Artur Queiroz*, Luanda
O edifício da Comunicação Social em Gaza foi destruído por Israel num bombardeamento aéreo há alguns anos. Silêncio do ocidente alargado. Deve ter sido o acto de censura mais grave que alguma vez aconteceu na Terra. Israel mata jornalistas na Palestina. Silêncio. Os aviões de guerra de Israel destroem prédios de habitação em Gaza e na Cisjordânia. Silêncio. Destroem mesquitas (igrejas). Silêncio. Crianças são assassinadas nas escolas durante os bombardeamentos. Silêncio. Há dois dias os flagelados de Gaza rebentaram os muros do campo de concentração criado por Israel e entraram a matar. Terrorismo contra o terrorismo. Barbárie contra a barbárie. Selvajaria contra a selvajaria.
O ocidente alargado reagiu. Os prisioneiros evadiram-se do campo de concentração que é Gaza! Indisciplinados. E matam, imitando os sequestradores. Que horror! Biden, Blinken e o general assassino Lloyd Austin mandaram logo um submarino e “rambos” para o Mediterrâneo Oriental. É preciso matar, matar, matar. A União Europeia cortou os fundos de apoio à Palestina. Morram à fome. Desapareçam da face da Terra. Não atrapalhem mais a nossa paz sangrenta e as humilhações que vos oferecemos. O grave é que esses governos de assassinos disfarçados de anjos pensam que isto pode ser assim eternamente.
Os governos ocidentais entraram no alarido do costume: Morte aos terroristas do Hamas! E os do Hamas gritam: Morte aos terroristas de Israel. Aa forças são desiguais mas as mortes são iguais. Cada civil que morre, morremos também. Um professor ensinou-me que só existimos porque existem os outros. E a forma que temos para mostrar a nossa existência é comunicar. Ando a informar há quase 60 anos entre milhares de cadáveres, desde o Cazenga à Nicarágua, do Triângulo do Tumpo a Bagdade, Ramadi ou Rutbah. O Iraque foi a minha última comunicação em situação de guerra. Nunca vi tantos mortos. E eu a comunicar inutilmente.
Tenho uma boa notícia. A Humanidade tem em Angola o expoente máximo da existência. Um Povo que criou muitas línguas. É o estado supremo do amor ao outro. Comunicamos em Kikongo, Kimbundu, Tchokwe, Umbundu, Mbunda, Kwanyama, Nhaneca, Fiote, Nganguela, Herero (Otjiherero). Os Khoisan têm a sua Língua com três famílias linguísticas: Khoe, Tx’a e Taa. Entre Gabela e Kibala temos a Língua Ngoya. Os especialistas dizem que é um dos 50 dialectos angolanos. E temos o Português. Não foi por falta de reconhecimento do outro e de meios para comunicar que os sicários da UNITA preferiram ouvir os racistas sul-africanos.
A maka da comunicação está mesmo muito acesa. Alguém pôs a circular que Hermínio Eascórcio foi “director” da Sonangol. Falso. Foi o PCA. A Sociedade Nacional dos Combustíveis de Angola (Sonangol) nasceu como Empresa Pública da República Popular de Angola. Ainda não existiam os conselhos der administração. Agostinho Neto e Carlos Rocha (Dilolwa) foram a Cabinda conferenciar com os patrões da Canida Gulf. O contrato que tinham com o Governo Português era de favor. Se queriam continuar, tinham que pagar. Aceitaram. A empresa passou a financiar o Orçamento-Geral do Estado, na totalidade!
Em Luanda, os maoistas faziam um alarido ensurdecedor. Queriam expulsar a empresa. A turma de Nito Alves já estava a preparar o golpe e também se opôs. O petróleo é do povo, gritavam os nitistas. Abaixo a burguesia! Queriam eles dizer, abaixo Agostinho Neto e o seu Governo. Após as negociações com a Chevron, foi decidido criar a Sociedade Nacional dos Combustíveis de Angola (Sonangol).
O primeiro director-geral (PCA)da empresa foi o engenheiro/economista/génio da gestão Percy Freudenthal, que tinha na sua equipa Desidério Costa e Armando Guerra. Não tenho a certeza mas nos meus apontamentos consta que Desidério Costa substituiu o primeiro director-geral quando este foi para Portugal. Hermínio Escórcio foi o director-geral seguinte. Portanto era o “patrão” da Sonangol, como é o Pai Querido (Martins) e foi o engenheiro Manuel Vicente. A diferença é que Escórcio não ficou multimilionário.
Antes da Independência Nacional, Hermínio Escórcio vivia numa casinha do Estado na Vila Alice porque era funcionário do Laboratório de Engenharia de Angola antes de ser preso pelos esbirros da PIDE. Mudou para o elegante Bairro de Alvalade. Uma “extravagância” na sua vida, onde nunca entrou a ostentação e o novo-riquismo. Muito menos a corrupção.
Ninguém referiu que Hermínio
Escórcio organizou o primeiro Festival de Cultura após a Independência
Nacional. Uma iniciativa da Presidência de Agostinho Neto. Deu-me a missão de
contratar músicos portugueses e espanhóis. De Portugal Zeca Afonso era
obrigatório. De Espanha tinha que ser Juan Manuel Serrat. Ambos andavam
Face à impossibilidade de Juan
Manuel Serrat falei com os meus amigos para indicarem outro artista. Santiago
Alvarez, dirigente do Partido Comunista e que me ajudou na reportagem sobre as
guerrilhas antifranquistas, aconselhou-me o Bibiano, cantor galego quer tinha
acabado de lançar o disco “Estamos Chegando ao Mar”. Telefonei-lhe e no dia
seguinte estava
Zeca Afonso apresentou no festival de Luanda, dois temas do futuro disco Enquanto Há Força, “Eu o Povo” (Moçambique) e “O Homem Novo” (Angola). “Eu o Povo” é um poema de Mutimati Barnabé João (António Quadros). “O Homem Novo” é de Zeca Afonso, trova dedicada ao MPLA: “Imperialismo não passará! Colonialismo não passará! Veio das matas o homem novo do MPLA!” Em homenagem a David Moisés (Ndozi) juiz no Tribunal que julgou os mercenários incluiu esteve verso: Um Guerrilheiro Faz um Juiz!
Ninguém cobrou “caché”. Foram todos manifestar a sua solidariedade para com a República Popular de Angola. A camarada Rubina foi cicerone desses músicos. Um pormenor. Santiago Alvarez era um dos comandantes das guerrilhas antifranquistas na Galiza. Minha tia-avó Tereza acolhia os combatentes na casa dos meus antepassados. Era ela que tratava dos víveres e cozinhava para os guerrilheiros. Está sepultada no Cemitério Novo (Sant’Ana) em Luanda.
Hermínio Escórcio foi um dos impulsionadores do Festival Nacional de Cultura. Além de director-geral (hoje PCA) da Sonangol. Não apenas “director”. Haja rigor.
*Jornalista
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