Martinho Júnior, Luanda
INDEPENDÊNCIA, SOBERANIA E MUDANÇA DE PARADIGMA
A ARGÉLIA É UM FACTOR PROGRESSISTA DE VANGUARDA PARA ÁFRICA E PARA A EUROPA
“Solidariedade dos colonizados
Parece existir entre povos colonizados uma espécie de comunicação iluminadora e sagrada que faz com que cada território libertado seja durante um certo tempo promovido à categoria de “território-guia”. A independência de um novo território, a libertação dos novos povos, são sentidas pelos outros povos oprimidos como um convite, um encorajamento e uma promessa. Cada recuo da dominação colonial na América ou na Ásia reforça a vontade nacional dos povos africanos. Foi na luta nacional contra o opressor que os povos colonizados descobriram, concretamente, a solidariedade do bloco colonialista e a necessária interdependência dos movimentos de libertação.
Por exemplo, o enfraquecimento do imperialismo inglês não pode realmente ser acompanhado por uma consolidação do imperialismo francês. Semelhante resultado pode parecer no imediato evidente. Na realidade, o fluxo nacional, a emergência de novos Estados, preparam e precipitam o refluxo inevitável da coorte colonialista internacional. O aparecimento de povos ontem desconhecidos na cena da história, a sua vontade de participar na edificação de uma civilização à medida do Mundo, conferem ao período contemporâneo uma importância decisiva no processo de humanização do Mundo”…
In – “A guerra da Argélia e a libertação dos homens” – Publicado no El Moudjahid, n.º 31, de 1 de Novembro de 1958. – Frantz Fanon.
01- A Argélia foi a segunda vaga moderna de luta armada de libertação nacional contra o colonialismo francês que corroeu durante cerca de 120 anos e venceu no Magrebe!
Essa luta no Mediterrâneo sul, antecedeu a própria Conferência de Berlim que só ocorreu nos finais do século XIX…
A primeira vaga de choque contra o colonialismo da França ocorreu no continente asiático, na Indochina…
O fenómeno da resistência armada na Argélia não era novo e os primeiros anos de luta ocorreram com sentido patriótico desde 1830, quando os exércitos franceses desembarcaram e começaram a ocupar o território argelino.
Com efeito, com a saga de luta liderada pelo Emir Abdelkader as tribos autóctones optaram pela unidade e coesão, consubstanciando além do mais a resistência sociocultural (a resistência armada perdurou a espaços e sob diversos comandos de rebeldes de 1830 até 1903), de tal modo que a luta armada moderna levada a cabo entre 2 de Novembro de 1954 e 18 de Março de 1962 (data dos “Acordos de Évian”, ou seja a Declaração Geral entre as delegações do governo francês e os representantes da Frente de Libertação Nacional da Argélia) em muitos aspectos se inspirou nesse passado de cultura patriótica que foi vibrando há quase duzentos anos.
… Enquanto em África se resistia à ocupação colonial, na América Latina sacudia-se o poder colonialista, praticamente na mesma época!...
A repressão francesa à moderna luta armada de libertação nacional foi sempre sangrenta, pois a guerrilha expandiu-se em ambientes rurais e urbanos com mobilização e intensidade crescentes, pelo que com o apoio internacional que foi isolando o colonialismo francês (que incluiu uma resolução na ONU), a independência se tornou inevitável.
Depois da IIª Guerra Mundial o plano anglo-saxónico foi de facilitar a independência das colónias do império britânico (no seguimento das amargas experiências na União Indiana e no Quénia).
Os encargos sociopolíticos e administrativos, assim como os aparelhos que vieram a constituir os instrumentos de poder, ficavam a expensas dos novos governos instaurados com as independências, mas a “City” reservava para si o poder económico e financeiro “behind the scenes”, tirando partido das multinacionais formadas com e na revolução industrial, algo feito à revelia dos outros colonialismos “mais empedernidos”, entre eles o francês e o português.
A “Commonwealth” viria confirmar em termos de “soft power” a capacidade neocolonial do império da hegemonia unipolar para lidar com o Sul Global!
A iniciativa do general De Gaulle com a Vª República Francesa, adequou-se à opção anglo-saxónica e a Argélia tornou-se desse modo independente, provocando derivas da tese colonial-fascista que acabaram para reforçar as redes “stay behind” da NATO e o seu poder de intervenção na Europa como no “ultramar” (África e América Latina), ao serem aglutinadas instrumentalmente pela CIA!
Cuba Revolucionária liderada pelo Comandante Fidel entendeu a manobra, conforme se percebeu com a iniciativa da Tricontinental!
É evidente que a luta armada de libertação nacional levada a cabo pela Frente de Libertação Nacional (FLN) da Argélia, inspirou outros povos em África, como no caso das colónias de expressão portuguesa, mas em Angola, se o MPLA em ruptura (em antítese) e aprendendo com o exemplo argelino, nos ambientes urbanos levou a cabo uma luta clandestina evitando confrontos sangrentos, a tese colonial-fascista portuguesa esmerou-se nos seus esforços de inteligência e de domínio, recriando etno-nacionalismos afins e uma área “cinzenta” de influência por via da “assimilação” que aproveitou os conceitos da guerra de contrassubversão levada a cabo pelos círculos mais reaccionários dos instrumentos de poder do estado colonial francês na Indochina e na Argélia!…
As redes “stay behind” da NATO influenciaram na guerra colonial e tiveram motivações antes, durante e depois do golpe do 25 de Novembro de 1975 em Portugal!
… O MPLA só protagonizou um curto período de guerrilha urbana em Luanda, em 1975, ao ter de preparar a Proclamação da Independência a 11 de Novembro de 1975 sem empecilhos de intervenções externas filtradas pelos interesses do império anglo-saxónico e essa saga com curto lapso de tempo, foi a única que se aproximou dos episódios sangrentos da guerrilha urbana que a FNL da Argélia se viu obrigada a fazer!…