sábado, 2 de março de 2024

Angola | O Presente e a História -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A Constituição da República define as balizas da acção política, garante liberdades e direitos. Todos os angolanos devem orgulhar-se da Lei Fundamental. Mas a memória diz-nos que a UNITA abandonou a Assembleia Nacional na hora da votação. Desonrou o compromisso que assumiu com o seu eleitorado e pôs em causa um dos fundamentos da democracia. 

A maioria política da última legislatura foi confirmada na actual. O eleitorado premiou os políticos responsáveis e trabalhadores. Penalizou os que apostaram tudo no caos político e na instabilidade social. Mesmo unidos numa frente contra natura, perderam estrondosamente. O eleitorado castigou os políticos batoteiros. Desavergonhados. Incoerentes. Oportunistas. 

Ninguém acredita na sinceridade de Justino Pinto de Andrade, Filomeno Vieira Lopes ou Francisco Viana quando aparecem aos beijinhos no Adalberto ou qualquer outro sicário da UNITA. Apenas querem comer sentados à mesa do Orçamento Geral do Estado. Com fizeram toda a vida. Mas com outra camisola!

Ninguém acredita que o Galo Negro e o Bloco Democrático defendam os mesmos valores. Fizeram um casamento por conveniência que se alimenta de traições e facadas nas costas. Mas têm um sonho comum: Pôr Angola a andar para trás. Se possível, até aos tempos em que Savimbi e a sua camarilha lutavam contra a Independência Nacional ao lado dos colonialistas.

Os angolanos querem ir para a frente. Sabem que a guerra, além de terríveis destruições e das perdas maciças de vidas humanas, pôs Angola a andar para trás pelo menos um século. Ainda só recuperámos 22 anos. As perdas, em alguns sectores, são irreparáveis. Vamos precisar de muitas décadas para afinar a Educação, fortalecer o sistema de Saúde, desenvolver a Economia. 

Angola está entre dois mundos antagónicos: Os que querem andar para a frente dando tudo para resolver os problemas que vivemos e os que só sabem andar para trás, a UNITA e seus aliados da “frente unida”. Quem fugiu do Parlamento para inviabilizar a aprovação da Constituição da República ainda está com a cabeça na “capital” de Savimbi, o acampamento da Jamba, que tinha como programa social maior, um sinaleiro e uma escola de condução. Tudo o resto era próprio de um quartel abandalhado.

Os que querem andar para trás têm como modelo o acampamento da Jamba, criado pelos racistas da África do Sul e o estado terrorista mais perigoso do mundo. As forças políticas, sociais e económicas que querem recuperar o tempo perdido, que têm pressa em andar para a frente, só podem sentir uma inquietante perplexidade. 

Quando o líder da UNITA e alguns deputados que ainda se sentem servidores do apartheid olham para o passado e nos dizem que lutaram pela democracia, só nos resta uma profunda preocupação: A democracia não se compagina com o assassinato de companheiros de luta só porque ousaram questionar o chefe, como aconteceu com vários membros da família Tchingunji, Jorge Sangumba, Wilson dos Santos e tantos outros. Nenhum democrata alguma vez aceitava combater ao lado dos nazis de Pretória. Na boca dos que só sabem andar para trás, a palavra democracia perde o sentido.

Silva Mateus e a Fundação 27 de Maio são parceiros do Executivo na CIVICOP. Neste momento penso que são os únicos. Sobre a instituição já me pronunciei em tempo oportuno. Não vou bater mais no ceguinho político que a criou. Mas quando já só mexe o chefe Miala, está tudo dito.

O parceiro privilegiado do Executivo na CIVICOP, Silva Mateus, foi condecorado com estrelas de general. Uma coisa estranha, inconcebível, verdadeiramente um insulto aos Generais que nas FAPLA ou nas FAA se bateram em todas as guerras contra a ocupação e a agressão estrangeira. Chegou-me a gravação de uma entrevista que o presidente da Fundação 27 de Maio concedeu à Rádio Despertar, da UNITA. Não é uma montagem. Não tem truques. Ele disse mesmo o que está dito. A gravação é autêntica. Confirmei.

Silva Mateus diz que teve reuniões com Agostinho Neto e numa delas o líder do MPLA afirmou que a UNITA ia ganhar as eleições, porque os umbundos são a maioria. Portanto, era preciso impedir as eleições de 1975. Mentira gravíssima. 

Em 1975, o único líder que exigiu eleições foi Agostinho Neto. Está escrito numa entrevista que me concedeu e foi publicada no jornal português Diário de Notícias, mês de Maio, 1975. Também é mentira que Silva Mateus alguma vez tenha reunido com Agostinho Neto. Deve estar a confundir com João Lourenço mas nessa altura ele era “faplinha” em Cabinda. Silva Mateus fazia parte do “pessoal menor” na Polícia Judiciária portuguesa.

Na entrevista Silva Mateus diz que o Almirante Rosa Coutinho é familiar de Maria Eugénia Neto. Se eu disser que João Lourenço é irmão de Joe Biden é mais verdadeiro. Rosa Coutinho e a sua família são do Alentejo, sul de Portugal. Maria Eugénia Neto e a família são de Trás-os-Montes, a província mais ao norte. Não existe qualquer laço familiar entre ambos. Esta mentira está na base de outra bem mais grave. 

O presidente da Fundação 27 de Maio afirmou à Rádio Despertar que, com base nessa relação familiar, Agostinho Neto e Rosa Coutinho decidiram em 1974 entregar Angola aos portugueses! Mentira gravíssima. O MPLA não pode aceitar este ataque à honra do seu antigo líder. A Justiça não pode ficar indiferente a esta agressão selvagem à honra do fundador da Nação Angolana. A Presidência da República não pode remeter-se ao silêncio.

Em 1975, os poucos médicos que tínhamos em Angola praticamente viviam nos hospitais para tratar dos feridos da guerra. Um deles era Carlos Mac Mahon, mais tarde membro do Comité Central do MPLA. Silva Mateus diz na entrevista que este médico nacionalista pegou em bebés, temperou-os com alho e cebola e assou-os. Colocou as travessas em frigoríficos das Casas do Povo da FNLA para acusar os militantes do movimento de antropófagos. 

Este mentiroso e falsificador da História Contemporânea de Angola é parceiro do Executivo na CIVICOP. Se a partir de hoje continuar a sentar-se ao lado do chefe Miala, então o Executivo é conivente com a falsificação da História. Com os ataques à honra e memória de Agostinho Neto, o fundador da Nação, que comandou vitoriosamente a Luta Armada de Libertação Nacional.

* Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana