quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Dia da habitação: quer tenha um crédito ou seja inquilino, vai ter notícias frescas


João Pedro Barros, editor online | Expresso (curto)

Bom dia,

Às vezes, o diabo está nos detalhes. O Governo vai aprovar e explicar hoje a espécie de moratória para os créditos à habitação que tem vindo a negociar nos últimos dias, e cujas linhas gerais explicámos há uma semana. O mecanismo é relativamente simples: quem optar por esta solução vai ver de imediato a taxa de juro associada ao crédito baixar, ficando o valor da prestação fixo durante dois anos, atenuando a tempestade da Euribor. Após este período, de forma gradual, a redução será compensada, altura em que se esperam marés mais tranquilas.

É uma medida com custo zero para o Orçamento do Estado e para os bancos – e por isso muitos consideram que é tardia –, mas na qual há vários detalhes que importa conhecer. Qual será a percentagem da taxa de juro a pagar mais tarde? Será para todos ou apenas para famílias com elevada taxa de esforço e/ou rendimentos baixos? Servirá apenas para habitação permanente? Como será faseado o pagamento da percentagem a pagar mais tarde?

De acordo com o “Público” e o “Correio da Manhã” de hoje, as prestações passarão a ter um indexante de 70% da Euribor e os 30% de “desconto” durante estes dois anos vão começar a ser pagos quatro anos após o final do período de fixação. A adesão ao mecanismo pode ser pedida até ao fim do primeiro trimestre de 2024 e os bancos vão ter até 15 dias para responder.

Outra medida que deve ser aprovada no Conselho de Ministros no Museu de Leiria – distrito ao qual o executivo leva agora o programa Governo Mais Próximo – é o alargamento da bonificação dos juros, o que pode ser feito através dos critérios de acesso e/ou pelo aumento do valor. Mais uma vez, a maneira como a medida vai ser calibrada (para usar um termo caro a António Costa) irá definir a forma como vai ser recebida pela opinião pública e pela oposição: o apoio atual, que funciona desde maio, materializa-se num máximo de 720 euros por ano e é limitado a empréstimos até 250 mil euros, sem incumprimento, para mutuários com uma taxa de esforço a partir de 35%, com rendimento até ao sexto escalão de IRS (38.632 euros) e património em depósitos ou produtos financeiros inferior a cerca de 30 mil euros. São muitas condicionantes e, por isso, o Governo já veio dizer que o impacto da medida ficou aquém do esperado, esperando-se agora uma simplificação.

Também no apoio às rendas – que atualmente pode ir até 200 euros mensais e chegou a 185 mil famílias – estão previstas medidas: o atual mecanismo, que vigora até ao final de 2028, é também limitado a pessoas com uma taxa de esforço acima dos 35% e rendimentos coletáveis até ao 6.º escalão de IRS. Espera-se um aumento do apoio e um alargamento deste crivo, para além de uma clarificação dos rendimentos que devem ser considerados no cálculo.

O travão às rendas é outra questão na ordem do dia, mas ainda não deve ser definido hoje, visto que a ministra da Habitação ainda vai ouvir várias associações do sector, as centrais sindicais e a Deco. De acordo com a inflação, o INE calculou em 6,94% o valor de referência para o aumento das rendas em 2024, sendo que, para este ano, o Governo definiu um limite de 2%. Costa já confirmou que o mecanismo vai voltar a existir, resta saber qual vai ser a fasquia.

O tema da habitação também vai estar em destaque no Parlamento, que volta a discutir o pacote Mais Habitação, depois do veto do Presidente da República, em agosto. No entanto, o desfecho é mais do que previsível: a maioria absoluta do PS vai aprovar o diploma, sem alterações, e obrigar Marcelo a promulgá-lo. As medidas mais polémicas são o arrendamento coercivo, a criação de uma contribuição especial sobre o alojamento local e a suspensão do registo de novos alojamentos fora dos territórios de baixa densidade.

A habitação vai dominar as manchetes e o debate político: conte com o Expresso para fazer todas as contas e perceber qual vai ser o efeito no seu bolso. E, já agora, se está no Porto, fique a saber que a digressão dos 50 anos do nosso jornal chega à cidade, com vários eventos ao longo do dia e uma conferência sobre sustentabilidade, na Universidade Católica, às 17h.

OUTRAS NOTÍCIAS

Assembleia-geral da ONU – O segundo dia ficou marcado pelas intervenções de Zelensky e Lavrov na reunião do Conselho de Segurança sobre a Ucrânia. O Presidente ucraniano propôs limitar o poder da Rússia como membro permanente do órgão e com direito de veto. O ministro dos Negócios Estrangeiros russo acusou “os nazis [ucranianos]” de passarem “à frente na fila para a adesão” à União Europeia e o Ocidente de recorrer aos princípios da ONU para defender as suas “necessidades geopolíticas paroquiais” e de interferir nos assuntos internos da Ucrânia desde o fim da União Soviética.

Contraofensiva – Kiev está a receber as armas de que precisa para vencer? Há expectativas desajustadas? A resposta é complexa.

Nagorno Karabakh – Após o anúncio de um cessar-fogo entre azeris e arménios, há negociações marcadas para hoje entre as partes, sob mediação das forças russas destacadas na região, anunciou Vladimir Putin, agora a vestir o fato de pacifista.

Alterações quê? – O primeiro-ministro britânico anunciou ontem que o Reino Unido vai afrouxar as metas de transição para a neutralidade carbónica, argumentando com o custo para as famílias para desistir de algumas medidas e adiar a aplicação de outras.

Tempestade Perfeita – PJ esteve em Tancos, no Alfeite, na base de Beja e em outras cinco infraestruturas militares à procura de pistas.

Covid-19 – Portugal está com uma média diária de 10 óbitos e 300 novos casos, mas, de acordo com o epidemiologista Carmo Gomes, os números estão muito subestimados, “porque a maior parte das pessoas agora faz um autoteste e não reporta".

Greve na TSF – Reportagem: “Nós vemos TSF nestes cartazes todos, mas é o jornalismo que está no prego”.

Chumbo total – Ontem, no Parlamento, o PS chumbou todas as propostas de redução do IRS do PSD. Apenas foi aprovado uma recomendação do Livre, que pede mais medidas de combate à evasão fiscal.

Debates quinzenais adiados? – O regresso pode acontecer apenas em dezembro, porque a moção de censura do Chega inviabilizou o agendamento feito para a próxima semana e, em outubro, começa o debate do Orçamento do Estado. PSD e IL acusam PS e o Governo de empurrar o assunto com a barriga.

A caminho do OE – O Governo inicia na próxima semana as reuniões bilaterais com os parceiros sociais. CGTP e UGT têm encontro marcado com António Costa na segunda-feira, conheça as propostas que vão apresentar.

Medidas de apoio aos jovens – Vale a pena ler: seis jovens olham para as medidas apresentadas pelo Governo e concordam num ponto: são “insuficientes” para o cenário atual.

Eleições na Madeira – Reportagem: o PS desistiu de ganhar?

Autoeuropa – Após a paragem forçada a 11 de setembro, devido à falta de uma peça, a atividade é retomada a 2 de outubro, mais de um mês antes do previsto.

Queta fica na NBA – Após ter sido dispensado pelos Sacramento Kings, Neemias Queta foi oficializado nos Boston Celtics.

Noite negra na Champions – Duas derrotas caseiras para as equipas portuguesas: do Benfica frente ao Red Bull Salzburgo (0-2) e do SC Braga frente ao Nápoles (1-2). Hoje é dia do Sporting na Liga Europa, frente aos austríacos do Sturm Graz (20h, com transmissão na SIC).

FRASES

Tenho tanto confiança em Putin como no Ocidente.
Recep Erdogan, Presidente da Turquia, em declarações ao canal de televisão americano PBS, citado num artigo do correspondente do Expresso em Ancara, José Pedro Tavares.

Somos era o verbo definidor, somos isto. Fado, bacalhau e futebol. E, talvez para Marcelo Rebelo de Sousa, sejamos isto. Não somos isto. Já passámos disto há muito tempo e não me revejo na certificação identitária. Há 50 anos talvez fizesse sentido.
Clara Ferreira Alves, na crónica “Marcelo, ou Dâmaso Salcede”, publicada no Expresso

As mulheres fazem mais de 75% das tarefas domésticas, a diferença salarial é inqualificável e a estrutura fá-las sentir culpadas.
Fernanda de Almeida Pinheiro, bastonária da Ordem dos Advogados, em entrevista ao Expresso

Esta guerra [na Ucrânia] já está a causar sofrimento ilimitado. Não há alternativa ao diálogo, à diplomacia e a uma paz justa. Os ataques a civis e a infraestruturas civis devem parar imediatamente.
António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, numa mensagem clara à Rússia

O PSD quer dar mais liberdade financeira às famílias, mas o Governo não quer e não deixa. Este debate é a derradeira oportunidade da maioria socialista dizer ao país se quer ou não baixar impostos já em 2023. O PS aceita ou não reduzir impostos, deixando-se de politiquices?
Joaquim Miranda Sarmento, líder parlamentar do PSD, no debate sobre a proposta de redução do IRS do partido

PODCASTS A NÃO PERDER

As sugestões da equipa multimédia do Expresso:

A Autoeuropa resiste à paragem? A fábrica de Palmela vai retomar gradualmente a produção a partir de outubro. O impacto na economia é inevitável. Ouça a análise no podcast Money Money Money;

Bárbara Bulhosa: “Os hábitos de leitura são maus e a concorrência é brutal, mas não podemos desistir. Dizer 'os livros são ótimos' não resulta” A fundadora da editora Tinta-da-China é a convidada de Bernardo Ferrão no podcast Geração 70;

Ricardo Araújo Pereira discorre sobre casamentos, tragédias e mitos gregos. Telefona ainda para o Brasil para falar com a professora brasileira Verena Alberti - autora de um livro que o absolveu de um processo em Tribunal - sobre o que distingue animais, humanos e deuses. Oiça o segundo episódio de Coisa Que Não Edifica Nem Destrói.

O QUE EU ANDO A OUVIR

Não sei exatamente o que provocou este regresso, mas voltei a ouvir “Kid A”, dos Radiohead (e o disco gémeo, “Amnesiac”). Talvez tenha sido só nostalgia e a memória dos dois fantásticos concertos da banda que vi em 2002, lá bem na frente da plateia do Coliseu do Porto – algo provavelmente irrepetível num momento em que os festivais “esmagam” os concertos em sala. E que só foi possível porque os britânicos deram-se ao luxo de fazer uma minidigressão na Península Ibérica para testar as canções do que viria a ser “Hail to the Thief”.

Quando “Kid A” foi lançado tinha 19 anos: lembro-me de ler que o álbum já se tinha tornado uma anedota na indústria porque era sucessivamente adiado. Depois foi parar à Internet (numa altura o Napster era a referência) e suspeitou-se que era uma estratégia da editora. Após o lançamento, o debate dividiu-se em dois pólos: os que achavam o disco uma obra-prima e os que pensavam que era um exercício de pretensiosismo e um conjunto de citações pouco subtis a vários nomes da música eletrónica, do krautrock e até do jazz. Eu, que na altura nem tinha ainda percebido muito bem “OK Computer” (1997), gostei do disco desde o primeiro momento.

Voltei a ler imenso sobre o longo processo de composição que quase fez implodir os Radiohead. A maior parte das canções da banda tinha, até então, três guitarras em simultâneo e há uma frase de Ed O´Brien, à revista “Q”, que é exemplar: "Sou guitarrista e de repente, vejam bem, não há guitarras nem bateria em algumas canções”. Imagina-se que o ambiente no balneário não era o melhor.

Voltando a ouvir o disco com alguma distância, não tenho dúvidas de que é uma das mais bem sucedidas reinvenções da história do rock and roll: os riscos eram enormes, mas “Kid A” é um disco denso, misterioso, com estruturas melódicas estranhas e letras bizarras – e, ao mesmo tempo, sente-se que aquilo é Radiohead e que, por trás de cada faixa, há sempre uma canção no sentido mais puro da palavra, por muito que tenham tentado fugir ao verso–refrão–verso–refrão–ponte–refrão.

Surpreendeu-me também ler que “Kid A” se tornou um case study para a indústria: foi o primeiro álbum a ser maioritariamente promovido na Internet (os Radiohead recusaram lançar singles e dar entrevistas) e a “Time” escreveu uns anos depois que é o disco mais estranho de sempre a vender mais de um milhão de cópias. Para quem nunca ouviu, eis a faixa título, que até foi banda sonora de um episódio de “Sopranos”: foi um daqueles momentos em que achei que tudo estava no sítio certo.

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