUA que distribui dinheiro por organizações «amigas») e sugere mesmo que «Moçambique devia ter a coragem de rejeitar este tipo de esmolas miseráveis». Realça que tal apoio americano «não passa de um grande insulto», «uma espécie de lavar as mãos», «um vexame», comparado com os milhares de milhões de dólares canalizados pela administração de Joe Biden para a Ucrânia em armamento de todo o tipo e «assistência humanitária». E resume: «Biliões para a Ucrânia e quinhentas para Cabo Delgado. Foi sempre assim… Uma “cooperação” que perpetua a nossa miséria».
No mesmo artigo, Victoria Nuland, antiga embaixadora norte-americana junto da NATO, é apontada como «uma das figuras mais proeminentes e mais sinistras da política exterior dos EUA», desde «os tempos de Barack Obama», tendo sido «um dos arquitectos da política dos EUA na Ucrânia». Recentemente, «esteve no Brasil a estudar como sabotar a quase inevitável vitória de Lula nas eleições de Outubro». E, agora, lamenta Marcelo Mosse, «anda por aqui… a anunciar migalhas para os sofredores de Cabo Delgado».
Estas dignas posições de defesa da soberania e de rechaço das ingerências estrangeiras, são hoje cada vez mais frequentes em África. Continente onde a maioria dos países mantém uma posição de neutralidade em relação ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia, apesar das pressões, ameaças e até chantagem da diplomacia dos EUA e da União Europeia.
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