domingo, 18 de junho de 2023

“Humilhação, revolta e injustiça”: da urgência de um hospital a uma sala de tribunal

PORTUGAL

Olá,

As urgências de um hospital, onde vamos quando estamos vulneráveis, deviam ser locais seguros. Mas nem sempre o são: não o foram para Carlota, Ana e Joana. Foram sujeitas a abusos sexuais por um enfermeiro: ele drogava-as, paralisando-as, para depois as violentar sexualmente. Aconteceu em 2009. Duas delas apresentaram queixa-crime e o processo judicial arrastou-se por sete anos.

Cinco meses antes de Carlota ser sexualmente violentada, uma outra mulher tinha apresentado reclamação, mas o conselho clínico, lê-se no processo judicial, considerou a conduta do enfermeiro “respeitadora e sem falhas”. A maioria da equipa clínica recusou-se a acreditar que praticava abusos, até ser condenado pela Justiça. O julgamento foi longo, durou três anos, e foi uma verdadeira via sacra para as três mulheres: tiveram de reviver os traumas, de lidar com tentativas de assassinato de carácter, de descrebilização.

Chegaram até a ser vaiadas, perseguidas e maltratadas em cada audiência do julgamento por quem apoiava o enfermeiro na cidade alentejana. Houve quem lhes cuspisse para cima. Não desistiram, foram até ao fim, mas a Justiça soube-lhes a pouco, foi “benevolente”. O enfermeiro foi condenado a cinco anos de prisão com pena suspensa e a pagar uma indemnização de 12 mil euros. Uma imagem que ainda hoje marca a vida destas mulheres é a de ele estar sentado na sala de audiências a rir-se, como se “estivesse numa esplanada”, enquanto elas testemunhavam. O agressor sexual condenado poderá regressar em breve aos corredores de um hospital.

Como lida a Justiça com sobreviventes de abusos? Contamos a história destas três mulheres.

Este é o tema desta segunda parte da Investigação74 Paredes Frágeis em Lugares de Dor, da Ana Patrícia Silva com Cláudia Marques Santos, em parceria com o jornal Público e apoiada pela bolsa de jornalismo Gender and Equality do Pulitzer Center.

Na edição desta semana temos ainda a crónica de Filipe Vargas.

Bom fim de semana.

Ricardo

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