sexta-feira, 5 de maio de 2023

Angola | JAMBA E MUNHANGO CAPITAIS DE ANGOLA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Poder Legislativo em Angola é um contrapeso ao poder do Presidente da República que, em nome da estabilidade política, é o Titular do Poder Executivo e chefe supremo das Forças Armadas. Exerce esses poderes na condição de cabeça de lista do partido que ganhou as eleições. O Grupo Parlamentar do MPLA compreendeu bem este quadro político e o seu líder, Virgílio de Fontes Pereira, anunciou publicamente a abertura das e dos deputados do MPLA para o diálogo a todos os níveis da sociedade e particularmente no parlamento. 

Só os distraídos não perceberam que o MPLA tinha acabado de contribuir de uma forma nunca vista, para o aprofundamento da democracia e dar voz a todos num órgão de soberania eleito, que é considerado a Casa da Democracia ou a Casa das Leis. A UNITA respondeu ao diálogo abrangente e irrestrito proposto pelo MPLA, com um ultimato. Na política, os ultimatos são armas das ditaduras. E matam o pluralismo. Algo de novo? Nem pensar. O Galo Negro tem um longo historial de crimes contra a democracia, a unidade e a reconciliação nacional.

António Vakulukuta, Jorge Sangumba, Tito Chingunji ou Wilson dos Santos fizeram tudo para que a UNITA aderisse à democracia, à unidade e reconciliação nacional. Pagaram com a vida. Foram assassinados cobardemente por Jonas Savimbi. José Ndele, um campeão do diálogo e da unidade, face aos hediondos crimes abandonou o chefe. Tal como Miguel Nzau Puna e Tony da Costa Fernandes, fundadores da UNITA. Ou o jurista Paulo Tjipilica. Posso incluir na lista Jerónimo Wanga, um angolano de elevadíssimo nível e que foi ministro da Educação e Cultura no Governo de Transição. Savimbi traiu-o duplamente.

Um dia fui ao Bailundo e encontrei Jerónimo Wanga em casa do meu amigo Moura que era gerente de um banco na vila. Nós éramos pela “independência total e completa”. Ele defendia uma federação. Entendia que se Portugal tinha dado o passo de considerar Angola um Estado, devia dar o passo seguinte: Estado Federado, com governo próprio e ampla autonomia. Nem de propósito, Jonas Savimbi na sua primeira entrevista depois do 25 de Abril de 1974 (no mês de Junho), também defendeu o federalismo respondendo à proposta do Presidente Spínola, que foi rapidamente recusada pelo Movimento das Forças Armadas (MFA).

Jerónimo Wanga aderiu à UNITA muito por causa do federalismo. Mas levou logo com uma traição. Jonas Savimbi uniu-se aos independentistas apoiados pela Rodésia (Zimbabwe) e África do Sul. E assim nasceu o “Movimento dos Brancos”. Traição. Wanga dizia que o líder tinha acabado de optar pelas minorias traindo a maioria negra. Nas eleições a UNITA estaria condenada à derrota. 

A outra traição foi a proclamação da República Popular Democrática de Angola, pela FNLA e a UNITA, no Uíge e no Huambo. Jerónimo Wanga foi contra o abandono dos ministros e secretários de Estado do Governo de Transição. Se a FNLA saísse, a potência colonial que assumisse os ministérios abandonados: Interior (Ngola Kabangu), Saúde e Assuntos Sociais (Samuel Abrigada), e Agricultura (Mateus Neto). Segunda traição.

O abandono foi uma fuga às eleições. UNITA e FNLA sabiam que não tinham implantação nacional. Jonas Savimbi sabia que o “Movimento dos Brancos” já tinha poucos votantes. A solução foi violar o Acordo em Alvor. Competia ao Governo de Transição: A) Zelar pela boa condução do processo de descolonização até à Independência. B) Superintender a Administração Pública, assegurando o seu funcionamento e promovendo o acesso dos cidadãos angolanos a postos de responsabilidade. C) Conduzir a política interna. D) Preparar e assegurar a realização de eleições gerais para a Assembleia Constituinte de Angola. 

O alto-comissário e membro do Colégio Presidencial, Silva Cardoso, um mês depois da tomada de posse do Governo de Transição declarou: “Não é possível realizar as eleições gerais”. Violou gravemente o Acordo de Alvor. Foi imediatamente apoiado por Johnny Eduardo Pinnock, da FNLA. Savimbi ordenou a José Ndele que apoiasse o alto-comissário e líder do Colégio Presidencial. Mas ele optou pelo silêncio. Dos governantes da UNITA só António Dembo confirmou a “ impossibilidade” das eleições. Assim a potência colonial, FNLA e UNITA puseram em causa todo o processo de descolonização! Sem a Assembleia Constituinte não existia Constituição da República. Nem Presidente e Governo saídos de eleições gerais.

As eleições gerais deviam ocorrer em Outubro e os deputados constituintes tomavam posse antes do dia 11 de Novembro de 1975. O primeiro Governo de Angola independente tinha de ser apoiado pela maioria dos deputados. Quem ganhasse as eleições governava sozinho ou em coligação. Portugal deu a machadada final com o Decreto-Lei N.º 458-A/75, de 22 de Agosto, que suspendeu o Acordo de Alvor. Motivo invocado: FNLA e UNITA tinham abandonado o Governo de Transição.

No dia 11 de Novembro de 1975, Agostinho Neto proclamou a Independência Nacional nascendo assim a República Popular de Angola. Ngola Kabangu proclamou no Uíge a República Popular Democrática de Angola e Jonas Savimbi fez o mesmo na cidade do Huambo. Em 1978, a FNLA declarou extinta a república proclamada. 

Jonas Savimbi aproveitou para se “proclamar” presidente da República Popular Democrática de Angola. Quando os sul-africanos criaram o acampamento militar da Jamba ali foi instalada a “capital” com um sinaleiro a regular o trânsito. Uma marca de paródia na tragédia das fogueiras onde o criminoso de guerra queimou vivas as elites femininas do Galo Negro. O regime racista de Pretória e o estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) reconheceram a “república” de Savimbi. 

A Jamba, capital da República Popular Democrática de Angola foi palco do Jamboree Internacional Democrata, em 1985, no qual participaram os grupos armados financiados pela CIA:  Unidade Islâmica Mujahidin (Afeganistão), Renamo (Moçambique), “contras” de vários países da América Latina e particularmente da Nicarágua e os Khmers Vermelhos(Camboja).

 Em 1999, Jonas Savimbi transferiu a capital da República Popular Democrática de Angola para o Munhango. A fantochada acabou em 2002 com a morte do criminoso de guerra. Mas os fantoches continuam. E em resposta ao diálogo aberto e abrangente proposto pelo Grupo Parlamentar do MPLA, fizeram um ultimato. Às políticas que visam reforçar a unidade e reconciliação nacional respondem com terrorismo urbano e sabotagens. 

* Jornalista

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