Artur Queiroz*, Luanda
Dia 6 de Janeiro de 2013. Estava
no meu posto de trabalho e fui incumbido de uma missão: O Presidente José
Eduardo exige que o Povo Angolano saiba tudo sobre a Batalha do Cuito
Cuanavale. Tu vais fazer esse trabalho. Respondi que tinha no Jornal de Angola excelentes
repórteres para isso. Tens de ser tu! Para que não haja perseguições políticas
ou mesmo confisco de activos, não revelo os nomes de quem montou toda a
operação. E dos jornalistas que trabalharam comigo. Só vou nomear Paulino
Damião “
O trabalho jornalístico começou em Janeiro de 2013, faz agora 11 anos sob o título genérico Os Meses que Mudaram África e o Mundo. Paulino Damião, reformado, aceitou o meu desafio de irmos sacudir a poeira, tirar o lodo e capinar à volta dos factos que levaram à derrocada do regime de apartheid da África do Sul, no Triângulo do Tumpo. Estudei, consultei, li, ouvi e partimos num enorme avião Ilyushin carregado de tambores com combustível e alguns civis, sobretudo mulheres. Disse ao repórter “50”: Se isto cai, o padre Apolónio nem pode rezar pela nossa alma porque ela desaparece em milhões de pedaços! Como se vê pelo exemplo anexo, a aeronave não caiu.
No Cuito Cuanavale fomos
recebidos pelo General Fernando Amândio Mateus (Nando Cuito) o comandante
das forças na linha da frente durante a Batalha do Cuito Cuanavale. O General
Ngueto nessa fase estava ao comando
O General Nando Cuito apontou para a colina em frente a nós e disse: “Ali o terreno está cheio de minas convencionais e inventadas pelo Coronel Jorge (hoje é Brigadeiro). Estão lá vários tanques Oliphant dos sul-africanos do Regimento de Cavalaria Pretória. Vocês não podem ir lá. Estamos a desminar”.
O Repórter “
Os oficiais da desminagem
prontificaram-se a acompanhar-nos mas tínhamos de pôr os pés onde eles punham.
O General Nando cedeu: Sendo assim vou também. Se morrermos não vos perdoo! O
Repórter “
No dia seguinte, manhã cedo, partimos
rumo à colina que é uma parede verde da Catedral da Liberdade, no Triângulo do
Tumpo. Marchámos em passo de camaleão durante meia hora até atingirmos uma
pequena clareira. Lá estava um tanque, intacto, coberto de capim e mato.
Limpámos tudo e o Repórter “
Na colina ainda destapámos do mato e do capim mais dois “Oliphant” e um cemitério onde os invasores enterraram superficialmente os seus mortos mais os da UNITA. As fardas ainda estavam intactas. E os cabelos loiros.
A minha vida de repórter só foi possível com almas gémeas da imagem. Trabalhei com alguns dos melhores fotojornalistas do mundo. Obrigado à vida que tanto me deu. Fiz reportagens com Eduardo Baião, Eduardo Gajeiro, Henrique Moreira, Américo Diegues, Toninho Pereira de Sousa, Marco, Velho Timóteo e Timóteo Filho, João Oliveira (João Capitão), Gaspar de Jesus, Zurita, Muñoa, Bernardo, e aquela equipa fabulosa do Jornal de Angola, chefiada pelo Chico Bernardo e o Rogério Tuti.
O Repórter “
A nossa ligação era mais do que profissional.
Estávamos unidos pelo amor à Pátria Angolana. O nosso trabalho serviu para que
o 23 de Março fosse considerado o Dia da Libertação da África Austral. Na
próxima festa (ainda vai acontecer?) por favor, homenageiem o Repórter “
No mês de Março de 2013 publiquei este texto sem poeira, sem lodo e capinado:
No dia 22 de Março de
As FAPLA responderam ao ataque do
inimigo às sete da manhã daquele dia 23 de Março de
Um aguaceiro intenso obrigou a parar o fogo. O comandante Louw limpou com um “plofadder” um campo de minas. Avançou em direcção ao Triângulo do Tumpo com dois esquadrões de tanques que levavam à cabeça um draga-minas. As FAPLA reagiram em força e às 12h45 Louw retirou-se. O 5º batalhão regular da UNITA sofreu severas baixas. Louw tentou avançar de novo, mas foi travado por uma barragem de fogo das FAPLA. A infantaria da UNITA foi desbaratada. Às 13h46, os “Oliphant” entraram num campo de minas. Dois ficaram destruídos. O comandante Louw tentou atacar de novo, mas mais uma vez foi travado. Às 13h48 Louw informou o comando que os tanques estavam sem combustível. Andaram às voltas para evitar os campos de minas o que levou a um gasto anormal de combustível.
O excelente trabalho realizado pelos engenheiros das FAPLA na criação de obstáculos contra a infantaria mecanizada e a técnica blindada do inimigo atingiu o seu ponto culminante: Os super tanques “Oliphant” estavam confinados aos campos de minas, consumindo combustível, enquanto procuravam uma saída, no labirinto, totalmente à mercê da artilharia e da aviação angolana. O comandante Louw viu vários “Oliphant” atingidos. Deu ordens para que todos fossem retirados. Mas apesar dos esforços, três foram abandonados (esses nós fotografámos, sem capim nem mato).
As FAPLA tinham ali os seus troféus e a prova de que destroçaram o regime de apartheid. O general Meyer enviou uma mensagem ordenando que o Coronel Fouché se assegurasse que os três “Oliphant” abandonados eram destruídos. Mas isto já não era possível. Os invasores, derrotados, retiravam para Mavinga, vergados ao peso da derrota. Até final de Março, todas as unidades invasoras abandonaram Angola.
O regime de apartheid ficou enterrado no Triângulo do Tumpo. A Humanidade deve aos angolanos a libertação de Mandela, a instauração da democracia na África do Sul e a Independência da Namíbia. Março de 1988 foi o culminar do ano que mudou a face do continente africano.
O Repórter “
* Jornalista
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