sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

“ACABOU A FANTASIA” DA DEMOCRACIA ISRAELITA

Um novo governo israelita tomou posse no primeiro dia de 2023. É liderado por Benjamin Netanyahu e é o mais extremista desde a fundação do Estado de Israel, em 1948. O político acusado dos crimes de abuso de confiança, fraude e suborno abraçou a extrema-direita para formar um executivo de coligação que lhe permita evadir-se à justiça e avançar com a colonização da Palestina. Nunca a extrema-direita teve tanta influência governativa na “única democracia no Médio Oriente”. 

Quais as consequências para os palestinianos e para a democracia israelita? O João Biscaia falou com cinco especialistas na questão israelo-palestiniana e na extrema-direita para tentar olhar um pouco para lá do presente. E há quem avise que já estamos a presenciar a Terceira Intifada. 

O certo é que a violência do Estado e dos colonos contra os palestinianos terá agora um aliado de peso no governo: Itamar Ben-Gvir, líder do partido ultranacionalista Poder Judaico, é agora ministro da Segurança Nacional. Mas há mais extremistas no novo executivo de Netanyahu. 

Numa outra coordenada, em Angola, o Estado continua sem dar resposta às necessidades da sua população, particularmente das mulheres e crianças. Marta Lança conversou com Sara Kambinga sobre como é ser mulher e mãe no país africano, de como sofrem todos os dias. As mulheres são forçadas a uma tripla jornada de trabalho, são vítimas de violência obstétrica, sofrem assédio no local de trabalho e vêem-se relegadas ao trabalho doméstico.

O ensaio desta semana, da autoria de Branko Marcetic, é sobre os Twitter Files, uma brutal fuga de informações que mostra os bastidores sobre a moderação de conteúdos da rede social e as suas ligações ao aparelho securitário norte-americano. Marcetic avisa: “A repressão política, se lhe for permitido ganhar um ponto de apoio, começa sempre nas franjas do que é aceitável, expandindo-se depois, devagar, para calar vozes dissidentes mas legítimas”.

Por fim, as crónicas desta semana são de Guilherme Trindade e, pelos Ladrões de Bicicletas, de Vera Ferreira.

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CNN recruta o pior belicista de Washington no instante em que ele deixa o Congresso

CaitlinJohnstone* | Substackc | # Traduzido em português do Brasil

A CNN quebrou a velocidade da luz em sua pressa para recrutar o ex-representante Adam Kinzinger para sua escalação de analistas no milissegundo em que ele deixou o congresso. 

Kinzinger, que antes de ser redistritado de sua cadeira na Câmara  recebeu  belas contribuições de campanha dos fabricantes de armas Lockheed Martin, Boeing, Raytheon e Northrop Grumman, foi indiscutivelmente o mais notório fomentador de guerra no Capitólio.

Ninguém no Congresso fez lobby tão agressivamente para iniciar a Terceira Guerra Mundial quanto Kinzinger fez no ano passado; ele tentou apresentar um projeto de lei autorizando uma guerra quente contra a Rússia se Moscou cruzasse as linhas vermelhas especificadas na Ucrânia, mas não conseguiu co-patrocinadores porque até mesmo seus colegas falcões do Congresso achavam que era muito insano. Ele foi a voz mais alta no governo dos EUA defendendo publicamente uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia nas primeiras semanas da guerra, uma ideia que foi criticada pela mídia de massa , pois necessariamente implicaria que os militares dos EUA abatessem aviões de guerra russos e uma guerra nuclear agressivamente tentada.

Kinzinger era um maníaco onicida tão demente em 2022 que, enquanto ainda estava no cargo, tornou-se membro oficial da fazenda de trolls on-line apoiada pelo império conhecida como "NAFO", fundada por um neonazista real a quem Kinzinger apoiou abertamente antes depois surgiram revelações das expressões de ódio do fundador pelos judeus carinho por Hitler . Enquanto ainda era um congressista em exercício, ele sinalizava trolls com hashtags  , convidando-os a invadir os comentários nas redes sociais de críticos da política externa dos EUA que se opunham ao seu belicismo psicopata.

Antes da guerra na Ucrânia, Kinzinger clamava pela reinvasão do Afeganistão imediatamente após a retirada das tropas americanas e enfurecia -se com a oposição pública à " guerra sem fim ". Antes disso, ele estava torcendo pelo assassinato do líder militar iraniano Qassem Soleimani por Trump,  pedindo intervencionismo dos EUA na Venezuela defendendo a guerra apoiada pelos EUA no Iêmen ,  pedindo a invasão da Síria e, geralmente, pressionando por mais guerra e militarismo em todas as oportunidades. Antes disso, ele estava ajudando o império a matar iraquianos como membro da Força Aérea dos EUA .

Kinzinger é um fomentador de guerra tão detestável online que eu mesmo o chamei de "a pior conta do Twitter que já existiu", muito antes de seu show na CNN ser um piscar de olhos.

Portanto, não é de admirar que uma rede de propaganda belicista o tenha agarrado no instante em que ele se tornou disponível, garantindo que seu belicismo receba a maior plataforma possível. Como Dave DeCamp, do Antiwar, brincou sobre a contratação da CNN: "Todas aquelas ligações para a Terceira Guerra Mundial devem ter lhe dado este trabalho."

A assimilação de Kinzinger na indústria de propaganda de guerra era tão previsível que Glenn Greenwald a incluiu em uma enquete no Twitter em outubro passado, perguntando ao público onde eles esperavam que sua carreira o levasse depois que ele deixasse o congresso, com a CNN sendo uma das opções. Como disse um seguidor do Twitter , "a porta giratória do congressista para o comentarista da mídia e para o lobista gira tão rápido em Washington que na verdade afeta a rotação da Terra em relação ao sol".

A guerra é a cola que mantém o império dos EUA unido e, para servir a esse propósito, requer propaganda de guerra sem fim. Os propagandistas de guerra não estão mais separados do massacre militar em massa sem fim que eles facilitam do que as pessoas que realmente puxam o gatilho, e vemos isso ilustrado na maneira como Kinzinger foi capaz de deslizar sem problemas de lançar bombas para aprovar legislação sobre o lançamento de bombas para fabricar consentimento para o lançamento de bombas.

Vivemos sob um império alimentado por mentiras e sangue humano, e impulsionado pelos esforços contínuos de vadias de guerra assassinas como Adam Kinzinger.

A CNN será perfeita para ele.

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UM CASO PARA NACIONALIZAR AS COMPANHIAS AÉREAS DOS EUA

Fora dos Estados Unidos, em países que vão da Argentina e Malásia à Finlândia e Fiji, as companhias aéreas operam essencialmente como um serviço público, não uma oportunidade para grandes salários de CEOs, escreve Sam Pizzigati. 

Sam Pizzigati * | Inequality.org | Consortium News | # Traduzido em português do Brasil

Para os ricos e poderosos da América, o ano novo está começando da maneira mais desfavorável. Milhões de americanos estão mais uma vez furiosos com a ganância e a ganância daqueles com os bolsos mais fundos.

Essa fumaça - de possíveis passageiros da Southwest Airlines e suas famílias - encheu os aeroportos durante a última semana de férias. Por uma boa razão. No auge dos feriados intensos, a Southwest estava  cancelando  60% dos voos diários da companhia aérea. Mais de 15.000 aviões da Southwest  nunca decolaram .

A forte dose de tempestade do final de dezembro certamente preparou o cenário para o colapso do feriado da Southwest. Mas a Southwest não pode culpar o frio, o vento e a neve pelo derretimento maciço da companhia aérea. Outras companhias aéreas forneceram, em meio ao mesmo clima de inverno, um serviço muito melhor.

Então, o que fez a Southwest? Os principais executivos da companhia aérea, apontam os analistas , passaram anos investindo pouco nas novas tecnologias necessárias. Um exemplo revelador: em novembro passado, uma geração na era eletrônica, os funcionários da Southwest reconheceram que a companhia aérea ainda estava entregando relatórios meteorológicos e de bagagem para pilotos e gerentes de portão em papel.

“Quase se tornou uma piada na empresa”, disse Lyn Montgomery, presidente do sindicato dos comissários de bordo da Southwest, “que não podemos fazer certas mudanças porque envolveriam tecnologia”.

Durante a crise da tempestade de férias, alguns funcionários da Southwest que telefonaram para obter instruções da companhia aérea ficaram em espera por mais de cinco horas,   relata  o The Dallas Morning News . Alguns até foram dormir com seus telefones – ainda em espera – ao lado de suas camas. Eles acordaram na manhã seguinte, para encontrar seus telefones ainda segurando.

Por que a Southwest não investiu em novas tecnologias?

Guiné-Bissau | PAIGC DENUNCIA ALEGADO “ESQUEMA DO STJ”

Militante pediu ao Supremo Tribunal de Justiça para não anotar as resoluções do último congresso do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde. Partido lamenta ação que pode afastar formação das eleições.

O X Congresso do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde foi realizado em novembro, depois de uma longa batalha judicial entre o partido e um dos seus militantes, Bolom Conté, que alegou irregularidades no processo de seleção dos delegados convocados para o encontro. 

Entretanto, o militante Bolom Conté intentou uma ação no Supremo Tribunal de Justiça (STJ) da Guiné-Bissau para este órgão "não considerar" as decisões tomadas no encontro magno da sua formação política. Carlos Pinto Pereira, do coletivo dos advogados do PAIGC, denunciou a situação à DW África:

"Se ainda não há um pedido de anotação, que sentido faz apresentar um pedido em sentido contrário?", questiona o advogado.

"E está lá pendente e não sabemos à espera de quê, quando aquilo que nós pretendemos (...) é que [o STJ] se limite a cumprir aquilo que a lei diz, que é fazer a anotação do que lhe for solicitado pelo partido, em resultado do seu congresso e mais nada".

Carlos Pinto Pereira, que garante que o pedido de anotação será feito na próxima semana, diz que há uma intenção clara de impedir o PAIGC de participar nas próximas eleições legislativas, marcadas para 04 de junho próximo. "Se o Supremo Tribunal de Justiça não anotar, estará aqui a criar condições para amanhã vir dizer que o PAIGC não pode participar nas eleições", comenta.

"Mas não posso se quer acreditar que alguém que se diga militante do Partido possa ter este comportamento de impedir que o seu partido vá às eleições. Mas também não me estranha porque já tivemos casos em que militantes e dirigentes do partido contribuíram para retirar o poder e a governação ao PAIGC".

Supremo Tribunal de Justiça em silêncio

A DW África contactou Bolom Conté, que confirmou a entrada, no Supremo Tribunal de Justiça, do pedido de não anotação das resoluções do congresso do PAIGC, mas Conté não se quis pronunciar, para já, sobre o assunto. O STJ também se demarcou de qualquer pronunciamento em relação à matéria.

À DW África, o jurista Cabi Sanhá explicou que é normal a anotação, pelo Supremo Tribunal de Justiça, das resoluções saídas de um congresso partidário, mas deixou um esclarecimento:

"O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau, nas vestes do Tribunal Constitucional e Eleitoral, é o fiel depositário de todas as papeladas concernentes aos partidos. E não havendo discrepância, incongruência ou contrariedade dos textos aprovados ou adotados em diferentes congressos dos partidos políticos, com as leis da República e sobretudo com a Constituição da República, não vejo o Supremo Tribunal de Justiça a poder fazer nada.

Devido à ordem judicial, o PAIGC foi impedido várias vezes de realizar o seu congresso, por conta da ação intentada por Bolom Conté. Em algumas ocasiões, vários militantes do partido foram espancados pelas forças da ordem, que alegavam estar a cumprir a aludida decisão do juiz.

Iancuba Dansó (Bissau) | Deutsche Welle

Angola | Garimpo ilegal ameaça população e meio ambiente em Cabinda

Há cada vez mais jovens a dedicar-se ao garimpo ilegal de ouro na província angolana de Cabinda, correndo risco de vida. Exploração já levou à contaminação do rio Luali, fonte de água para milhares de pessoas.

A prospeção intensa de ouro na província de Cabinda toma contornos alarmantes. Todos os dias, nas margens do rio Luali, os garimpeiros fazem escavações à procura de minério.

O cenário periga o ambiente e ameaça a vida de mais de 8.000 pessoas, pelo facto de o rio Luali, a principal fonte de água na região, estar a ser contaminada pela exploração ilegal.

No mercado informal, os garimpeiros comercializam o grama de ouro a 25 mil kwanzas, o equivalente a 13,3 euros, contra os 18,7 euros praticados pelas empresas legais.

"Agrupamos em montes depois de tirarmos a peneira do buraco, fazemos a lavagem e posteriormente levamos ao mercado para a sua comercialização", explica um dos garimpeiros, que falou à DW sob condição de anonimato.

Face à massiva exploração de minério levada a cabo por muitos jovens e algumas empresas, muitas pessoas abstêm-se de consumir água do rio, pelo facto de estar sempre turva. "Desse jeito que está, não podemos beber, porque pode provocar [febre] tifóide e muitas vezes a água provoca comichões", diz Suzana Puati.

Por outro lado, a caça ao ouro é feita junto a habitações, o que aumenta o perigo de desmoronamento de várias moradias.

DUAS CABEÇAS DERAM UMA E ZERO – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A História é feita pela Humanidade e cada povo constrói a sua. Mas ficam registadas nas suas páginas as grandes e as baixezas, as vitórias e as derrotas, os mártires, os heróis, os grandes líderes, mas também os ditadores, os caudilhos cruéis, as fidelidades ou as grandes traições. Ninguém pode alterar o passado e muito menos falsificar os factos na sua crueza implacável. 

Em Angola, o ano de 2017 marcou o início de uma limpeza geral de factos históricos à custa de falsificações desalmadas, deturpações grosseiras, aldrabices pueris e, no topo do bolo, a inversão de papéis na cena política. O cabeça de lista do MPLA foi eleito Presidente da República. Os deputados do MPLA não foram eleitos à custa do cabeça de lista. O MPLA conquistou os votos e a confiança do eleitorado. João Lourenço é apenas um beneficiário. Deve o cargo ao partido e o partido nada lhe deve. 

Todos os povos têm passado e memória. Todos têm de viver com a sua História, ainda que alguns quadros históricos sejam vergonhosos ou constituam crimes contra a Humanidade. O segredo está em tirar as devidas lições dos tempos idos para que não sejam cometidos os mesmos erros ou crimes. Por isso é importante sabermos quem somos e donde viemos. Só o conhecimento, a investigação e a cultura permitem obter um retrato total e nítido dos caminhos percorridos por um povo. O passado é base para caminhar em direcção ao futuro.

As primeiras eleições multipartidárias, em 1992, foram ganhas estrondosamente pelo MPLA. A “grande família” estava desavinda mas ante o perigo de uma vitória eleitoral da UNITA, houve uma mobilização geral à volta do líder José Eduardo dos Santos e da direcção executiva, protagonizada por Lopo do Nascimento, Kundi Paiama e Marcolino Moco. No aparelho, trabalhando no duro, estava João Lourenço. A vitória eleitoral foi de todas e todos os angolanos. Mas a estes cinco dirigentes se deve a condução política que levou ao sucesso.

Otelo Saraiva de Carvalho e seu amigo Kadhafi, presidente da Líbia, conseguiram fortes apoios financeiros à campanha do MPLA. Deu para tudo, até comprar três estações de rádio, a LAC, a Rádio Morena e a hoje Rádio 2000 do Lubango. Passaram a fazer parte da rede de empresas comerciais e industriais, criada para gerar fundos de apoio à actividade política do MPLA. 

A LAC, pela voz de um comentador encartado e num balanço de 2022, garantiu aos seus ouvintes que João Lourenço é um candidato a Prémio Nobel da Paz. Jorge Luís Borges escreveu a História Universal da Infâmia. Os propagandistas do Presidente João Lourenço estão a escrevinhar, garatujar, a História Universal da Bajulice. Assim vai o “combate à corrupção” corrompendo tudo. Tudo submetendo à voz do dono.

AINDA A TEMPO DE VOS FALAR DO AMOR – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Em Angola existem dois artistas com o nome de Carlos Ferreira. Um, ainda jovem, é homem de letras. O outro, já falecido, foi um dos mais espantosos artistas plásticos angolanos de sempre. Alma gémea de Julião Félix Machado, o mais internacional de todos, que se distinguiu na charge e espalhou o seu talento ma Imprensa de Lisboa, Paris e Rio de Janeiro. 

O artista das letras é Cassé e João Melo tratou dele num texto escrito com os pés inchados, publicado no Jornal de Angola. O pintor e cartunista é Lito. Fomos amigos fora de horas, sempre alta noite e ledas madrugadas. Tem duas prendadas filhas e uma delas casou com o Manecas, dono de uma musculação invejável. Cada borno que dava, era um cabrito que caía. A cobertura fotográfica do desenlace ficou a cargo do António Ole (é um grande fotógrafo, sabiam?) e deste vosso criado que assegurou a iluminação.

Um dia fui ao Bitoque Sardinha Assada, ali na Mutamba, e estava lá o Manecas com o Seco e outros habitantes daquela nesga de Luanda entre a Rampa do Liceu e as Ingombotas. Estava a cumprimentar os amigos quando estoirou uma cena de pancadaria entre tropozóides muito branquinhos quase polacos. O meu amigo musculado em excesso era furriel miliciano e resolveu pôr ordem na soldadesca. Um dos beligerantes chamou-lhe preto de merda e ele esticou-lhe um borno no cimo do nariz e ao nível dos olhos. Caiu redondo enroscando-se como uma cobra.

Confesso que eu estava abusivamente bebido e resolvi urinar para cima do branquinho. Ficou a minha marca. O Zorro desenhava um Z com a espada, quando aviava os maus. Eu decidi mijar para cima deles, depois de estendidos no chão.

Não sou homem de procurar brigas mas nunca fugi de nenhuma. Um dia estava com o Ninito (Banga Ninito!) na esplanada do Majestic e decidimos ir espreitar a farra no Clube Ginásio de São Paulo. 

Mal tínhamos atravessado a rua, apareceram três ocupantes fardados, também muito branquinhos e um deles perguntou-me: - Onde há putas boas? Eu disse-lhe delicadamente que boas, mesmo muito boas, só em casa deles, as respectivas mamãs e manas se tivessem. Numa fracção de seguindo levei um murro na cara, um pontapé nos tomates e uma patada no estômago. Na fracção seguinte o Ninito pôs os três fora de combate. Eu avancei logo com a minha assinatura e urineipara cima dos três enquanto o Ninito se contorcia com gargalhadas.

TROCAS DE NOMES E ENCOMENDAS – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Os partidos políticos que recusaram as regras da democracia e nem sequer tiveram a delicadeza de felicitar os vencedores das eleições gerais de Agosto, sofreram a mais aparatosa derrota. O Tribunal Constitucional rejeitou liminarmente os seus argumentos e mostrou aos angolanos e ao mundo que além de não terem razão, não têm ética política e muito menos respeito pelo regime democrático. Em relação à UNITA já se sabia há muito tempo.

 A novidade é que para as eleições de 25 de Agosto levou a reboque a dita “frente patriótica” constituída pelos zeros do Bloco Democrático e pelo perito em terrorismo Abel Chivukuvuku, que deu um rombo de morte à CASA-CE. Os derrotados das eleições apenas têm como objectivo desacreditar o regime angolano. No caso dos famintos do Bloco Democrático, eles querem a qualquer preço um Lexus e as mordomias de deputados. Alguns conseguiram. 

Os partidos que rejeitaram os resultados eleitorais (até hoje…) têm dado abundantes exemplos de incompetência política e a sua prática resvala quase sempre para um populismo perigoso, primário e de braço dado com o nazismo mitigado por um discurso neoliberal, que encobre com promessas grandiosas, o objectivo evidente de escravizar os povos e fazer de Estados Independentes, meros protectorados do capital financeiro reinante.

A UNITA e seus parceiros da “frente patriótica” não querem saber de coerência, de respeito pelo jogo democrático, de política com princípios, da independência nacional como último reduto da defesa de valores ameaçados poer uma globalização, que desembocou no mais selvagem dos capitalismos, sem regras, sem regulação, sem sistemas de alarme quando estão em causa as condições concretas que dão sentido e espessura à liberdade. 

Para os partidos que puseram em causa a estrondosa vitória do MPLA nas eleições de 25 de Agosto só interessa a destruição da Democracia Angolana. Mas também nisto eles são profundamente incompetentes. Porque ela é tão frágil, está tão titubeante que basta um sopro para cair. Nem isso conseguem.  

O que interessa à UNITA é apresentar Angola como um Estado à imagem e semelhança da Jamba com sinaleiro e escola de condução mas sem estradas nem carros. Uma Angola ocupada por karkamanos, zairenses e mercenários de todas as nacionalidades, sem independência e sem futuro. Um povo ajoelhado aos pés do “apartheid” sem dignidade nem esperança.

O EFEITO GUAIDÓ – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Ngola Nobre, secretário-geral da Brigada Jovem de Literatura de Angola, publica hoje um texto de opinião no Jornal de Angola onde contei 37 erros de ortografia, acentuação e sintaxe. Uma sacanice do copidesque que tem o dever de limpar os textos jornalísticos de erros e gorduras. Da responsabilidade do autor é meter no mesmo saco obras de Nietzsche, Marquês de Sade, Hitler ou José Saramago. Uma desgraça nunca vem só.

Eis um exemplo fabuloso da Liberdade de Imprensa. Leiam o que foi publicado num Media da nossa praça: “O líder angolano (Presidente João Lourenço) avistou-se apenas com Joe Biden em broco e depois pousou para uma fotografia durante um jantar oferecido pelo anfitrião americano”. 

Eles lutam estrenuamente contra a Liberdade e para acabar de vez com a Imprensa. Vão conseguir.

No pico da guerra do estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) e seus aliados regionais ou mundiais contra a Venezuela, o Congresso norte-americano recebeu com pompa e circunstância um tal Juan Guaidó, como presidente da república. Nanci Pelozi aplaudiu freneticamente a entrada triunfal do rapazola naquele antro de genocidas. 

Mike Pence telefonou ao Guaidó e ordenou: A partir de hoje vais ser o presidente da Venezuela. Abaixo o Maduro e venha daí o petróleo. E ele respondeu: Sim patrão!

O eleito era chefe de um pequeno gangue de extrema-direita, que destruía e matava nas ruas das principais cidades venezuelanas. Mas foi o que se arranjou para destabilizar o país com mais reservas de petróleo no mundo. 

O ministro português dos negócios com os estrangeiros, senhor Silva, hoje líder da Assembleia da República, começou logo a fazer vénias ao Guaidó, a chamar-lhe senhor presidente. Mandaram um moço de recados da RTP à Venezuela e ele ficou na zona fronteiriça da Colômbia, dando visibilidade ao banditismo do títere. A democracia deles é uma coisa assombrosa e altamente perigosa. Nem os fascistas do Salazar eram tão estúpidos e seguidistas.

A QUALIDADE DO PODER JUDICIAL E DA DEMOCRACIA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Angola é uma democracia assente no pluripartidarismo e na Constituição da República. Por isso, a liberdade de expressão está garantida, sem qualquer constrangimento que não decorra das Leis. Todos os cidadãos angolanos são livres de pertencer aos partidos políticos existentes ou fundar um partido novo. Está garantida a liberdade de estabelecer órgãos de comunicação social e os Media que existem são a prova de uma real e indesmentível Liberdade de Imprensa.

A Constituição da República define a natureza do regime e contém o catálogo das liberdades, direitos e garantias. Quem está fora da ordem constitucional, sofre as consequências previstas na Lei. Os cidadãos que considerem violados os seus direitos, têm ou deviam ter livre acesso à Justiça. O Poder Judicial em Angola, em comparação com outros sectores, foi o que mais cresceu e melhorou desde a Independência Nacional, porque foi o que mais acautelou a formação dos seus agentes. 

No primeiro ano da Independência Nacional contavam-se pelos dedos das mãos, os magistrados judiciais e do Ministério Público, os oficiais de Justiça, os funcionários, os advogados, notários e conservadores. O mapa judicial era diminuto. Apesar da guerra de agressão estrangeira, esta realidade foi sendo alterada ao longo das quase cinco décadas que Angola leva como país independente.

O regime colonialista nunca consentiu em Angola uma Faculdade de Direito. Percebem-se as razões. Mas uma ano depois da Independência Nacional, o Governo começou  a lançar acções que culminaram com a abertura, em Luanda, da primeira escola superior para formar juristas angolanos. A Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra apoiou os esforços do Governo. Nessa cooperação especializada é justo destacar a figura do Professor Doutor Orlando de Carvalho e do Doutor Teixeira Martins.

Desde então, o Poder Judicial foi evoluindo, ainda que sujeito aos inevitáveis constrangimentos da guerra de agressão estrangeira. Hoje Angola tem excelentes magistrados judiciais e do Ministério Público. Tem oficiais de justiça e funcionários de grande competência. Há milhares de advogados espalhados por todo o território. Na esmagadora maioria são competentes, honestos e esforçados. Também existem falsos profissionais e uns quantos desonestos, mas são excepções. O mapa judiciário levou a Justiça aos cidadãos em todas as províncias.

O CIRCO DOS GALOS E O INTERROGATÓRIO DA CIA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O circo da UNITA continua imparável. Adalberto da Costa Júnior organizou uma “cerimónia” de cumprimentos de Ano Novo e na presença do chefe Tulinabo S. Mushingi (embaixador dos EUA em Angola) e aproveitou para fazer um balanço. Disse ele: “O ano de 2022 não foi fácil. Foi o ano da mais renhida disputa eleitoral. Pela primeira vez se retirou ao partido que governa a maioria absoluta”. O homem confunde os seus desejos com a realidade. O MPLA ganhou as eleições com maioria absoluta e ele ainda não sabe.

O MPLA sozinho contra o mundo averbou a mais saborosa vitória eleitoral desde que existe democracia representativa. A UNITA gastou os últimos cartuchos para nada. Ficou provado que o Galo Negro não tem a confiança do eleitorado, seja qual for o disfarce com que se apresente ante os angolanos. Adalberto e a UNITA estão fora de prazo. São impróprios para consumo.

E o MPLA o que está a fazer com a sua vitória estrondosa? A entrevista do seu cabeça de lista à Voz da América, instrumento de propaganda da CIA mas apenas para consumo externo, mostra que a direcção do partido foi canibalizada pelo seu líder. O que é gravíssimo quando afirma, sem gaguejar, que vai colocar as Forças Armadas Angolanas sob a pata do estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) e até da OTAN (ou NATO) que como se sabe é um pseudónimo do senhores de Washington. A direcção do MPLA deu-lhe carta-branca para tomar tão gravosa decisão para Angola e o Povo Angolano? Se o fez é gravíssimo.

Os eleitores confiaram o voto no MPLA para o partido defender os interesses nacionais e não permitir que o seu líder se ajoelhe aos pés dos EUA. E hipoteque a Independência Nacional. Isto para não falar da sua manifestação pela Liberdade de Imprensa, uma operação pífia que pôs em causa as práticas correctas do partido no sector da Comunicação Social. O Presidente João Lourenço não foi mandatado, nas urnas, para aderir à NATO ou colocar as Forças Armadas Angolanas às ordens de Washington.

O Presidente José Eduardo dos Santos, no discurso de final do ano de 2014 fez um discurso do qual publico este excerto, por der muito actual. Recordem: 

“Quatro anos depois da proclamação da Independência Nacional, faleceu Agostinho Neto, o primeiro Presidente de Angola, quando o país ainda estava em guerra, a Namíbia estava ilegalmente ocupada pelo regime do apartheid da África do Sul e o Zimbabwe oprimido pelo regime de minoria branca racista de Ian Smith.

A República de Angola emergiu assim de um conflito regional longo que o opunha à África do Sul, dirigida pelo sistema do apartheid, a toda a África e em que Angola se encontrava na linha da frente do combate pela libertação total do nosso Continente. 

O apartheid era um regime de minoria branca racista que discriminava a maioria negra e não respeitava os seus direitos civis e políticos. A África e o mundo apoiavam a luta do ANC, dirigida por Oliver Tambo enquanto Nelson Mandela se encontrava na prisão. 

Foi uma época em que o mundo estava dividido em dois blocos: o Bloco Ocidental ou Capitalista e o Bloco do Leste ou Socialista. O apartheid tinha grandes apoios no Bloco Ocidental. As forças amantes da paz e do progresso, e as do Bloco Socialista, apoiavam o povo sul-africano e a África. 

Nesta luta, o apartheid foi derrotado e perderam a face todos os seus aliados e apoiantes. A República de Angola desempenhou um papel de grande relevo ao participar exemplarmente com as FAPLA (Forças Armadas Populares de Libertação de Angola) em batalhas de grande envergadura contra unidades do exército sul-africano nas províncias do Cunene e do Cuando Cubango, que ocupavam ilegalmente, e onde foram derrotadas nas localidades do Cuito Cuanavale, Chipa e Calueque.

A batalha do Cuíto Cuanavale foi uma das mais importantes que ocorreram na África ao sul do Sahara, entre Angola e a África do Sul, depois da  IIGuerra Mundial. Nela participaram mais de 24 mil homens. Do lado de Angola combateram mais de nove mil homens, com 62 tanques, 51 carros blindados, 113 peças de artilharia, 288 veículos de transporte, duas esquadras de aviões de combate e uma de aviões de apoio e reconhecimento, uma esquadra de helicópteros de ataque e outra de helicópteros de apoio e resgate.

As vitórias abriram caminho para a assinatura em Nova Iorque, em Dezembro de 1998, do acordo entre Angola, África do Sul e Cuba, sob mediação dos Estados Unidos da América, pondo fim ao conflito regional e permitindo a independência da Namíbia, a libertação de Nelson Mandela e a abolição do sistema do apartheid. Deste modo, foi conquistada a libertação total de África e realizado um dos maiores sonhos do nosso Continente! 

AS RETICÊNCIAS DA EUROPA: REFUGIADOS AFRICANOS NÃO VALEM?

António Guterres critica países europeus que receberam refugiados ucranianos, mas que "foram tão reticentes em receber refugiados sírios e africanos".

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, deixou na quinta-feira em Lisboa duras críticas aos países europeus em matéria de acolhimento de refugiados e aos maiores países poluentes no combate às alterações climáticas e apelou à não resignação.

De acordo com António Guterres, esses países, nomeadamente no leste da Europa, considerou, redimiram-se na recente crise de refugiados decorrente da invasão russa da Ucrânia, mas o líder da ONU recordou que o mesmo não ocorreu num passado recente, "em que refugiados da Síria se movimentaram pelos Balcãs de forma caótica, vendo portas atrás de portas fechadas".

Guterres saudou a abertura que foi ao longo dos últimos meses demonstrada em relação à crise na Ucrânia, mas, ao mesmo tempo, deixou um aviso: "Não pode deixar de nos fazer refletir por que é que a Europa recebe os refugiados ucranianos e tantos países europeus foram tão reticentes em receber refugiados sírios e africanos".

Segundo Guterres, esta situação "causou e causa em muitos que vivem no chamado “sul global” uma certa frustração, mesmo uma certa zanga, que leva a que lhes seja difícil exprimir a solidariedade que os europeus esperam quando a Europa enfrenta uma crise devastadora, com a invasão russa da Ucrânia e todas as consequências que isso teve na vida quotidiana, nos países europeus e de forma ainda mais dramática nos países do terceiro mundo". 

Portugal | A DESPENSA

Henrique Monteiro | Henricartoon

QUEQUES, GUNAS E AZEITEIROS

Todas as sociedades contam estórias a si mesmas. Através delas cria-se uma teia de sentido partilhado e um conjunto de imagens ou representações que circulam de modo generalizado. Os epítetos com que mutuamente nos brindamos são disso um extraordinário exemplo.

João Teixeira Lopes*

Todas as sociedades contam estórias a si mesmas. Através delas cria-se uma teia de sentido partilhado e um conjunto de imagens ou representações que circulam de modo generalizado. Os epítetos com que mutuamente nos brindamos são disso um extraordinário exemplo. Apesar de algumas variações contextuais, todos sabemos o que é um queque ou beto. Uma vez, ao estudar culturas estudantis nos liceus do Porto, deparei-me com um grafito num estabelecimento de ensino conhecido pela especial visibilidade dos jovens endinheirados e de “boas” famílias:

“Aqui pára a betolândia”

E parava. Aquela inscrição era como uma demarcação espacial e simbólica, uma espécie de fronteira vedada aos queques da Foz. Para a atravessar (isto é, para a transgredir, para passar de um meio social a outro) exigia-se uma metamorfose identitária, com tradução na indumentária, nas formas de apresentação de si, na linguagem, nas posturas e estilos. Era uma nova região, habitada pelas curtes dos gunas e dos azeiteiros. Azeiteiro é uma categoria ambígua, pois nela cabem os membros das classes populares com comportamentos ostentatórios considerados de mau gosto pelos queques, mas também os novos-ricos que traem o seu défice de linhagem em qualquer pormenor mal-alinhavado. Os gunas geralmente estão-se nas tintas e desprezam as boas maneiras dos demais. Cultivam o que consideram autêntico e popular. Quem não falava “à Porto”, por exemplo, com tudo o que isso significa numa vasta constelação semântica, quem não mostrava a peitaça e os músculos a jogar futebol, era um amaneirado de continente estranho.

As sociedades são arenas de luta, em que os conflitos sociais operam pelo enfrentamento de narrativas, imagens e rótulos. Existir (socialmente) é classificar (socialmente), como tão bem mostrou o sociólogo Pierre Bourdieu.

Às vezes, pela boca morre o peixe, vicissitude que o Primeiro-Ministro conhece bem: ao classificar os deputados da IL como “queques” pisou a casca de banana da contradição performativa (“Tá a ver?”). Disse uma coisa, mas autodenunciando-se, mostrou o lugar onde agora habita ou deseja habitar. Talvez o PS viva envergonhado nesse trânsito entre o guna e o beto, entre a pertença e a referência, algures perdido na memória da esquerda e no deslumbramento pró-business.

Os queques de linhagem, contudo, não se costumam enganar. Não hesitam. É no entre-si (nos colégios privados, nos condomínios fechados, nas liturgias sociais, como algumas missas, festas mundanas, clubes exclusivos ou bailes de debute, ou na cooptação que engorda certos partidos e grandes empresas) que encontram os seus e se blindam. Sonham o mesmo sonho: eles, só eles, merecem governar o mundo.

*Esquerda.net

*Artigo publicado em Gerador(linkis external) a 29 de dezembro de 2022

*João Teixeira Lopes - Sociólogo, professor universitário. Doutorado em Sociologia da Cultura e da Educação, coordena, desde maio de 2020, o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto.

Portugal | PEDRO NUNO SANTOS: UM BALANÇO NECESSÁRIO

Manuel Gouveia | AbrilAbril | opinião

A necessidade de um balanço à actividade concreta do ministro Pedro Nuno Santos vem do facto do mesmo ser apresentado como «uma das caras da ala mais à esquerda do PS», «o ministro mais à esquerda», «o rosto de esquerda para um PS mais à esquerda», e outros considerandos similares. E porque esses rótulos tendem a colar mais que as políticas concretas desenvolvidas, e esse é um rótulo perigoso porque semeia ilusões onde elas não devem existir. E também porque nenhum ministro deve ser avaliado – como gosta de fazer a ideologia dominante – desvalorizando a política em concreto que efectivamente desenvolveu nas áreas à sua responsabilidade e colocando o único enfoque na sua imagem mediática, seja esta derivada de uma eficaz gestão publicitária ou da ineficaz contenção de estragos provocados por um acto em concreto.

Antes desse ligeiro balanço, importa recordar que Pedro Nuno Santos teve, enquanto ministro das Infraestruturas, as mais excepcionais condições para realizar uma política de esquerda, pois foi ministro quando o PS não dispunha de uma maioria absoluta e precisava de alguma forma de apoio ou cobertura à sua esquerda para poder governar. E depois foi ministro com maioria absoluta. Os seus únicos limites eram a sua vontade e a vontade do PS. Como veremos, esses limites levaram a que, na prática, o Governo realizasse nas Infraestruturas a velha política de direita. E importa postular, para conduzir esta avaliação à actuação do Ministério das Infraestruturas, que uma política de esquerda é, no mínimo, uma política que afronte o processo de liberalização e mercantilização, que não se submeta aos interesses do grande capital e antes pelo contrário afronte esses interesses.

CTT

Podemos começar pelos CTT. O ministro teve a oportunidade de propor a reversão da privatização dos CTT. Dispunha de apoio parlamentar para tal – se o PS a tal se tivesse proposto. As consequências da privatização são brutais, o descontentamento popular com a gestão privada é generalizado. O regulador denunciou a cada ano as falhas dos CTT privatizados, que não cumpre nenhum dos 24 critérios de qualidade. A concessão terminou, o que deu ao ministro uma oportunidade para uma avaliação ao processo e para a sua reversão. Que fez o ministro? Negociou com o Grupo Champalimaud (que detém o controlo accionista dos CTT), renovou por ajuste directo a concessão aproveitando para reduzir as obrigações impostas ao privado e alterou a Lei Postal para retirar poderes de regulação à ANACOM. O ministro executou uma política de direita, vergada aos interesses do grande capital e em prejuízo do interesse nacional.

OS 50 ANOS DO EXPRESSO E O COSTA, A MAIORIA E O PS DE PERNAS PARA O AR

O Curto do Expresso refere na sua newsletter o aniversário dos 50 anos do jornal. Parabéns. Principalmente parabéns ao tio Francisco Pinto Balsemão e outros que se atreveram a avançar com algo diferente e de afrontamento ao regime fascista desses tempos. Avançaram com pezinhos de lã, mas avançaram. Foi como que uma lufada de ventos anti regime salazarista e pro democracia ma non tropo. Enfim, foi alguma coisa de positivo que aconteceu. Hoje, agora, o Expresso é como aquilo que está na moda e às vistas: a redação única. Desculpem lá qualquer coisinha mas por aqui sabemos ler, interpretar e pensar por cérebro próprio. Sim, sim, compreendemos. Precisam do dinheirinho para pagar as contas. Também todos os outros estão assim condicionados. A diferença é que há aqueles que não conseguem pagar todas as contas. E não pagam por impossibilidade. Dizem que são do contra. E são. O que esses querem não é esta democraciazinha vigente mas sim a verdadeira e constatável democracia que está a ser destruída sistematicamente em favor da democracia da treta dos ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres... Quase que está tudo dito. Adiante.

Os 50 anos do Expresso já lá vão. Coincidiram com o António Costa de pernas para o ar. O homem perdeu a cabeça e está rodeado de forças internas no PS que tudo têm vindo a fazer para o deitar abaixo. Costa confiou nos que o rodeiam e está à vista a confiança que certos e incertos não mereciam. Nem merecem. E ainda há muitos mais no Partido Socialista daquele jaez. São trastes que vêm de muito de trás no tempo, alguns até já com caruncho, que de socialistas nada têm e que de ano para ano que passa muito menos terão. Por isso Costa está fragilizado e de pernas para o ar, como o falsamente alegado Socialista Partido. Agora não há mais nada a fazer. Marcelo Rebelo de Sousa têm a faca e o queijo na mão. Cá se fazem cá se pagam. Costa está a pagar pelos seus medos e tibiezas de avançar lealmente com a chamada Geringonça e de ceder à direita do seu partido. Esses eles por lá continuam a rasteirá-lo. Adeus Costa. Resta-te ficares a andar por aí ou, com sorte, encontrares um tacho na UE - uma prateleira dourada e muito bem paga. 

Foste! Não te embriagues mais com a maioria. As pérolas foram atiradas aos porcos que as devoraram lá pelo Largo das Ratazanas.

Leia seguidamente o Curto e saiba mais... mas não chore lá por isso. Tape o nariz. O PS fede. A direita vai-se extremando e esfrega as mãos. Calma. Ainda vai haver quase mais dois anos de governo com Costa a ser espancado. Bem feito.

MM | PG

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