Cláudia Marques | Deutsche Welle
O maior partido da oposição em Angola desdramatiza a aquisição de carros de luxo para deputados. Analista ouvido pela DW considera, no entanto, que a UNITA devia ter pedido viaturas mais "modestas".
A entrega de viaturas - consideradas de luxo - aos 220 deputados da Assembleia Nacional está a gerar contestação. Numa altura em que o país atravessa desafios económicos e sociais, os angolanos questionam a escolha dos carros que, segundo a imprensa nacional, estão avaliados entre os 100 e os 200 milhões de kwanzas (entre 110 e 220 mil euros).
Sobre a polémica, a DW interpelou o líder do grupo parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka, que remeteu todos os esclarecimentos a uma nota de imprensa divulgada pelo partido. No comunicado, a oposição sublinha que a entrega de viaturas aos deputados está na lei e considera que "as especulações visam unicamente desviar a atenção dos angolanos das questões de interesse nacional".
No entanto, para o analista Osvaldo Mboco há "contrassenso" no posicionamento da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA).
DW África: A contestação à entrega de viaturas aos deputados é justa?
Osvaldo Mboco (OM): A atribuição das viaturas protocolares está prevista no regimento da Assembleia Nacional. A grande indignação que causa no seio dos angolanos tem a ver com o período económico e financeiro que o país atravessa – e é quase unânime que os sacrifícios que a população deve consentir num momento difícil como este devem ser os mesmos sacrifícios que os titulares de cargos públicos deveriam fazer. Porque a grande questão não está na atribuição das viaturas, mas no valor de cada viatura e na despesa global.
DW África: Ou seja, em tempos de crise, em que são pedidos sacrifícios aos angolanos, faltou de alguma forma dar o exemplo?
OM: Claramente, não simplesmente ao nível dos deputados, mas também de vários órgãos de soberania do Estado. Nós subscrevemos que é fundamental dar determinadas benesses aos titulares de cargos nos órgãos de soberania para que possam desenvolver o seu trabalho com alguma dignidade, mas, volto a repetir, a grande discussão que se instalou tem a ver com o custo das viaturas e o peso desta aquisição no Orçamento Geral do Estado, quando o país atravessa uma crise profunda. Este é o momento de todos nós consentirmos sacrifícios a todos os níveis.
DW África: Sobre este tema, a UNITA divulgou uma nota de imprensa onde fala em "especulações" e sublinha que as viaturas são propriedade da Assembleia e não dos deputados. Como encara o posicionamento da oposição?
OM: É o posicionamento de um partido político, com uma abordagem política. Nesse comunicado, a UNITA afirma que os carros não são dos deputados. Esse é um argumento que colhe. No entanto, diz também que a compra das viaturas não é tratada pelos partidos políticos, mas [isso não é bem assim, uma vez que] os partidos fazem parte da administração da Assembleia e, quando tomaram essa decisão administrativa, também participaram no processo de aquisição das viaturas. Há aqui um pequeno contrassenso.
DW África: Na mesma nota, a UNITA refere como escândalo a recente viagem do Presidente João Lourenço às Ilhas Seychelles, que, segundo o partido, está em "desconformidade" com a realidade da pobreza. Nesse sentido, seria expectável que a UNITA questionasse também a escolha dessas viaturas de luxo?
OM: O que eu penso que a UNITA poderia ter feito, na altura, era entender que poderiam ser viaturas mais modestas e não viaturas topo de gama. Penso que, como partido da oposição, também têm o direito a viaturas. Mas [tornam-se também alvo das] críticas que estão a ser feitas aos deputados à Assembleia Nacional.
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