Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
Aquilo que mais próximo estará de eleições livres e democráticas em Angola terá lugar a 31 de Agosto. Tirando a previsível confirmação de que até os mortos vão votar (no MPLA), e de haverá em algumas secções mais votos do que inscritos, tudo vai ser normal.
Aliás, a directora do Instituto Democrático para Assuntos Internacionais (NDI), em Angola, Isabel Emerson, já foi avisando que a presença de observadores estrangeiros deve obedecer critérios de ordem ética, pautando pelos princípios de imparcialidade, salvaguardando as leis e a soberania.
Isabel Emerson, que falava à Angop, explicou até que alguns organismos internacionais que se dedicam à promoção dos direitos democráticos, e que patrocinam missões de observação, elaboraram códigos de ética para os seus elementos.
Asseverou que os observadores devem manter a imparcialidade mais rigorosa no cumprimento dos seus deveres, e não devem em nenhum momento exprimir tendenciosidade ou preferência em relação às autoridades nacionais, partidos, candidatos, ou qualquer assunto que seja objecto da campanha eleitoral.
Salientou também que o interesse e a contribuição das organizações é importante para a criação de maior confiança no próprio processo, ao jogarem o seu papel com isenção e neutralidade, assim como respeitar as leis do pacote eleitoral.
Isabel Emerson referiu que a sua instituição está a trabalhar com organizações não governamentais angolanas, nas províncias da Huíla, Huambo, Benguela e Luanda, e com o Conselho das Igrejas Cristãs sedeadas no Uíge, Kwanza Sul e Benguela.
“Estamos aqui para apoiar as iniciativas das organizações angolanas neste papel de educadores cívicos eleitorais e de observadores, de forma a permitir eleições justas e transparentes no país”, disse a directora do Instituto Democrático para Assuntos Internacionais.
Só por uma questão de memória, recorde-se que a chefe da missão de observação eleitoral da União Europeia, Luiza Morgantini, esclareceu no dia 5 de Setembro de 2008 que só classificara como "desastre" as assembleias de voto que visitou e não todo o processo eleitoral das legislativas em Angola.
Se mais tivesse visitado...
Luiza Morgantini notou ainda que em Angola as pessoas pretendiam votar, "sem intimidações", por quererem "uma Angola diferente, a caminhar e pela democracia", o que considera "muito importante".
Pretendiam votar sem intimidações, disse ela. E isso, creio, é bem diferente de votarem sem intimidações. Ou não será?
Em relação ao desempenho da Polícia Nacional, que tinha então na rua 70 mil agentes para garantir a segurança do escrutínio, revelou ter informações dos partidos políticos de que a corporação estava a trabalhar com "imparcialidade".
É claro que Luiza Morgantini, para bem do MPLA, não visitou as secções de voto em que os polícias distribuíam votos e ensinavam a votar.
É claro que Luiza Morgantini, para bem do MPLA, não visitou as secções de voto em que os delegados do MPLA diziam aos eleitores que os atrasos se deveram ao facto de os angolanos não estarem todos a votar no mesmo partido.
É claro que Luiza Morgantini, para bem do MPLA, não visitou as secções de voto em que os delegados do MPLA, nas zonas afectas à Oposição, diziam que não vale a pena estar nas longas filas porque poderiam votar no dia seguintes.
Mas também é verdade que o relatório de Morgantini dizia, por exemplo, que a CNE “tomou decisões durante o período de eleições que demonstraram algum grau de parcialidade (...) sendo notória a falta de acesso dos representantes dos partidos políticos ao centro de apuramento central e a não acreditação de um número significante de observadores domésticos do maior grupo de observadores na capital”.
A Missão de Observação da União Europeia dizia ainda que “houve falta de transparência no apuramento dos resultados eleitorais, que não foi autorizada a presença de representantes dos partidos políticos nem de observadores para testemunhar a introdução dos resultados no sistema informático nacional e não foi realizado um apuramento manual em separado”, para além de “não terem sido publicados os resultados desagregados por mesa de voto e como tal não foi possível a verificação dos resultados”.
Em qualquer Estado de Direito críticas deste tipo, apesar de suaves e açucaradas, fariam com que as eleições fossem anuladas. Mas, tratando-se de um reino onde vale tudo, nada aconteceu.
Segundo o mesmo relatório, “desde o período pré-eleitoral notou-se uma manifesta superioridade financeira e organizacional do MPLA em comparação com outras forças políticas”.
O relatório dizia igualmente: “A Missão europeia assistiu a repetidos casos de abuso dos benefícios do partido no poder durante a campanha, de igual modo, também se registaram casos de uso de recursos do Estado assim como o envolvimento de autoridades tradicionais e de funcionários públicos em actividades relacionadas com a campanha a favor do partido dirigente, situações que colocaram todas as outras organizações políticas em desvantagem”.
Para a equipa de observadores da União Europeia, “o processo eleitoral revelou importantes lacunas e falta de clareza nos regulamentos que ordenam dois aspectos fundamentais no exercício do sufrágio: a utilização efectiva e obrigatória dos cadernos eleitorais em todas as mesas de voto assim como os procedimentos para o exercício, transmissão e contagem dos votos especiais. Para além disso, a falta de directrizes para o registo de angolanos residentes no estrangeiro, tal como previsto pela Lei Eleitoral, efectivamente excluiu um número significativo de cidadãos”.
Veremos agora se a Europa assume que os conceitos de democracia, transparência, legalidade e honorabilidade continuam a variar consoante os amigos…
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: DEPUTADO AMIGO DE ESPIÃO E NÃO SÓ
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