quinta-feira, 12 de outubro de 2023

A Buldózer dos Flagelados de Gaza -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Gaza é uma língua de terra da Palestina entre Israel, Egipto e o Mediterrâneo. A faixa tem dez quilómetros de largura (em alguns pontos menos) e 40 de comprimento o que dá 350 quilómetros quadrados. O último censo realizado pela ONU apurou dois milhões e 300 mil habitantes. Graças aos Acordos de Oslo, em 28 de Setembro de 1995, assinados pelo Presidente Yasser Arafat (Organização de Libertação da Palestina) e Yitzak Rabin, primeiro-ministro de Israel, foi possível pôr em marcha um processo de paz que culminava com a criação do Estado da Palestina.

Yitzak Rabin desenvolvia políticas de aproximação entre judeus e palestinos, desde 1990. Pouco depois de assinar os Acordos de Oslo, o primeiro-ministro de Israel foi assassinado no dia 4 de Novembro de 1995, por sionistas em Telavive, após participar numa manifestação gigante, a favor da paz.  O processo continuou sem ele. Mas só dez anos depois, em 2005, Israel desmantelou os colonatos em Gaza e retirou as tropas que ocupavam a Palestina. Um ano depois, o Hamas ganhou as eleições locais. O movimento assumiu a gestão da Faixa de Gaza e Israel cercou o território por terra, mar e ar. 

Em Janeiro de 2006, o Hamas venceu as eleições parlamentares na Palestina. O movimento ficou com 76 dos 132 deputados. A OLP elegeu 43. O bloqueio de Israel a Gaza mudou. O território foi transformado numa imensa prisão a céu aberto, como definiu a Human Rights Watch no seu relatório de 2021. Esta situação dura há 17 anos. Mais de dois milhões e meio de pessoas são prisioneiras no seu país. Israel era o sargento dos EUA no Médio Oriente. Passou a ser também o carcereiro. E desde o passado sábado, também o genocida. Os palestinos da Faixa de Gaza estão a ser exterminados. Washington deu a ordem: Matem-nos! Londres, Paris, Roma e Berlim confirmaram: Matem-nos! E os sionistas matam.

O bloqueio de 17 anos levou a economia da Faixa de Gaza ao colapso. O governo de Israel aprendeu bem a lição dos nazis de Hitler. A insuspeita ONU, do rato de sacristia António Guterres, revelou que quase 70 por cento da população da Faixa de Gaza vive muito abaixo do limiar da pobreza. O Programa Mundial Alimentar revelou que 63 por cento da população da Faixa de Gaza vive em insegurança alimentar.

Mais de um milhão e meio da população de Gaza têm menos de 19 anos. Jovens presos no seu país. Sem presente nem futuro. Miséria. Fome. Desemprego. Foram eles que alugaram uma máquina buldózer, rebentaram o muro da prisão e foram matar em Israel. Atacaram civis indefesos. Muitos foram raptados. Israel já bombardeou e destruiu 12 unidades de saúde em Gaza, denunciou a Organização Mundial de Saúde (OMS). A ONU fala em várias escolas e prédios de habitação destruídos à bomba. Milhares de mortos e feridos até onde for preciso.

Terrorismo puxa terrorismo. Sei do que falo. Vi o que aconteceu no dia 15 de Março de 1961 no Uíge. Em Angola, terroristas nazis assumiram as administrações e postos administrativos. Para eles, governar e administrar era matar negros. Em Israel é igual. O governo de Telavive é terrorista. Itamar Ben-Gvir, nazi, condenado num Tribunal israelita por terrorismo, é o ministro da Segurança Nacional de Israel. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu está acusado de corrupção. Quer destruir o Estado de Direito colocando o Poder Judicial às suas ordens. Acaba de ameaçar todos os países do Médio Oriente. Quer matar, matar, matar. 

O ocidente alargado serve-se dos nazis de Kiev e de Telavive. A nazi que manda na União Europeia anunciou o corte de ajuda à Palestina. Logo a seguir o governo nazi de Israel anunciou o cerco total à Faixa de Gaza com corte de água, energia, combustíveis e alimentos. A ONU guincha: Isso é proibido! As grandes potências europeias e o estado terrorista mais perigoso do mundo roncaram grosso: Matem-nos! Para submeter o Médio Oriente Biden, Blinken e Austin mandaram sucata de guerra para a região. Vem aí uma guerra mortífera.

Ninguém leu o relatório da Human Rights Watch de 2021 onde se afirma: “Impedir que os palestinos da Faixa de Gaza se movimentem livremente destaca a cruel realidade do apartheid e da perseguição em que vivem milhões de palestinos”. A insuspeita ONU revela que ao longo de 17 anos Israel provoca “apagões” permanentes o que torna a vida dos palestinos num inferno. A partir de ontem também ficaram sem água, combustíveis e alimentos.

A ONU falou: “Mais de 600 mil refugiados vivem em oito acampamentos abarrotados na Faixa de Gaza”. Os refugiados não contam para o número de habitantes. Isto quer dizer que na imensa prisão a céu aberto vivem três milhões de pessoas. Os nazis de Telavive hoje atingiram o máximo do cinismo e crueldade. O primeiro-ministro Netanyahu aconselhou aos milhões de habitantes de Gaza a fugirem para o Egipto: Partam imediatamente. Nós vamos ocupar a Palestina. Mas mandou fechar a fronteira!

O ocidente alargado ouviu as ameaças aos países da região. Ouviu o conselho dado aos palestinos: Deixam a vossa terra e vão para o Egipto! Ninguém condenou. Pelo contrário, o coro de apoios aumentou e o tom foi ainda mais elevado. Israel tem o direito a defender-se. E se a Federação Russa aconselhar os ucranianos a fugirem para a Polónia? Os russos e russófonos da Ucrânia não têm o direito a defender-se? Pensem bem antes da resposta.

Os miúdos de Gaza que alugaram uma máquina buldózer para derrubarem o muro da prisão. Têm o ocidente alargado contra eles. Mas não estão completamente sós. Kadirov pediu ao mundo muçulmano para ajudar os prisioneiros de Gaza, vítimas de genocídio. O Presidente da Turquia, Recep Erdoğan, pronunciou-se contra os genocidas. A Arábia Saudita manifestou o seu apoio ao povo da Palestina O líder supremo do Irão, aiatola Ali Khamenei, beijou as mãos aos miúdos que alugaram a máquina buldózer.  E eu, como sempre, estou a favor da Libertação da Palestina. Enquanto for preciso. Ao mesmo tempo choro os mortos dos dois lados, porque são Humanidade. Sangue humano.

Ainda eu mal andava e o estado terrorista mais perigoso do mundo despejou bombas atómicas em Hiroxima e Nagasaki. Aprendi a falar num clima de ódio contra os negros. Cresci num regime de apartheid. Apaixonei-me por uma menina do Candombe e as milícias, em Março de 1961, foram ao bairro e mataram quem apanharam pela frente. Acabaram as farras de sábado à noite. Perdi a minha amada. Cresci no mesmo clima. Escolhi o lado dos sofredores e oprimidos. Sofri e fui oprimido. Guerra e mais guerra. Quando pensava que podia ler os meus livros favoritos e acabar três romances que ando a escrever há 50 anos, de novo a guerra dos nazis. As prisões. A tortura. O apartheid. Que ninguém me deseje longa vida!

* Jornalista

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