sábado, 8 de setembro de 2012

Chumbo do TC abriu a porta para governo poder cortar salários no privado em 2013

 

Bruno Faria Lopes – i online
 
Passos Coelho mantém cortes do 13.º e 14.º mês no Estado e pensionistas e soma corte salarial no privado para financiar um alívio às empresas
 
A tarefa era encontrar uma alternativa para o chumbo do corte dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e dos pensionistas – o chumbo de uma das principais medidas de consolidação orçamental tinha sido decidido em Julho pelo Tribunal Constitucional com a justificação da má repartição dos sacrifícios com os trabalhadores no privado. A alternativa foi anunciada ontem pelo primeiro-ministro: o governo não mexe na prática na austeridade imposta sobre funcionários públicos e pensionistas e resolve o problema da equidade impondo um corte salarial no sector privado que financia um alívio da carga fiscal para as empresas.
 
Os trabalhadores por conta de outrem no privado vão passar a pagar 18% de contribuição para a Segurança Social, uma subida de sete pontos face aos actuais 11%. O aumento de tributação sobre as pessoas – que será mais penalizador do que um corte de um subsídio de férias – servirá para financiar a totalidade de um corte na taxa paga pelas empresas à Previdência, de 23,75% para 18%. Passos Coelho não explicou se a medida é temporária ou permanente.
 
Os funcionários públicos verão ser formalmente devolvido um dos subsídios (férias ou Natal), que será diluído pelos 12 meses do ano (acaba o pagamento em 14 prestações) – logo de seguida, contudo, verão esse subsídio ser absorvido pela subida das contribuições para a Segurança Social, também de 11% para 18%. O outro subsídio permanece suspenso até ao final do programa de ajustamento, pelo que o rendimento disponível será o mesmo em 2013 indicou Passos Coelho. Os pensionistas continuam sem qualquer um dos dois subsídios.
 
No discurso feito ao final do dia, Passos Coelho apenas se referiu a 2013, não explicando como irá resolver o problema da derrapagem do défice este ano, no que pode ser um sinal da flexibilização da meta orçamental este ano e de medidas adicionais dirigidas aos ministérios (o ministro Vítor Gaspar apresentará os resultados da quinta avaliação na próxima segunda-feira e deverá dar explicações sobre 2012).
 
Na perspectiva do governo, as medidas anunciadas ontem correspondem à decisão do TC sobre a repartição dos sacrifícios. “O que propomos é um esforço de todos por um objectivo comum, como exige o Tribunal Constitucional”, afirmou Passos Coelho (o constitucionalista Jorge Miranda tem dúvidas sobre esta interpretação, ver na página 4). “Mas um contributo equitativo e um esforço comum que nos levem em conjunto para cima, e não uma falsa e cega igualdade que nos arraste a todos para baixo”, acrescentou o primeiro-ministro.
 
Por “para cima” o governo refere-se ao ensaio de uma desvalorização fiscal destinada, segundo Passos Coelho, a dar mais competitividade às empresas e a combater o desemprego. O primeiro-ministro pediu aos empresários que repercutam nos preços o bónus oferecido com o corte da taxa social única (calculado em 2,1 mil milhões de euros pela central sindical CGTP, segundo a agência Lusa).
 
“Voltamos ao início do programa da troika que incluía uma desvalorização fiscal – é uma solução melhor do que uma simples subida de impostos”, afirma Álvaro Almeida, professor na Faculdade de Economia do Porto e ex-técnico do FMI. O corte inicial implicava a subida do IVA que, agora, já não tem margem para mais – a alternativa mais segura para os cofres do Estado (porque implica retenção na fonte) é agravar as contribuições para a Segurança Social.
 
Será a medida eficaz para levar as empresas a contratarem mais, como defende Passos Coelho? “A medida destina-se essencialmente a travar os despedimentos”, considera Álvaro Almeida.
 
A queda da procura interna, a incerteza na frente externa e a escassez de crédito são os principais factores que continuarão a limitar a apetência por contratações. O corte salarial terá impacto no consumo privado, que vale cerca de dois terços da economia portuguesa, e deverá levar a uma recessão em 2013 (a previsão do Banco de Portugal sem contar com mais medidas era de estagnação total).
 
As mudanças implicam a manutenção de uma das principais medidas de consolidação orçamental do governo – os cortes nos 13º e 14º meses valem 2 mil milhões de euros. De caminho, o governo assegura que o Estado se apropria de receita adicional (1,25 pontos entre o agravamento para os trabalhadores e o desagravamento para as empresas), naquilo que é uma subida ligeira da carga fiscal.
 

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